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Nova lei restringe vídeos, música e mensagens no Reino Unido

O objetivo é impedir o acesso de menores a conteúdo digital impróprio, mas opositores argumentam que abre portas à supressão do discurso online.

Para alguns, é um dos mais restritivos enquadramentos legais para conteúdo digital a serem implementados na Europa; para outros, é um passo importante na proteção da internet contra conteúdo ilegal. Proposto e aprovado em 2023 pelo Partido Conservador britânico, na altura no poder, o Online Safety Act cria novas obrigações de eliminação de conteúdo impróprio para plataformas digitais de jogos, vídeos ou música, e dá ao governo amplos poderes de suprimir o acesso a incumpridores.

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De acordo com a página oficial do governo britânico, a Lei de Segurança Online, cujas provisões mais significativas entraram em vigor na passada sexta-feira, 25, consiste num "conjunto de leis que protege crianças e adultos online", tornando as empresas "mais responsáveis pela segurança dos seus utilizadores nas suas plataformas" através de um conjunto de "novos deveres de implementar sistemas e processos para reduzir o risco de os seus serviços estarem a ser usados para atividades ilegais, e de remover conteúdos ilegais quando surgirem". 

As medidas incluem "prevenir o acesso de crianças a conteúdo prejudicial e inapropriado e dar a pais e crianças formas claras e acessíveis de reportar problemas online", mas também "proteger utilizadores adultos, garantindo que as grandes plataformas sejam mais transparentes sobre os conteúdos potencialmente prejudiciais que permitem, e dar às pessoas mais controlo sobre o tipo de conteúdo que querem ver".

Como principal alvo da iniciativa, a legislação define "conteúdo ilegal", que deve ser removido das plataformas e impedido de aparecer no futuro, as representações de abuso sexual a crianças, comportamento controlador ou coercivo, violência sexual extrema, pornografia extrema, fraude, "ofensas agravadas à ordem pública" de índole racial ou religiosa, incitação à violência, imigração ilegal, tráfico de seres humanos, promoção ou facilitação de suicídio, "abuso de imagens íntimas", venda de drogas ou armas ilegais, exploração sexual e terrorismo.

Além destas, terminantemente proibidas, a lei determina que as crianças estejam impedidas de aceder a conteúdos pornográficos ou de incitação ou promoção de auto-mutilação, distúrbios alimentares e suicídio. Já conteúdos relativos a bullying, abuso, ódio, violência, acrobacias ou desafios perigosos ou ingestão de substâncias nocivas não estão proibidos a menores de idade, mas sim sujeitos a um controlo de idade.

Às novas normas estão sujeitos motores de busca e qualquer serviço "que permita aos utilizadores publicar conteúdo digital ou interagir entre si" e que estejam a operar no Reino Unido. A definição inclui, portanto, plataformas de redes sociais, partilha de vídeos e armazenamento de dados, fóruns digitais, plataformas de encontros e serviços de mensagens. A alteração à lei introduz ainda novos tipos de crime cibernético, incluindo a partilha de imagens íntimas (cyberflashing), ameaças de morte ou ofensa grave, ou imagens com flashes para pessoas que sofram de epilepsia.

Também a desinformação será abordada pela nova lei, embora o texto tenha o cuidado de procurar "proteger a liberdade de expressão" ao mesmo tempo que aborda "os maiores riscos para os utilizadores". Deste modo, só serão visados conteúdos de desinformação considerados "ilegais ou prejudiciais para crianças", incluindo "desinformação e interferência patrocinada por estados", classificados como "ofensa de interferência externa".

As mudanças serão supervisionadas e reguladas pelo Ofcom, ou Office of Communications (Gabinete de Comunicações) britânico, que terá o poder de monitorizar o quão eficazes estão a ser as ferramentas implementadas pelas plataformas para proteger os utilizadores, e multar, indiciar ou, em casos extremos, impedir essas plataformas de operar no Reino Unido ou obter fontes de rendimento. Em caso de incumprimento, as multas estão fixadas em quase €21 milhões ou 10% do rendimento global da empresa, selecionado pelo valor maior.

Proteger crianças ou limitar expressão?

O âmbito e a aplicação da lei dividiu opiniões no Reino Unido. O apoio veio sobretudo de organizações que vincam a componente de defesa das crianças no uso da internet: a Sociedade Nacional para a Prevenção da Crueldade contra Crianças (NSPCC) chamou o momento da sua promulgação "um grande dia para as crianças", ao passo que a Agência Nacional do Crime, divisão do MAI britânico, vincou a sua importância para "salvaguardar as crianças". Já a organização Samaritans, de apoio a distúrbios emocionais e prevenção de suicídio, apoiou a medida, mas lamentou a falta de ambição em tornar o Reino Unido "o lugar mais seguro para se estar online". 

Os seus opositores, por outro lado, vincam a limitação de liberdades no espaço digital e a expansão de poderes, temendo uma deriva autoritária na internet britânica. É o que diz a organização de direitos humanos Article 19, que apelida o Act de "legislação extremamente complexa e incoerente", ou o Open Rights Group, que lhe chamou uma "carta de censura".

Outra crítica prende-se com a consagração de amplos poderes ao governo britânico para regular o discurso, infringir a liberdade de expressão dos seus cidadãos e pressionar empresas a remover conteúdos à revelia do sistema judicial - incluindo, crucialmente, na troca de mensagens com encriptação ponta-a-ponta. Grandes empresas como a Apple e a Meta (detentora do Facebook, Instagram e WhatsApp) criticaram fortemente a infração da privacidade que estas medidas implicariam, representando a instalação de ferramentas de vigilância disfarçadas de moderação de conteúdos.

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