Depois de perder a Bola de Ouro para Rodri, agora ganhou o The Best. Ao receber o prémio, Vinícius emocionou-se e lembrou as suas origens, a jogar na rua. O avançado do Real Madrid, que já foi várias vezes vítima de racismo, só tem 24 anos e já foi duas vezes decisivo na final da Liga dos Campeões, recebendo por ano um salário milionário.
"Quero seguir por muito tempo jogando no Real Madrid, que é o melhor clube do mundo, e não poderia deixar de agradecer ao Flamengo, que foi o clube que me botou no campo", referiu Vinícius Júnior depois de receber o prémio de The Best, dado pela FIFA numa cerimónia realizada em Doha, no Catar, na terça-feira, dia 17 de dezembro.
Vinícius José Paixão de Oliveira Júnior tem 24 anos e nasceu no Rio de Janeiro, Brasil: "Era tão distante que parecia impossível chegar até aqui. Era uma criança que só jogava à bola descalço nas ruas de São Gonçalo, perto do crime. Estou fazendo isto por muitas crianças que acham impossível, mas que podem chegar até aqui".
No Real Madrid desde 2018, depois de ter feito toda a formação no Flamengo, nos merengues já conquistou uma Taça do Rei de Espanha, três Supertaças, foi três vezes campeão espanhol e ganhou duas vezes a Liga dos Campeões. A este currículo, somam-se uma supertaça europeia e o Campeonato Mundial de Clubes, tendo, neste momento, um salário anual de 20,83 milhões de euros.
A nível individual, além do The Best agora recebido, foi premiado como sendo o melhor jogador jovem (2021/22) e o melhor jogador da Champions (2023/2024) e recebeu a Golden Ball do Mundial de Clubes de 2022.
Depois de receber o prémio, em entrevista à Real Madrid TV, o brasileiro afirmou: "Muita gente votou em mim, os jogadores, capitães, treinadores. É algo bom para mim, porque sei que estou no caminho correto. Muitas vezes disseram que não poderia chegar até aqui, mas sempre tive a cabeça tranquila e agora sou o melhor jogador do mundo".
O avançado brasileiro fez também uma publicação nas redes sociais onde deixou uma mensagem "para aquele menino que viu tantos ídolos levantarem esse troféu": "Chegou a sua hora. Ou melhor, chegou a minha hora. A hora de dizer...sim, sou o melhor jogador do mundo e lutei por isso".
Uma reação bem diferente do que aconteceu a 28 de outubro, aquando da atribuição da Bola de Ouro, que foi para o espanhol Rodri, médio do Manchester City. Vinícius era apontado como o favorito, mas, a poucas horas da gala, em Paris, começaram a circular informações de que seria Rodri o vencedor, e o internacional brasileiro cancelou a viagem para França. Aliás, segundo revelou na altura o jornal Marca, o Real Madrid tinha previsto levar à gala uma comitiva de 50 pessoas, mas a viagem foi anulada mesmo em cima da hora, com Florentino Pérez e os restantes elementos da direção dos merengues completamente furiosos.
Vinícius começou a jogar futebol no Flamengo, aos 5 anos, e aos 13 fez parte da Geração 2000 Rubro-Negra, que chegou a estar mais de 90 jogos sem perder, em duas épocas. Durante os anos em que jogou nas camadas jovens do Flamengo, foi cobiçado pelo Corinthians, que chegou a avançar com propostas, mas não saiu. Aos 15 anos foi campeão sub-17 no Campeonato Carioca, e fez 10 golos, numa equipa que terminou com 52 golos. Por essa altura era já chamado de "novo Neymar" e tinha os maiores clubes do mundo atrás de si.
A 8 de maio de 2016, a dois meses de fazer 16 anos, passou a integrar a equipa principal do Flamengo, e estreou-se a 13 de maio: entrou aos 82 minutos, no jogo com o Atlético Mineiro (1-1), numa partida em que teve a bola apenas durante 13 segundos (fez dois passes certos e um errado e perdeu a bola três vezes).
Em julho, quando fez 16 anos, assinou o primeiro contrato profissional com o Flamengo, que lhe estabeleceu uma cláusula de rescisão de 30 milhões de euros. Iria mais tarde renovar o contrato e aumentar a cláusula para 45 milhões, isto numa altura em que Real Madrid e Barcelona já mostravam grande interesse. O clube catalão avançou com 25 milhões, mas isso de nada valeu perante a oferta de 45 milhões de euros do Real Madrid. Vinícius, no entanto, só se iria mudar para Espanha em 2018, ao completar 18 anos.
Nas duas épocas em que se manteve no Flamengo, aproveitou para brilhar, como aconteceu a 1 de novembro de 2019, quando marcou dois golos frente ao Fluminense (num 3-3 que permitiu seguir em frente na Copa Sul-Americana). O jornalista André Rizek, da Sport TV brasileira, referiu-se a ele assim: "É um cara que pega a bola e parte para cima, com o jogo pegando fogo, ele nunca fugiu. O moleque entrou em campo indo para cima, jogando, e mostrou que já é gente grande. Vinícius tinha feito 17 anos há três meses.
Chegou ao Real Madrid em julho de 2018, com 18 anos, e foi inscrito no Real Madrid e também na equipa B, o Castilla. Mas acabaria por só estar em cinco partidas (marcou 4 golos) pela formação secundária dos merengues, começando a ganhar o seu espaço logo no primeiro ano, batendo vários recordes de precocidade - foi o primeiro jogador nascido nos anos 2000 a jogar pelo Real Madrid e o terceiro mais jovem dos merengues a ganhar a Liga dos Campeões, só suplantado por Casillas e Raúl.
