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O que acontece depois de ser declarado genocídio? “Nenhum governo quer ser associado a um genocídio”

Débora Calheiros Lourenço 22 de setembro de 2025 às 07:00

Apesar de ser pouco provável que existam consequências legais para Israel, Joana Ricarte explica que ao ser considerado que está a ocorrer um genocídio na Faixa de Gaza o governo israelita fica mais isolado.

Várias são as organizações internacionais que já declararam que os atos de Israel em Gaza podem ser considerados genocídio. A , o Centro Europeu para os Direitos Humanos e Constitucionais, o Centro para os Direitos Constitucionais americano, o Instituto Lemkin Para a Prevenção do Genocídio, a, o grupo de defesa dos direitos humanos israelita B’Tselem, os Médicos Pelos Direitos Humanos fizeram-no devido à escalada da resposta ao ataque do Hamas a 7 de Outubro de 2023, mais recentemente órgãos da ONU também referiram que os palestinianos em Gaza enfrentam um genocídio. 
Num campo de refugiados, uma mulher alimenta uma criança AP Photo/Abdel Kareem Hana
Na semana passada a Comissão de Inquérito da ONU sobre os direitos humanos nos territórios palestinianos ocupados concluiu que . Segundo a comissão, Israel cometeu quatro dos cinco critérios da Convenção das Nações Unidas para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio: matar; causar danos físicos ou mentais graves; impor deliberadamente condições de vida calculadas para provocar a destruição total ou parcial de uma população; e impor medidas destinadas a impedir os nascimentos. Joana Ricarte explicou à SÁBADO que o mais recente relatório traz uma nova perspetiva sob as alegações de genocídio uma vez que “se trata de uma análise legal às ações de Israel tendo em conta as Convenções de Genebra”, isto faz com que seja “o relatório mais importante para o Tribunal Internacional de Justiça”.  No entanto a especialista em relações internacionais afirma que “todos os outros relatórios têm um importante impacto político”: “Nenhum governo quer ser associado a um genocídio”. Assim sendo, as principais implicações de as ações de Israel em Gaza serem reconhecidas enquanto um genocídio não são legais, até porque Israel não reconhece o Tribunal Penal Internacional nem o Tribunal Internacional de Justiça, da ONU, mas sim no isolamento de Israel na comunidade internacional.   “Começamos a assistir a mudanças políticas muito claras e concretas devido à interpretação mais clara de que estamos a assistir a um genocídio”, afirma Joana Ricarte dando como exemplo a proposta da Comissão Europeia para que as concessões comerciais com Israel, que contam do Acordo de Associação, sejam suspensas.   Ainda assim Joana Ricarte acredita que ainda há muito espaço para aumentar a pressão sobre Israel. “Os Estados Europeus têm muito poder, na guerra na Ucrânia esforçamo-nos muito para exercer pressão sobre a Rússia e o poder da União Europeia nunca é questionado, mas quando falamos de Israel dizemos sempre que a Europa pode não ter poder para fazer pressão sozinha, tendo em conta a proximidade de Israel com os Estados Unidos”, afirma a especialista.  Sobre a , que ainda tem de ser aprovada pelo Conselho Europeu, Joana Ricarte reforça que “estamos a falar de uma suspensão de 37% do acordo de associação, que mantém o acesso ao mercado livre para o comercio de armas, e que tem um impacto de apenas 5,6 mil milhões de euros enquanto as trocas comerciais de Israel com a UE têm um valor de 42,8 mil milhões de euros”, pelo que considera a medida pouco ambiciosa.  A investigadora acredita que a utilização da palavra genocídio também acelerou “o reconhecimento da Palestina por parte de Estados como o Reino Unido e ”. Além disso “a Declaração de Nova Iorque também aponta para o reconhecimento do Estado da Palestina”, no entanto Joana Ricarte alerta que “o reconhecimento não é o mais importante”: “O essencial agora é parar a guerra porque senão não vai haver nenhum Estado da Palestina para reconhecer”.   Assim sendo acredita que muitas das medidas anunciadas para tentar travar as operações israelitas não passam de “peacewashing”, mais uma vez motivada pela “pressão exercida pelas declarações de genocídio” assim como pelo descontentamento da população civil.   Israel tem considerado todos os relatórios que apresentam estas conclusões como sendo falsos e garante que muitos dos investigadores e trabalhadores humanitários são “representantes do Hamas”. No entanto Joana Ricarte recorda que “vários atores políticos israelitas assumem, sem vergonha nenhuma a intenção por detrás das ações de Israel, Netanyahu já disse em inglês para todos ouvirmos: ‘’ (Não haverá um Estado palestiniano, em português)”.   A investigadora vai mais longe e considera que “os ataques israelitas que hoje vemos nada têm a ver com o 7 de Outubro, o ataque nada mais foi do que uma oportunidade para aprofundar a política externa que há que Israel já defendia”. Para Joana Ricarte não é correto considerar o que se está a passar na Faixa de Gaza como uma guerra: “Não é uma guerra porque não existem dois exércitos, é um contexto onde um movimento terrorista e toda uma população luta contra um estado que está a cometer genocídio”. 
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