No 49.º aniversário da Revolução de Abril, não faltaram os avisos sobre os perigos do populismo e da extrema-direita. Ventura preferiu falar de corrupção, excedendo o tempo. Rui Rocha trouxe várias datas para o calendário e Miranda Sarmento quis atacar o PS mas cometeu uma gaffe.
Rui Tavares, o primeiro a falar na sessão solene do 25 de Abril, deu o mote. "A nossa democracia não só não está garantida como vive o momento de maior risco a sua existência desde o 25 de Abril". O aviso teve ecos nas palavras de Catarina Martins, do BE, de Manuel Loff, do PCP, e de João Torres, do PS. Todos avisaram para os perigos que espreitam, com o regresso da extrema-direita e indicaram caminhos para travar a degradação do regime que nasceu na Revolução.
Mariline Alves / SÁBADO
"Nenhuma democracia está completa ou é perfeita", começou por avisar Rui Tavares, lembrando que "todos os regimes democráticos têm os seus inimigos" e que "aviltar e esvaziar uma democracia não é sequer difícil".
Para o ilustrar deu, sem nomear, o exemplo da Hungria, onde Orban lidera um governo que chegou ao poder com um discurso contra a corrupção e instalou um regime com casos de nepotismo e corrupção, perseguição do pensamento livre e da liberdade de expressão e repressão a todos os não alinhados.
O mais importante, para estes populistas, é "uma vontade desmedida de mandar", mas o aviso é feito não só para a bancada do Chega, mas para o PSD. "O principal risco não está nos autoritários, que serão sempre minoritários, está naqueles que lhes querem dar a mão", lançou o deputado único do Livre.
Inês Sousa Real falou a seguir para dizer a Augusto Santos Silva a vergonha sentida pelo momento de tensão vivido minutos antes do início desta sessão, durante o discurso do Presidente do Brasil, Lula da Silva. "Partilhamos do mesmo embaraço", declarou.
A deputada do PAN lamentou que 49 anos depois da Revolução ainda estejam tantos direitos por garantir e os discursos de ódio ganhem terreno. "O ódio continua a falar mais alto, mesmo nesta casa da democracia", disse, para depois evocar a poeta Natália Correia. "Continuamos a ter subalimentados do sonho".
Como manter viva a "semente" de Abril contra o bafio e os fungos do ódio
Catarina Martins fez da importância de manter viva a "semente" de Abril, indo buscar à música de Chico Buarque, a frase "foi bonita a festa, pá". Essa festa, como dizia Chico em 1978, já estava a murchar. E, quase meio século depois, a coordenadora do BE acredita que a democracia é um trabalho em construção.
"A revolução não foi uma declaração, foi uma construção", vincou, atacando os que usam os símbolos mas não honram o legado da luta de Abril. "Só a desonestidade pode negar o que ficou por fazer, o que foi abandonado, os recuos a que também assistimos", acusou, lembrando que "à recusa do tanto que ficou por fazer juntam-se recuos democráticos".
Para que a semente vingue, defendeu, é preciso oxigénio e esse "oxigénio é o horizonte de uma vida melhor", num momento em que se sente o "bafio em tantos cantos do mundo", em que crescem os "fungos do ódio" e até há "manchas de bolor no Parlamento".
"Nada pior do que essa lama que contamina todo o debate, que faz do medo o argumento para todas as coisas: se não for assim, pode ser pior. Se não formos nós, podem ser uns piores", lançou, num recado claro ao PS.
Contra o "pensamento único"
"A democracia está sob ameaça", concordou Manuel Loff, do PCP, para quem "a revolução portuguesa que hoje comemoramos aqui contudo não é feita simplesmente de memória, muito pelo contrario", numa luta que continua a ser necessária.
"Significa que se pode voltar a conseguir o que o novo pensamento único dos nossos dias nos quer convencer ser impossível de realizar", defendeu o deputado comunista, falando numa ameaça que se sente "em todos os lugares, a começar por Portugal onde reiteradamente se mão comprem naturais, justíssimas expectativas de quem espera que a democracia seja sempre acompanhada de bem-estar e de justiça social".
