O eurodeputado do PSD é o único jornalista (à altura dos factos) referido na acusação do Ministério Público.
Esta não é a primeira vez que o nome de Sebastião Bugalho, na altura em que era jornalista noSole noi, onde fazia a cobertura da atualidade política do PSD, aparece associado à Operação Tutti Frutti. Já tinha sido apanhado nas escutas telefónicas feitas aos envolvidos e a SÁBADOjá o tinha escrito em 2023, num artigo onde contava o caso de um empréstimo em numerário do jornalista a Carlos Eduardo Reis, um dos principais alvos do Ministério Público (MP). A acusação,que foi divulgada esta semana, não refere esse episódio, preferindo falar de outro, que considerou relevante.
Sebastião Bugalho é o único jornalista mencionado no processo e é apresentado pelos procuradores apenas pelo nome próprio, sem qualquer referência à profissão. O contexto é o verão de 2017, durante a pré-campanha para as Autárquicas desse ano. "Sérgio Azevedo usou os contactos que tinha nos órgãos de comunicação social, para promover a imagem de Luís Newton, candidato, o que fez aproveitando a proximidade que tinha com Sebastião Bugalho, que promoveu e realizou uma entrevista a Luís Newton, que foi acompanhada e revista por Sérgio Azevedo".
Sérgio Azevedo, deputado do PSD e principal pivot do esquema do Tutti Fruti, na tese do MP, tentava angariar favores políticos junto de autarcas para obter vantagens patrimoniais e colocação de amigos, diz a acusação. Foi o que aconteceu, por exemplo, em Benfica, que até era liderado por outro partido, o PS.
Não é referida na acusação de que entrevista de Sebastião Bugalho se trata (há apenas uma remissão para um apenso do processo), nem a encontrámos online. Mas existe, por exemplo, uma entrevista de Bugalho ao próprio Sérgio Azevedo. Não foi a única entrevista do então jornalista a personalidades de direita, da IL ao CDS e ao PSD, incluindo-se neste último caso vários artigos sobre André Ventura, que na altura era candidato social-democrata a Loures - foi o início da carreira política do agora líder do Chega.
Sebastião Bugalho, na tese do MP (que eventualmente terá escutas), acedeu à proposta de Sérgio Azevedo para entrevistar Newton e acedeu a que aquele revisse o texto. A seguir à entrevista, Bugalho e Azevedo terão sido escutados a conversar. Este último comentava com o jornalista: "Eu tive uma reunião com o Medina e com o gajo, pá, trazer-se aqui duas ou três juntas, o Medina apresentava candidatos fracos, para ver se a gente, percebes? (…) Pronto e a gente fez uma troca e nalgumas que ele nos pediu, a gente também apresentou merda".
Ou seja, no verão de 2017, Azevedo contava a Bugalho que estava a decorrer o que veio a ser uma das teses centrais da Operação Tutti Fruti: o alegado pacto de regime entre PS e PSD com vista à apresentação de candidatos fracos em algumas freguesias para que o oponente pudesse ganhá-las e lá colocar amigos políticos, e vice-versa, entre outras vantagens e esquemas, segundo o MP.
Contactado pela SÁBADO, Sebastião Bugalho (que não foi sequer ouvido como testemunha neste caso) remeteu-nos para o esclarecimento dado no referido artigo da nossa revista em 2023, ainda que sejam episódios diferentes.
Nesse artigo, referia a SÁBADO que a PJ tinha gravado, em finais de 2017, um telefonema entre Carlos Eduardo Reis e Sebastião Bugalho, em que o empresário e deputado do PSD pediu o NIB a Bugalho porque tinha "uma loja para despachar". Bugalho mandou-lhe a informação por SMS: "O que me pediste, primo."
Num relatório posterior, já a 3 de janeiro de 2018, a PJ pediu a quebra do sigilo bancário desta conta bancária colocando a hipótese de "Carlos utilizar a conta do primo Sebastião Bugalho para esconder movimentos bancários". Dois dias depois, Carlos Reis mandou uma mensagem escrita a Bugalho: "Confirmaste receção da massa?" Bugalho respondeu-lhe: "Sim, confirmado." Reis ficou contente, mas fez-lhe uma última recomendação: "Ótimo. Recibos antigos amigos, n esqueças pf." A PJ considerou que Bugalho estaria a intervir em vários negócios de Carlos Reis. Um deles poderia passar pela organização de uma deslocação ao Algarve para uma proposta sobre o Porto de Faro com a câmara local. A procuradora Andrea Marques recebeu todas estas informações e aceitou, a 8 de janeiro de 2018, a proposta da PJ para quebrar o sigilo de uma conta bancária de Bugalho.
Contactado pela SÁBADO na altura desse artigo, em 2023, Bugalho começou por garantir que, ao contrário do que escreveu na SMS, não era primo ou familiar de Carlos Reis. E justificou depois por escrito a questão do NIB: "No final de 2017, Carlos Eduardo Reis viajou do Norte para Lisboa, onde nos encontrámos. Conversámos como habitual sobre política (era o meu trabalho). Quando nos despedimos, já tarde, deu pela falta da sua carteira, que havia esquecido em casa, no Norte. Perante isto, fui à caixa de Multibanco mais próxima e emprestei a quantia necessária para o seu regresso a casa (gasolina, portagens, etc.). Pareceu-me, à data, o gesto mais correto e decente. Dias mais tarde, o mesmo procedeu à devolução da exata quantia por transferência e confirmou-o por SMS. Julgo que nem um nem outro tínhamos algo a esconder, sendo que ambos os movimentos podem ser confirmados pelo meu extrato bancário, cujo historial requisitei assim que fui contactado pela revista SÁBADO."
Questionado também pela SÁBADO, Carlos Eduardo Reis referiu que não se recordava deste episódio, porque "já passaram muitos anos, mas que isso pode ter acontecido". E fez questão de desmentir que tivesse utilizado a conta de Bugalho "ou qualquer outra que não as minhas ou das minhas empresas para movimentar dinheiro".
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"O afundamento deles não começou no Canal; começou quando deixaram as suas casas. Talvez até tenha começado no dia em que se lhes meteu na cabeça a ideia de que tudo seria melhor noutro lugar, quando começaram a querer supermercados e abonos de família".