O que é a tecnologia de combustível sólido que a Coreia do Norte está a usar em mísseis?

Anúncio feito na quinta-feira por Pyongyang deixou o mundo em alerta. Combustível sólido pode tornar mísseis nucleares muito mais difíceis de detetar. Saiba como funciona esta tecnologia e quais os seus riscos.

A Coreia do Norte diz ter testado um novo míssil balístico intercontinental, mas desta vez de combustível sólido. O que poderia ser mais um teste militar da ditadura asiática, na verdade esconde uma inovação que está a deixar a comunidade científica alerta. É que a ser verdade, esta é a primeira utilização conhecida de combustível sólido num projétil de longo alcance, cujo principal bónus é ter capacidade de lançamento com pouca preparação.

KCNA via REUTERS TV/via REUTERS
Mas que tecnologia é esta dos combustíveis sólidos e como é que ela pode melhorar os sistemas de mísseis da Coreia do Norte, são algumas das questões que este anúncio levanta.

O que são combustíveis sólidos?


Os propulsores (combustível para foguetões) sólidos já são usados fora da Coreia do Norte, nomeadamente pela NASA, que há 20 anos desenvolve esta tecnologia. No caso da Agência Espacial Norte-Americana o que se sabe é que este combustível é uma mistura de uma espécie de oxidante (o perclorato de amónio) e alumínio em pó (semelhante ao papel de alumínio das cozinhas e que é usado muitas vezes como combustível). O combustível e o oxidante são unidos por um material de borracha dura e embalados num invólucro metálico.

Quando o propulsor sólido queima, o oxigénio do perclorato de amónio combina-se com o alumínio para gerar enormes quantidades de energia e temperaturas de mais de 2.760 graus Celsius, criando impulso e levantando o míssil da rampa de lançamento.

Segundo a NASA, a sua utilização é exclusivamente científica.

Sobre o combustível sólido desenvolvido no regime de Kim Jong-un pouco se sabe, a não ser que desde 2019 que o território anuncia a intenção de usar esta tecnologia.


Quem tem esta tecnologia?


Os combustíveis sólidos são tão antigos quanto os foguetes desenvolvidos pelos chineses há séculos. Porém, os verdadeiros avanços nesta tecnologia chegaram apenas a meio do século XX, quando os EUA conseguiram desenvolver propulsores mais potentes.

A União Soviética desenvolveu o seu primeiro míssil balístico com esta tecnologia, o RT-2, no início dos anos 1970, logo depois da França ter anunciado o seu S3, também conhecido como SSBS, um míssil balísticos de médio alcance. A China começou estes testes em mísseis no final da década de 1990.

Esta sexta-feira, a Coreia do Sul também anunciou ter já assegurado tecnologia de mísseis de combustível sólido "eficiente e avançada".


Sólido vs líquido. Quais as diferenças?

 
Os propulsores líquidos garantem uma maior propulsão e potência, mas requerem tecnologia mais complexa e peso extra. Enquanto o combustível sólido é mais denso e queima rapidamente, gerando propulsão durante um curto período de tempo. Porém, pode ficar armazenado por longos períodos de tempo sem se degradar ou decompor - um problema que acontece com o combustível líquido. 

Para a indústria do armamento, as vantagens são ainda maiores. Já que este tipo de combustível é mais fácil e seguro de usar, além de requerer muito menos apoio logístico, tornando-se assim muito mais difíceis de detetar e mais capazes de sobreviver do que as armas com combustível líquido, segundo explicou, à Reuters, Vann Van Diepen, antigo especialista de armamento do governo dos EUA.

Segundo o perito em armamento nuclear Ankit Panda, investigador do think tank Fundo Carnegie para a Paz Internacional, qualquer país que opere forças nucleares em grande escala, baseadas em mísseis, procuraria mísseis de combustível sólido, que não precisam de ser abastecidos imediatamente antes do lançamento. "Estas capacidades são muito mais reativas em tempo de crise", defendeu. 


O que se segue?


Do lado da Coreia do Norte há a promessa pública de que o desenvolvimento do seu novo míssil balístico de combustível sólido, o Hwasong-18, vai "promover radicalmente" a sua capacidade de contra-ataque nuclear. Já o vizinho do Sul, através do seu Ministério da Defesa, procurou minimizar os testes, dizendo que o Norte precisaria de "tempo e esforço extra" para dominar a tecnologia.

Ankit Panda antecipa que a Coreia do Norte pode ter problemas para assegurar que um míssil tão grande não se desfaz quando o diâmetro do propulsor se tornar maior. Embora o Hwasong-18 possa não "alterar as regras do jogo", muito provavelmente complicará os cálculos dos Estados Unidos e dos seus aliados durante um conflito, acredita o especialista em armamento nuclear.

"O interesse mais importante dos EUA e dos seus aliados é reduzir os riscos de uso e escalada nuclear decorrentes da posse por parte da Coreia do Norte destas armas", disse Panda.
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