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Benfica-Sporting: as histórias e os protagonistas das oito finais da Taça de Portugal

Com o jogo deste domingo, será a nona vez que águias e leões se defrontam na partida decisiva da prova-rainha, com os encarnados em vantagem: ganharam seis. Fomos à procura de curiosidades e figuras destes jogos, desde o primeiro frente a frente, com um hat-trick de Rogério Pipi, o jogador com mais golos nas finais, até ao bis de João Vieira Pinto, no tristemente célebre dia em que um adepto foi morto por um very light.

A final da Taça de Portugal deste domingo, 25 de maio, opõe Benfica e Sporting, sendo que os leões, já campeões nacionais, podem fazer a 6ª dobradinha da sua história. Para o Benfica, este jogo é uma espécie de tábua de salvação, depois da perda dolorosa do campeonato com o empate caseiro diante dos leões (e apesar de o Benfica já ter festejado esta época a conquista da Taça da Liga à custa do Sporting, no desempate por penáltis).

Benfica e Sporting já se defrontaram na final da prova-rainha por oito vezes sendo que o Benfica saiu triunfante em seis delas. A última vez que os dois gigantes de Lisboa estiveram frente a frente nesse jogo decisivo aconteceu em 1996, há quase 30 anos, numa partida que iria entrar para a história pelo triste caso do adepto sportinguista morto por um very light.

Se formos olhar para o historial dos três grandes, vemos que no que respeita a triunfos na Taça de Portugal, o Benfica segue com 26 troféus conquistados, seguindo-se o FC Porto, com 20, e o Sporting em terceiro, com 17. O Benfica, se vencer, irá por fim a oito anos sem levar a taça para casa (a última vez que ganhou foi em 2016/17), enquanto o Sporting não ganha desde 2018/19.

No que respeita a finais, a mais comum é a que opõe Benfica e FC Porto (já aconteceu por 10 vezes), sendo que o Sporting e o FC Porto já se defrontaram na final da Taça de Portugal em seis edições - mas em três delas teve de haver um novo jogo, uma finalíssima. Aliás, nunca uma final da Taça entre leões e dragões ficou resolvida nos 90 minutos. Nas três últimas edições, duas tiveram de ser decididas no prolongamento (foi o caso da de 2024) e outra nos penáltis.

Lembramos-lhe aqui o que aconteceu nas oito anteriores finais entre Benfica e Sporting, com foco particular no jogo decisivo mas também no que aconteceu nas épocas em questão e procurando sempre trazer algumas histórias ou figuras em destaque. E fazendo votos de que, independentemente do vencedor, neste domingo tudo decorra dentro da normalidade, sem confrontos entre adeptos.

1951/52 – Benfica 5, Sporting 4

A primeira final da Taça de Portugal entre Benfica e Sporting teve nove golos, ainda hoje um recorde em finais. O jogo, disputado no estádio Nacional a 15 de junho de 1952, teve como figura o benfiquista Rogério Pipi, autor de um hat-trick, sendo que foi ele que fez o 5-4 final, no último minuto.

Esta nem foi a maior proeza de Rogério em finais de Taça de Portugal, ele que é o maior marcador nos jogos decisivos da prova-rainha, com 15 golos. Antes, nos 8-0 ao Estoril, em 1943/44, fez cinco golos; e já na década de 50 (1950/51), assinou um póquer nos 5-1 à Académica de Coimbra.

Rogério, que morreu em 2019, contava em 2004, numa entrevista ao site Maisfutebol, que até ele estava espantado pelas suas performances nas finais. "Penso como é que marquei tantos golos e continuo a dizer que podia ter feito muito mais se tivesse jogado a interior e não a extremo", referiu.

Sobre o 5-4 ao Sporting, recordou que a seguir pôs-se a queimar tempo, para ver se aquilo acabava: "Quando marquei o golo, os colegas abraçaram-me e os diretores até entraram em campo. Então, o Félix teve uma ideia e disse-me para eu desmaiar. E eu deixei-me cair para o chão".

Na mesma entrevista, revelou que a seguir à vitória no Jamor, quando saiu do autocarro no Rossio, na Baixa lisboeta, para ir apanhar o elétrico, alguém o descobriu, mesmo indo todo arranjado, de fato e gravata (daí o apelido Pipi), e lá teve de ir com os adeptos, cheios de bandeiras, dar voltas à praça. "Estive naquilo uma meia-hora. Eu já lhes dizia que tinha de ir ter com a minha namorada ao cinema, já lhes dizia tudo, mas eles não me largavam".

