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Metade dos portugueses sofre de ansiedade financeira

Primeiro estudo sobre bem-estar financeiro em Portugal conclui que mulheres com baixo rendimento e escolaridade se sentem pior e que isso influencia o seu bem-estar geral.

A maioria dos portugueses apresenta dificuldades em gerir o seu dinheiro e revela ter uma baixa literacia financeira, o que afeta o seu bem-estar psicológico, já que vários portugueses revelam ficar stressados ao pensar nas suas condições financeiras. Estas são as conclusões de um estudo hoje apresentado e que aponta ainda para que grande parte da população portuguesa sofra de ansiedade financeira, sendo que menos de um terço dos portugueses considera que está no caminho certo para atingir os seus objetivos financeiros, um em cada quatro tem dificuldades em pagar as contas e quase metade experiencia stress todos os dias devido à sua condição financeira.

O estudo Bem-Estar Financeiro em Portugal: Uma Perspetiva Comportamental, desenvolvido pela consultora Doutor Finanças, em parceria com a Laicos – Behavioural Change, com a Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa (FPUL) e a NOVA Information Management School (Nova IMS) foi divulgado esta quarta-feira, em Lisboa. Os autores concluíram que a população portuguesa apresenta um nível baixo de literacia financeira, realidade que afeta o seu bem-estar financeiro e o seu bem-estar geral. De acordo com os dados recolhidos, um em cada quatro (25%) portugueses tem dificuldade em pagar as contas e mais de metade (53%) diz-se insatisfeito com a sua vida financeira, referindo que essa condição lhe causa alguma forma de stress.

Os autores do estudo ressalvam que o conhecimento financeiro dos portugueses é inferior àquele demonstrado pela população alemã há 15 anos, sendo que 64% dos cidadãos nacionais revelam ter um baixo conhecimento financeiro, baseando-se este resultado em três perguntas feitas aos inquiridos relacionadas com taxas de juro, inflação e risco/diversificação em investimentos. Apenas um terço dos inquiridos acertou em todas as questões.

As questões - com várias hipóteses de resposta apresentadas, tendo o inquirido de escolher a correta - colocadas foram as seguintes:

Questão sobre taxas de juro: "Imagine que tinha 100€ na sua conta poupança, com uma taxa de juro de 2% por ano. Após 5 anos, quanto acha que terá na sua conta se não retirar dinheiro?"

Questão sobre inflação: "Imagine que a taxa de juro na sua conta poupança era de 1% ao ano e que a taxa de inflação era de 2% ao ano. Passado 1 ano, o que poderia comprar com esse dinheiro?"

Questão sobre diversificação/risco: Indique se a afirmação seguinte é verdadeira ou falsa: "Normalmente, comprar uma ação de uma empresa trará um retorno mais seguro do que comprar uma ação de um fundo de investimento".

A menor taxa de acerto foi nos conceitos de risco/diversificação, em que apenas 47% dos participantes respondeu acertadamente, 15% erradamente e 38% referiu não saber a resposta.

"Mais do que posicionarmo-nos numa hierarquia de conhecimento financeiro, conseguimos ver que o conhecimento atual dos portugueses está em níveis que outros países desenvolvidos tinham há mais de uma década. Estes números contribuem, no mínimo, para um cenário ainda menos encorajador - e reiteram a necessidade de planos de ação eficazes", referem os autores, que defendem a necessidade de uma investigação profunda e a definição de planos de ação capazes de dar resposta a este cenário.

Falta de planeamento e dívida

Nas conclusões do estudo, os autores referem que pessoas com uma escolaridade mais baixa e com um rendimento menor têm um bem-estar financeiro mais baixo, bem como maior ansiedade no que diz respeito a questões financeiras. As mulheres são as que têm menores níveis de literacia financeira. O estudo refere que "os portugueses de sexo masculino apresentam níveis de bem-estar financeiro significativamente superiores às pessoas do sexo feminino, com uma diferença de 7.2 pontos no valor de bem-estar financeiro", referindo que estas diferenças parecem refletir "aspetos derivados de uma socialização diferenciada entre estes grupos", já que outros estudos evidenciam que "as expectativas dos pais em relação aos seus filhos no que diz respeito a finanças difere significativamente entre sexos, levando a que existam mais conversas abertas com filhos do sexo masculino acerca de finanças, do que com as filhas", levando assim a diferenças significativas na forma como estes grupos se relacionam com as suas finanças.

"Pessoas que crescem em contextos mais desafiadores, com menos oportunidades de acesso, onde é necessário um esforço hercúleo para pagar as contas a tempo e que não saberiam como conseguir pagar uma despesa inesperada, mais dificilmente conseguem adquirir o conhecimento e comportamentos necessários que contribuem para promover maior bem-estar financeiro", pode ler-se no documento.

O estudo mostra que metade dos portugueses sente ansiedade quando pensa sobre as suas finanças pessoais, uma condição que afeta de forma mais significativa pessoas do sexo feminino, com rendimentos mais baixos e menor escolaridade. Adicionalmente, 22% dos portugueses acreditam que a preocupação com o dinheiro contribui para que não sejam tão bem-sucedidos profissionalmente como poderiam ser, enquanto 23% refere sentir-se culpado quando pensa sobre as suas finanças pessoais.

Quanto ao planeamento, ainda que a maior parte dos portugueses (79%) afirme que, no geral, planeia a sua vida financeira, apenas 28% já fez algum tipo de plano a pensar na reforma.

Os comportamentos de endividamento foram outra das variáveis consideradas na análise sobre o bem-estar financeiro dos portugueses. E aqui, ainda que só 22% tenha a perceção que tem demasiadas dívidas neste momento, um terço (33%) considera que os seus encargos mensais associados a prestações de crédito são demasiado altos para os rendimentos dos seus agregados.

Na investigação, os autores afirmam mesmo que o "bem-estar financeiro assume um papel central no bem-estar geral das pessoas", tendo inclusive mais peso do que os próprios rendimentos, concluindo que os portugueses com menor bem-estar financeiro têm uma probabilidade três vezes maior de experienciar tristeza.

Para realizar o estudo, durante o mês de janeiro, foram contactadas 800 pessoas com idades entre os 18 e os 75 anos que residem em Portugal.

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