Cheguei à pequena escola básica que há largos anos frequentei (suficientemente largos para não irmos por aí) pelas 17h03. Como já é habitual, não havia grandes filas, apenas três ou quatro pessoas à porta, todas devidamente distanciadas e equipadas com o acessório do momento - a máscara (pequeno aparte: vejo cada vez mais P2, daquelas que os médicos usam, pelas ruas de Lisboa). Cinco minutos depois estava de saída, pela primeira vez na vida sem votar. Na verdade, só não votei porque já o tinha feito antes. Confuso? Tal como mais de 200 mil portugueses, no fim-de-semana passado enfrentei o caos para estacionar e 230 metros de fila a pé (valham-nos os pedómetros para manter estes registos) até conseguir finalmente preencher o boletim de voto na Faculdade de Direito, em Lisboa. Não foi apenas o dever cívico que me fez enfrentar a fila. Votar no dia 17 de janeiro era essencial para o passo seguinte.
Nessa altura, já sabia que ia voltar uma semana depois, para verificar que os votos antecipados estavam devidamente contabilizados. O objetivo era perceber que, em querendo, não nos era mesmo permitido votar duas vezes. Nem a nós nem a ninguém. Mesmo que isso fosse possível, nunca o faríamos, claro. A estratégia estava definida à partida: se nos entregassem o boletim de voto - o que não aconteceu - diríamos que já tínhamos votado e que, enquanto jornalistas, estávamos apenas a fazer um teste. Ou seja, diríamos sempre a verdade e nunca votaríamos uma segunda vez, só queríamos perceber se o nosso nome estava devidamente bloqueado. Até porque o SMS a indicar o local de voto (que também testámos) continuava a remeter-nos para o sítio ao qual nos devíamos dirigir, sem nenhuma indicação de que já o tínhamos feito.
Às 17h05, e enquanto uma das três pessoas presentes na sala lia o o meu nome em voz alta, outra estendia-me o boletim de voto num gesto automático de quem não estava à espera que alguém tentasse votar duas vezes. Ou de quem nunca teve que lidar com isso (ainda bem, certo?) Não cheguei a segurá-lo. Pedi para esperar. Mesmo assim, ninguém pareceu suspeitar de nada. "O que é que tu tens aí?", perguntou o primeiro elemento na sala, depois de ler o meu nome, a um terceiro. "Voto antecipado", ouviu-se. "Eu também", confirmou ele. Foi aí que mostrei a carteira profissional e expliquei que se tratava apenas de um teste. Do outro lado, imperou o fair play (e alguns risos bem dispostos em tempo de pandemia): "vocês são muito importantes para a democracia", disse o primeiro elemento. Ainda atirei um: desculpem esta pequena perturbação - mesmo pequena, havia uma única pessoa atrás de mim e não estive mais de dois minutos na sala. "De nada, obrigada por testarem".
24 de janeiro de 2020, 11:30. Estava na fila da escola EB1/JI da Portela de Sacavém para cumprir o meu direito cívico... pela segunda vez. Se dia 17 fui à reitoria da cidade universitária exercer o meu direito de voto antecipado, fui ao meu posto de recenseamento tentar votar pela segunda vez. Em ano de pandemia e com o voto antecipado a bater recordes e a triplicar face a 2016, será que vou conseguir?
Da fila às urnas, foram 15 minutos de espera, muito menos do que os quase 40 minutos de dia 17. Ao chegar, uma das cinco pessoas na mesa pediram o meu nome. E eu disse com orgulho: "Alexandre José Ribeiro Malhado." Enquanto procurava tranquilamente pelos meus dados nos cadernos de recenseamento, o rosto calmo transformou-se em pânico. - AC página nove... HAN? Então é Alexandre José Ribeiro... Malhado? Certo?- Certo.
- Mas... já temos aqui o seu voto.
Ao avisar que era jornalista da SÁBADO, a reação foi de alívio. "Que susto!", disse. "Olhe, a democracia funciona", disse aos risos. Da parte da mesa só veio risos: Obrigado, sr. jornalista!"
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