Mas se Loff citou a Grândola para clamar pela urgência da fraternidade entre os homens, João Torres, do PS, preferiu citar o Papa Francisco, "preocupado com o populismo na visa politica", quando pediu um combate às desigualdades como vacina para os ressurgimento da extrema-direita e dos seus discursos de ódio.
E se no BE se atiram responsabilidades ao PS por falhanços que abrem a porta à extrema-direita, no PS aponta-se o dedo ao PSD. "Tão ladrão é o que rouba como o que consente", disse Torres, atacando "os que se servem das velhas fórmulas como o populismo" e que "tentam criar brechas na muralha do progresso", para os quais "o que conta é a vã cobiça do poder pelo poder".
"Alguém não fez o suficiente", acusa a IL
À direita, Rui Rocha também falou de um país "mais anoitecido do que queríamos", mas começou por inserir o 25 de Abril numa longa sucessão de datas nas quais "Portugal se fez novo outra vez", começando na Batalha de Aljubarrota, passando pela Restauração da Independência no 1 de Dezembro e juntando-lhe o 25 de Novembro, por exemplo. Todas datas que, para o líder da IL, ficam no mesmo patamar que o 25 de Abril de 1974.
No dia em que se celebra Abril, Rocha olhou para o que falta fazer e apontou o dedo a quem tem estado no poder nos últimos 49 anos. "Alguém não fez o suficiente", disse. "Se Portugal se encolhe, é porque houve alguém que não fez o suficiente", insistiu.
Rocha também anunciou que "em nome da liberdade, resistiremos contra todas as derivas", mas incluiu nessas ameaças totalitárias "os cancelamentos" e "as políticas identitárias que subjugam a liberdade individual".
"Há 25 anos que não há um desígnio nacional", diz o PSD
Miranda Sarmento, do PSD, exaltou as conquistas de Abril para notar a forma como o ímpeto dos primeiros anos após a Revolução se perdeu. "Os portugueses interrogam-se. Que é feito desse país?", perguntou, dando uma resposta que é uma gaffe.
"Há 25 anos que não há um desígnio nacional", acusou, apontando um período temporal em que governaram Durão Barroso, Pedro Santana Lopes e Pedro Passos Coelho. Sobre esse período de governação social-democrata, nem uma palavra de exaltação, apenas a conclusão: "Há 25 anos que empobrecemos".
Perante o cenário, Miranda Sarmento sublinha a necessidade de mudar de rumo e voltar a ter o crescimento como desígnio. "Os portugueses têm de voltar a ter esperança no futuro", disse.
Ventura veio para estragar a festa
A festa foi interrompida por André Ventura, que já antes tinha protagonizado um momento de tensão, durante a receção a Lula da Silva. Para Ventura, não há motivos para festejar. "Cravos, celebração e festa num dos momentos mais negros dos portugueses", acusou o líder do Chega, que não poupou nas palavras nem no estilo retórico inflamado.
"Esta casa não pode ser um circo de corrupção", lançou, atacando Lula da Silva, mas falando também de José Sócrates e até do caso da indemnização paga pela TAP a Alexandra Reis.
No dia em que se assinala o início do fim do colonialismo português, André Ventura quis falar dos "espoliados do Ultramar", assegurando que quando chegar ao poder a "primeira prioridade vai ser para esses milhares de homens e mulheres" que são os retornados das ex-colónias.
"O Chega está e continuará a estar só nesta casa", disse, assegurando que isso não é um problema, mas uma vantagem por fazer o seu partido distanciar-se de todos os outros. "Nada me enche mais de orgulho", garantiu, num discurso que ultrapassou em mais de três minutos o tempo estipulado sem que houvesse da mesa qualquer advertência a esse respeito e que voltou à defesa dos "portugueses de bem" que Ventura acreditam estarem com o seu partido.
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