1954/55 – Benfica 2, Sporting 1

Foi uma época em cheio para o Benfica: impediu o penta dos Cinco Violinos no campeonato, fez a dobradinha com a vitória na Taça de Portugal também sobre os leões e ainda inaugurou o estádio da Luz (a 1 de dezembro de 1954).

Mário Coluna, uma das figuras desse Benfica, recordou, em declarações a Rui Miguel Tovar no Almanaque do Benfica: "O Benfica passou por uma revolução, com a entrada do Otto Glória. Ele entendia de futebol, era um bom conselheiro e deu-me sempre muita força para ser o capitão dentro de campo. Naquele tempo, os treinadores não podiam levantar-se e falar para o campo, senão eram expulsos pelo árbitro. Assim, ele dizia-me: ‘Coluna, lá dentro és o responsável’".

Na final da Taça de Portugal dessa época, na qual o Benfica conseguiu a segunda dobradinha da sua história (a primeira fora em 1942/43), o Sporting até começou a ganhar, com um golo de Martins, aos 47 minutos. Mas um bis de Arsénio, aos 63 e 65 minutos, fez a reviravolta e deu o triunfo aos encarnados.

Nascido no Barreiro, em 1925, Arsénio mudou-se do Barreirense para o Benfica em 1943, tendo ficado nas águias durante 12 épocas. E só saiu porque não aceitou profissionalizar-se, queria jogar e continuar a trabalhar. Assim, depois de deixar o Benfica ainda representou CUF, Montijo, Cova da Piedade e Monte da Caparica, onde acabou a carreira aos 40 anos.

Estes golos na final da Taça de Portugal são apenas dois de uma carreira prolífica no Benfica, pois em 446 jogos pelas águias conseguiu 360 golos – e conquistou 10 títulos, incluindo três campeonatos nacionais.

Entre as suas maiores façanhas estão o hat-trick no 7-2 ao Sporting, na 18ª jornada do campeonato de 1945/46, e os cinco golos que marcou ao FC Porto no jogo amigável que assinalou a inauguração do estádio das Antas, em 1952, numa partida que terminou com a vitória da equipa lisboeta por 8-2.

1969/70 – Benfica 3, Sporting 1

Foi a primeira de três finais seguidas entre Benfica e Sporting na Taça de Portugal (e foram quatro em cinco anos). Nessa final, disputada no estádio Nacional, a 14 de junho de 1970, os golos encarnados foram da autoria de Artur Jorge (aos 14 minutos), Torres (50) e Simões (63), tendo reduzido o sportinguista Peres aos 83.

A Taça de Portugal acabaria por salvar a época do Benfica, que na prova-rainha marcou 30 golos em nove jogos, sendo de destacar os 8-0 ao Leixões e os 6-1 ao Boavista, numa edição em que o Vit. Guimarães ainda ameaçou as águias, pois na primeira mão dos quartos de final ganhou em casa por 2-0, perdendo depois na Luz (o 4-1 que desempatou a eliminatória foi marcado por Torres aos 75 minutos).

Esta foi uma época que teve um início conturbado para o Benfica, devido às incertezas na renovação do contrato de Eusébio, assim como à dança de treinadores e à inédita eliminação por moeda ao ar na Taça dos Campeões Europeus, frente aos escoceses do Celtic (como não havia penáltis nem jogo de desempate, de nada valeu o 3-0 de resposta ao mesmo resultado da primeira mão, com o golo de Diamantino aos 90 minutos e o prolongamento a deixar tudo na mesma).

1970/71 – Sporting 4, Benfica 1

À quarta final entre leões e águias, o Sporting conseguiu o seu primeiro triunfo, numa época marcada por grande rivalidade entre os dois clubes. O Benfica seria campeão, com três pontos de avanço, recuperando o título perdido no ano anterior para os leões, que assim impediram o tetra das águias.

Ainda antes da Taça de Portugal, no campeonato, a 27 de dezembro de 1970, o Benfica recebeu e goleou o Sporting por 5-1, com três golos de Artur Jorge, um de Eusébio e outro de Nené, sendo que na véspera os adeptos leoninos foram ao estádio da Luz pintar de verde e branco a águia que estava à entrada.

