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Trump 2.0: três riscos para a economia (e os contribuintes) em Portugal

Bruno Faria Lopes
Bruno Faria Lopes 21 de janeiro de 2025 às 07:00
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As tarifas adicionais sobre o comércio internacional, a pressão sobre os gastos militares e o efeito no imobiliário dos americanos em fuga de uma nova era 'trumpiana' são frentes de impacto imediato - e quase sempre potencialmente negativo.

Que impacto terá a versão 2.0 de Donald Trump na presidência dos Estados Unidos? A pergunta tem uma ressalva - Trump significa incerteza, não só pelo que realmente fará, mas também pelos desafios políticos e legais que enfrentará (o Congresso e o Senado norte-americanos não são tão previsíveis como o Parlamento português). Ainda assim, e tendo em conta aspistas deixadas pelo 47º presidente norte-americano, é possível prever algumas frentes de impacto para Portugal. 

Tarifas e incerteza: uma dentada no crescimento  

Melina Mara/Pool via REUTERS

Tarifas adicionais sobre as exportações para os Estados Unidos, cortes nos impostos e cortes na despesa pública - a agenda de Donald Trump é feita de protecionismo económico e de promessas de encolhimento do Estado (via baixa de impostos e cortes desenhados pelo departamento co-liderado por Elon Musk, o DOGE). Isto traz uma palavra que quem gere empresas e investe em negócios teme: incerteza. 

Os efeitos de mais tarifas alfandegárias é o que terá à partida mais impacto global, dependendo da magnitude e dos países afetados. Enquanto candidato, Trump prometeu aumentar as tarifas sobre bens chineses para 60% ou mais e implementar uma tarifa universal de 10% sobre os bens de outros países. Dois economistas da gestora de ativos Invesco, Kristina Hooper e Andy Blocker, notam que as tarifas sobre a China, por exemplo, são medidas que podem ser implementadas rapidamente, em menos de três meses.

"Um maior protecionismo envolvendo as maiores economias mundiais — em particular, a imposição de tarifas aduaneiras pelos EUA e de medidas retaliatórias pelos países visados — poderá também pôr em causa as projeções para a atividade mundial, reduzindo o crescimento do comércio internacional", avisou o Banco de Portugal no boletim económico publicado no mês passado. "Este cenário de maior protecionismo torna mais imprevisíveis as perspetivas do sector exportador, sendo a incerteza acrescida também prejudicial à aceleração do investimento empresarial", acrescentou. 

Os Estados Unidos são o principal mercado extracomunitário para as exportações portuguesas e o quarto maior globalmente - para lá exportamos máquinas e aparelhos, produtos químicos, plásticos, borracha e têxteis, segundo o portal "Portugal Exporta", da agência para o comércio externo (AICEP). Seja por impacto direto nestas vendas ou pelo impacto negativo indireto nas outras economias para onde Portugal exporta, Trump é um risco negativo no imediato. 

Defesa: uma fatura de milhões para os contribuintes 

Na tomada de posse, ontem em Washington, o presidente dos Estados Unidos falou dos "países que se aproveitam de nós" - nesta lista estão os membros da NATO, a aliança militar da qual os EUA são o maior financiador (968 mil milhões de dólares no ano passado, quase o dobro de todos os membros europeus juntos mais o Canadá). A pressão para outros países contribuírem mais para a defesa e a política militar menos interventiva de Trump têm sido interpretados como um motivador de mais investimento na área militar na Europa - incluindo em Portugal, membro da NATO. 

A pressão de Trump está a levar a NATO a preparar um objetivo mais ambicioso para o peso da despesa militar (em percentagem do PIB) de cada membro. Para Portugal, que gasta menos de 2% do PIB, o mero cumprimento dessa meta até 2029, como está definido no Orçamento do Estado, significaria mais 2,8 mil milhões de euros (tendo por base o PIB nominal previsto para este ano) por ano - para a meta de 3%, o salto seria de 5,7 mil milhões. 

O Expresso, que noticiou em primeira mão o impacto (as contas do semanário são um pouco diferentes das da SÁBADO), cita duas fontes militares a dizer, sob anonimato, que esse salto na despesa é "impossível". Seja qual for o ritmo gradual de aumento da despesa, a pressão sobre o erário público, financiado pelos contribuintes, será real - falta perceber quanto e quando.

A fuga a Trump e os preços do imobiliário

Portugal já tinha sido "descoberto" antes da segunda era Trump como destino turístico pelos norte-americanos - os turistas dos EUA mais do que duplicaram nos últimos dois anos e o número de residentes quadruplicou (para cerca de 14 mil em 2023) em cinco anos. A desilusão e receio com a nova viragem política nos EUA tem aumentado o interesse em morar em Portugal - várias agências imobiliárias confirmaram ao jornal Público subidas significativas nos contactos de compradores norte-americanos.

A Confidencial Imobiliário, uma consultora de referência no mercado, revelou em abril de 2024 que cerca de um terço das casas vendidas nas áreas de reabilitação urbana em Lisboa tinham sido compradas por estrangeiros - estes valiam 40% do investimento em reabilitação. 

É incerto o impacto que os potenciais compradores norte-americanos - que gostam de casas maiores no segmento médio-alto e alto e tipicamente vêm com dinheiro para pagar a pronto - terão nas maiores cidades, como Lisboa e Porto, ou noutras regiões. Serão mais um fator de pressão numa altura em que a descida das taxas de juro e as medidas para ajudar os jovens a competirem por casas no mercado fizeram subir os preços. Como moradores, contudo, serão uma fonte potencial de receita fiscal.

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