Vinícius já ganhou duas Ligas dos Campeões pelo Real Madrid, e em ambas foi decisivo na final. Aliás, a 28 de maio de 2022, contra o Liverpool, marcou mesmo o único golo da partida, que valeu aos merengues a conquista da 14ª Champions da sua história. Na última época (2023/24), também marcou na final da prova, frente ao Borussia Dortmund, batendo nova marca: aos 23 anos, tornou-se o primeiro brasileiro a marcar em duas finais da Liga dos Campeões e o mais novo de sempre a consegui-lo. No início desta época, esteve também em evidência na supertaça europeia, que o Real Madrid ganhou contra a Atalanta, ao fazer uma assistência, chegando às 12 intervenções diretas em golos em 11 finais jogadas pelo clube.
Esta quarta-feira, dia 18, frente aos mexicanos do Pachuca, Vinícius Júnior pode enriquecer o seu currículo, na final da Taça Intercontinental, ele que já ganhou um Mundial de Clubes (2022), contribuindo com dois golos para a vitória dos merengues sobre o Al Hilal (5-3) – o que lhe valeu ser eleito o melhor jogador do torneio.
Nos últimos anos Vinícius tornou-se também uma importante voz na luta contra o racismo. O primeiro caso conhecido foi em 2017, quando durante um jogo entre o Flamengo e o Botafogo os seus familiares foram alvos de comentários racistas por um rival, no entanto foi já em janeiro de 2018 que se tornou mais vocal sobre o assunto fazendo uma publicação nas redes socais, em parceria com a Nike, onde vestia uma camisola com a palavra igualdade, na descrição pode ler-se: "Um mundo igual não é feito de pessoas iguais, mas de pessoas com direitos iguais para serem diferentes".
Depois de ser transferido para o Real Madrid, os casos continuaram a repetir-se e em maio de 2020, altura em que o movimento Black Lives Matter ganhava mais visibilidade, fez uma publicação no X onde aparecia metade da sua cara e metade da de George Floyd.
Um mês depois celebrou um golo, contra o Maiorca, erguendo o seu punho fechado, um símbolo associado à resistência contra problemas sociais. Já em janeiro de 2021 fez uma tatuagem na coxa esquerda com a mensagem: "Enquanto a cor da pele for mais importante do que o brilho nos olhos, haverá guerra". A partir da época de 2021/22, os ataques contra o brasileiro tornaram-se mais frequentes, ou mais visíveis, tendo sido por várias vezes chamado de macaco pelas claques dos clubes adversários, sofrendo ofensas nas redes sociais e até a utilização de um boneco negro enforcado.
A realidade é que Vinícius é conhecido pela forma provocadora como age dentro de campo, especialmente quando os ânimos estão mais quentes. Em maio de 2023, o jogo entre o Real Madrid e o Valência, no Estádio de Mestalla, chegou mesmo a ser suspenso devido a insultos racistas por parte dos adeptos do Valência, no entanto o jogo acabou por ser reatado e o brasileiro envolveu-se numa confusão que levou à sua expulsão, algo que os adeptos da casa adoraram.
O assunto ganhou uma dimensão tão grande que três adeptos foram identificados e condenados, deixando uma marca na forma como o país lida com o racismo. Vinícius reagiu afirmando: "Não sou vítima de racismo. Eu sou algoz de racistas. Essa primeira condenação penal da história da Espanha não é por mim. É por todos os pretos. Que todos os racistas tenham medo, vergonha e se escondam nas sombras. Caso contrário, estarei aqui para cobrar".
Em março de 2023 já tinha abordado o assunto numa conferência de imprensa: "O meu pai sempre teve dificuldade por ser negro. Entre ele e um branco, sempre vão escolher um branco. Tenho lutado bastante por tudo o que tem acontecido comigo. É desgastante por estar meio sozinho. Já fiz tantas denúncias e ninguém é punido, nenhum clube é punido. A cada dia, luto por todos que passam por isso. Se fosse só por mim e pela família, não sei se continuaria. Mas fui escolhido para defender uma causa bem importante e que eu estudo a cada dia para que no futuro o meu irmão, de 5 anos, não passe pelo que eu estou a passar".
Na atribuição do The Best, em segundo lugar ficou Rodri, o médio espanhol do Manchester City que em outubro venceu a Bola de Ouro, e em terceiro ficou Bellingham, médio inglês que partilha o dia a dia com Vinícius no Real Madrid.
A FIFA premeia o melhor jogador do mundo desde 1991, e a melhor jogadora desde 2001, no entanto o atual formato da cerimónia do The Best foi criado em 2016 e antes era chamado de Melhor Jogador do Mundo pela FIFA. Este é um prémio que depende das votações de todos os capitães e selecionadores principais de todos os países afiliados da FIFA, assim como de um jornalista de cada Federação filiada e do público.
No novo formato, Vinícius foi o primeiro jogador brasileiro a conseguir conquistar o prémio, seguindo-se ao argentino Lionel Messi. Messi, antigo craque do Barcelona e agora no Inter Miami (EUA) venceu três edições, enquanto Cristiano Ronaldo (outra figura do Real Madrid) e o polaco Lewandowski têm dois troféus cada.
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