Na final da Taça, triunfo fácil para os leões, como demonstrava o título do jornal A Bola: "Nem a um funeral se pode ir com tal defesa". O Sporting venceu por 4-1 e aos 33 minutos já ganhava por 3-0, com golos de Dinis, Nélson e Chico, reduzindo o Benfica aos 59 por Eusébio, de penálti.

"O gajo trocou-me os olhos, eu para um lado, a bola para o outro", reconheceu o guarda-redes Damas, que ainda aproveitou para realçar o facto de ter sido praticamente um espetador: "Não tive trabalho quase nenhum, foi um dos jogos mais fáceis que tivemos com o Benfica. Cada vez que íamos à baliza do José Henrique, marcávamos".

O presidente leonino, Guilherme Brás Medeiros, também usou a ironia: "Como o Benfica vai ganhar 11 campeonatos nos próximos 12 anos, temos de nos contentar em ganhar umas taçazinhas".

1971/72 – Benfica 3, Sporting 2

Na terceira final consecutiva entre os dois rivais lisboetas, desta vez a Taça de Portugal foi para o Benfica (vitória por 3-2), que teve uma época em cheio, conquistando também o campeonato e chegando às meias-finais da Taça dos Campeões (eliminado pelo Ajax).

Artur Jorge, nessa época o maior goleador das águias (33 golos, sendo 28 no campeonato, ficando à frente de Eusébio, que no total da época marcou 27), lembrou no Almanaque das Águias:

"Tínhamos um treinador especial, Jimmy Hagan, que impôs outras ideias, outra cultura e outra maneira de lidar com os jogadores. A sua disciplina férrea e dura, uma novidade em Portugal, fazia com que os jogadores trabalhassem mais com o ojetivo de atingir o máximo. Por isso, ganhámos com relativa facilidade o campeonato e a Taça de Portugal, na qual goleámos o FC Porto por 6-0 na meia-final e ganhámos ao Sporting na final (3-2), graças ao grande Eusébio".

Com efeito, Eusébio fez um hat-trick, num jogo que só foi decidido no prolongamento e em que o Sporting esteve a ganhar por 1-0 e 2-1. Eusébio fez o 2-2 aos 70 minutos e deu o triunfo ao Benfica aos 118, numa altura em que o treinador Jimmy Hagan, como confessaria, já pensava na finalíssima.

Curiosamente, tanto Benfica como Sporting eram treinados por técnicos ingleses, e se calhar por isso não nos podemos surpreender que o treinador do Sporting, Ronnie Allen, tenha abandonado o estádio Nacional no carro do treinador do Benfica, como se conta no livro Equipamentos com História. "A minha equipa não tem disciplina suficiente, mas vou tratar disso", avisou o técnico antes de ir embora.

1973/74 – Sporting 2, Benfica 1

Vencedor da Taça de Portugal na época anterior (3-2 ao Vit. Setúbal), o Sporting chegou novamente à final, e outra vez contra o Benfica. Os leões venceram por 2-1, e de forma épica, com Chico a fazer o 1-1 aos 89 minutos e depois Marinho a marcar o 2-1 já no prolongamento (107 minutos).

Esta foi a segunda vitória dos verdes e brancos sobre o Benfica em finais da Taça de Portugal (e a última vez que conquistaram o troféu contra os seus grandes rivais lisboetas, já lá vão mais de 50 anos).

O triunfo na Taça de Portugal foi o corolário de uma grande época para os leões, que venceram o campeonato com dois pontos de avanço sobre o Benfica. Foi também o início do período de João Rocha como presidente (eleito em setembro de 1973).

E para consumar esta dobradinha, o Sporting nem precisou do seu grande goleador, Victor Yazalde, que no campeonato marcou 46 golos (uma média de 1,58 por partida, ainda hoje um recorde que nem Jardel ou Gyokeres conseguiram derrubar). O astro argentino, contudo, não participou em nenhum jogo da Taça de Portugal.

Esta foi uma época marcada pelo insólito momento vivido pelos sportinguistas na eliminatória com o Magdeburgo, da RDA, nas meias-finais da Taça das Taças. Além do azar das oportunidades desperdiçadas em casa (ficou 1-1 e Dinis falhou um penálti) e também na Alemanha Oriental, onde os leões perderam por 2-1, o que marcou essa eliminatória foi o que aconteceu fora do campo.

