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Pablo Hasél, o novo símbolo da liberdade de expressão em Espanha

Mariana Branco
Mariana Branco 12 de fevereiro de 2021 às 15:47
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Tweets e uma canção que um tribunal espanhol considerou como injúrias à monarquia e enaltecimento do terrorismo levaram a que um rapper catalão fosse condenado a nove meses de prisão.

Pablo Rivadulla Duro, conhecido artisticamente como Pablo Hasél, foi condenado a nove meses e um dia de prisão pelo Supremo Tribunal espanhol. Canções e mensagens publicadas nas redes sociais foram consideradas injúrias à monarquia, incitadoras de violência e enaltecedoras do terrorismo. O rapper catalão tem até esta sexta-feira para se entregar voluntariamente às autoridades mas garante que não o vai fazer. Milhares mobilizaram-se para mostrar apoio.

Pablo Hasél
Pablo Hasél Getty Images

Os feitos pelos quais é condenado remontam ao período entre 2014 e 2016, quando publicou 64 mensagens no Twitter e uma canção no YouTube. Numa das mensagens, a acompanhar uma fotografia de um membro do grupo terrorista Grapo, escreveu: "As manifestações são necessárias, mas não suficientes. Apoiemos aqueles que foram mais longe". Contava, na altura, com mais de 54 mil seguidores no Twitter. Alguns tweets do catalão faziam ainda referência ao rei emérito Juan Carlos, a quem chamava chefe da máfia.

Pablo Hasél foi condenado em 2018 a uma pena de prisão de dois anos, tendo esta sido reduzida com a justificação de que as suas mensagens "não representavam perigo real" para ninguém. Em maio de 2020,  o Supremo Tribunal confirmou a decisão.

Através da mesma rede social, Hasél comunicou agora que o prazo para se entregar voluntariamente termina às 20h00 desta sexta-feira mas assegurou que não o vai cumprir. "Seria uma humilhação indigna ir pelo meu próprio pé perante uma sentença tão injusta. Terão que vir sequestrar-me", escreveu.

No início de fevereiro, em conferência de imprensa citada pela Europa Press, Pablo Hasél disse que não irá pedir nenhum indulto e descartou o caminho do exílio. "Se o que procuram é silenciar a mensagem e que outros não a reproduzam, o facto de me prenderem vai resultar no oposto e pode ser mais útil para a causa do que estar exilado", afirmou.

Manifestação Pablo Hasél
Manifestação Pablo Hasél Reuters

Solidariedade e alteração ao Código Penal

Nas últimas semanas foram dezenas as manifestações por Espanha contra a detenção de Pablo Hasél. A sua condenação fez ainda mexer o meio cultural espanhol, com mais de 200 artistas, entre os quais o realizador Pedro Almodóvar e o ator Javier Bardem, a assinar um manifesto a reclamar a liberdade do rapper catalão. "O Estado espanhol passou a encabeçar a lista de países que mais artistas condenou pelos conteúdos das suas canções", denunciaram, equiparando o país a outros como a Turquia ou Marrocos.

"A prisão de Pablo Hasél faz com que a espada de Dâmocles que paira sobre a cabeça de todas as figuras públicas que ousem criticar publicamente a atuação de alguma das instituições do Estado se torne ainda mais evidente", lê-se no manifesto divulgado na segunda-feira.

Horas depois da divulgação do manifesto, o governo espanhol anunciou estar a preparar uma alteração ao Código Penal para que estes delitos deixem de acarretar pena de prisão. O executivo anunciou que o ministério da Justiça vai alterar a definição dos delitos "para que apenas se castiguem condutas que suponham claramente um risco para a ordem pública ou a provocação de algum tipo de conduta violenta, com penas dissuasórias mas não privativas da liberdade".

Apesar de não fazer nenhuma referência ao caso do rapper catalão, a nota citada pela imprensa espanhola ressalva que "o ministério, na sua proposta, vai considerar que aqueles excessos verbais cometidos no contexto de manifestações artísticas, culturais ou intelectuais permaneçam à margem do Código Penal".

A reforma do Código Penal deverá ainda incluir a revisão do crime de sedição, pelo qual os ex-governantes catalães foram condenados a longas penas de prisão. 

Nas redes sociais, o rapper reagiu: "O governo está nervoso perante as numerosas mobilizações (várias que proibiu) e demonstrações de desagrado, por isso tenta lavar a cara dizendo que vai mandar abaixo os pontos do Código Penal com os que nos condenam. Se não fosse pela mobilização nem tinham dito isso, mas sem mais mobilização não vão cumprir como não cumprem tantas outras promessas", escreveu. "Estas declarações tentam travar a solidariedade e desmobilizar a minha prisão sem que tenham feito nada para o evitar quando o podiam ter feito".

Condenações anteriores

Antes da mais recente decisão do tribunal, Hasél tinha já a justiça atrás. Em março de 2015 recebeu uma condenação de dois anos de prisão por escrever e partilhar canções que vangloriavam ataques perpetrados por grupos terroristas. No entanto, nunca chegou a cumprir pena. 

Foi ainda acusado por, em 2016, agredir um jornalista da TV3 numa conferência de imprensa, tendo um juiz considerado provado que Pablo Hasél o "empurrou, insultou e borrifou com um líquido de limpeza".

O rapper é ainda investigado pela justiça espanhola pela sua alegada participação na tentativa de assalto à subdelegação do governo de Lleida, em março de 2018, durante um protesto pela detenção de Carles Puigdemont na Alemanha. 

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