Com efeito, o Sporting fez o jogo da segunda mão a 24 de abril de 1974, em Magdeburgo, e quando a equipa tentou embarcar de Frankfurt para Lisboa, foi informada do golpe de Estado dos Capitães de Abril e teve de voar para Madrid, seguindo depois de autocarro para Portugal, com a comitiva apenas a passar a fronteira no dia 26, às 8h da manhã, após um telefonema do presidente João Rocha para o general Spínola ter desbloqueado a situação.

1986/87 – Benfica 2, Sporting 1

Mais uma dobradinha, a 9ª da história do Benfica, e que "nada fazia prever", conforme admitiu Rui Águas no Almanaque do Benfica. "O plantel era curto, embora muito coeso, e tínhamos um treinador rigoroso: John Mortimore. Não era simpático nem afável, mas sim eficaz".

No campeonato, o Benfica nem começou muito bem, com 3 empates à 9ª jornada. E em novembro, depois do empate (1-1) nas Antas, na supertaça, as águias perderam na segunda mão, em casa, por 4-2 com o FC Porto, com dois golos de Futre. Lembra Rui Águas: "Foi a supertaça do Futre. Ele estava em grande forma e fomos incapazes de contrariá-lo".

O avançado continua a desfiar as suas memórias, passando para o 7-1 do Sporting, com quatro golos de Manuel Fernandes. "Quando ainda nos estávamos a recompor dessa derrota com o FC Porto, na Luz, fomos goleados pelo Sporting em Alvalade. Lembro-me de ter estado em dúvida, pois lesionei-me na semana anterior, com o Belenenses, mas acabei por jogar. Foi daqueles dias em que tudo nos correu mal e tudo correu bem à outra equipa. Sofremos bastante, mas as grandes equipas veem-se nas horas más e é curioso dizer que essas duas derrotas acabaram por nos lançar para os triunfos no campeonato e na Taça de Portugal".

No Jamor, o Benfica venceu o Sporting com dois golos de Diamantino (aos 39 e 55 minutos), de nada valendo o golo de Marlon Brandão aos 80 minutos. Formado no Vit. Setúbal, Diamantino iria mudar-se para o Benfica em 1980, com apenas 18 anos. Nas águias, após duas épocas de pouca utilização, iria ser emprestado a Amora e Boavista, voltando à Luz em 1982 para se afirmar – nas oito épocas seguintes esteve em 298 jogos pelo Benfica, marcando 84 golos. No total da carreira (iria pendurar as botas em 1994, no Vit. Setúbal) ganhou 11 troféus, incluindo 4 campeonatos e 5 Taças de Portugal.

1995/96 – Benfica 3, Sporting 1

A última final da Taça de Portugal entre os grandes de Lisboa aconteceu a 18 de maio de 1996, já lá vão quase 30 anos, e teve como figura João Pinto, que marcou dois golos na vitória encarnada (3-1) sobre os leões.

Mas essa partida iria ficar na história por outros motivos, bem mais tristes: a morte de um adepto leonino, atingido na bancada do estádio nacional por um very light lançado pela claque encarnada.

Tudo se precipitou logo no início do jogo. Aos 9 minutos, Mauro Aires abriu o ativo para os encarnados e, nos festejos, Hugo Inácio, adepto benfiquista, atirou um foguete que atravessou o campo e foi acertar, na bancada do outro lado, no sportinguista Rui Mendes, um adepto de 36 anos, causando-lhe a morte.

Apesar da tragédia que se desenrolava nas bancadas, o jogo prosseguiu, com o Benfica a vencer por 3-1, tendo chegado aos 3-0 aos 67 minutos, com o tal bis de João Vieira Pinto, de nada valendo o golo de Carlos Xavier aos 83 minutos, de penálti.

Já em 2011, os pais de Rui Mendes recordavam e lamentavam a tragédia, em declarações ao Correio da Manhã. Isto depois de terem surgido notícias que o autor do disparo do very light, Hugo Inácio, tinha sido capturado pela polícia, depois de andar foragido após ser condenado a cinco anos de prisão.

"Devia ter pelo menos 20 ou 25 anos de cadeira, para ter emenda", comentava a mãe, Maria Adélia Pereira, revelando. "Ele faz-nos tanta falta. Deixou uma mulher viúva e dois filhos pequenos".

 Já o pai, António Mendes, lembrou o momento em que tudo aconteceu, e falou das imagens que apareceram na TV. "Quando me apercebi, só tive tempo de por a roupa à frente dos olhos. Como é que conseguiria ver uma coisa daquelas?" E a mãe apontou: "Conheci logo o meu filho e comecei a gritar".

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