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Quatro pontos para perceber as agressões entre Israel e Irão

Diogo Barreto
Diogo Barreto 17 de junho de 2025 às 07:00
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Os confrontos já duram há décadas, mas só agora começaram a voar os mísseis. Especialistas acreditam que Israel se esteja a aproveitar do enfraquecimento iraniano para ganhar vantagem.

O conflito entre Israel e o Irão tem vindo a escalar nas últimas décadas com hostilidades de parte a parte. Os bombardeamentos que começaram a semana passada são apenas a expressão visível de ataques que aconteceram nos bastidores e nas sombras ao longo de anos, numa história que envolve ataques secretos, sabotagem e ataques informáticos. Especialistas não acreditam que guerra possa escalar, mas são da opinião que Irão pode vir a perder influência no Médio Oriente depois dos ataques israelitas. 

AP Photo/Ohad Zwigenberg

Uma história de tensão que já dura meio século

Há vários anos que o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, elege o Irão como a principal ameaça à existência do estado israelita, sublinhando o programa nuclear iraniano, a hostilidade pública dos líderes daquele país contra Israel, bem como o financiamento de militantes anti-israelitas em toda a região. Mas de onde vem a animosidade israelita contra o Irão?

Quando se deu a Revolução Islâmica em 1979, os novos líderes iranianos identificaram os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e Israel como os seus principais inimigos. Esta animosidade deve-se às ligações que estes estados tinham com o xá deposto, Reza Pahlavi.

Desde então sempre se viveu um clima de tensão entre os dois países, com acusações de parte a parte. 

Uma das grandes preocupações do lado israelita prende-se com o programa nuclear iraniano. Há suspeitas de que nas últimas décadas Israel tenha levado a cabo vários ataques secretos - ciberataques, assassinatos a cientistas e líderes militares - contra o Irão para prejudicar esse mesmo programa, impedindo o desenvolvimento de armas nucleares. 

O Irão insiste que o seu programa nuclear é totalmente pacífico, mas a agência de vigilância atómica das Nações Unidas avisou que Teerão tem urânio enriquecido em quantidade suficiente para fabricar "várias" bombas nucleares, se assim o desejar.

O financiamento de grupos regionais anti-israelitas, como o Hamas, o Hezbollah, os rebeldes Houthi no Iémen e o regime sírio, são igualmente motivos de preocupação para o governo israelita. O Irão construiu uma rede de grupos a que chamou "Eixo da Resistência", que exerceu um poder significativo em toda a região do Médio Oriente nos últimos anos. Mas desde o ataque levado a cabo pelo Hamas a 7 de outubro no sul de Israel, que Telavive passou para modo de ataque, tendo dizimado a capacidade de grupos como o Hamas ou o Hezbollah.

O enfraquecimento do Hezbollah contribuiu para a queda de Assad, o que abriu caminho para que Israel se apoderasse de partes do sul da Síria e efetuasse ataques que destruíram grande parte dos seus meios militares.

Porquê atacar agora?

Em conferência de imprensa, Netanyahu disse que o tempo estava a esgotar-se para atacar o Irão e que se não atacassem agora, o regime iraniano corria o risco de desenvolver armas nucleares.

Estes ataques foram iniciados durante um processo de negociação entre os Estados Unidos e o Irão, tendo Trump tentado chegar a consenso com os líderes iranianos para que não desenvolvessem armamento nuclear. Trump disse ter pedido a Netanyahu que não atacasse o Irão enquanto as negociações estivessem em curso, mas não condenou o lançamento do ataque na sexta-feira.

José Filipe Pinto é da opinião que Israel ataca agora para capitalizar o enfraquecimento dos proxys do regime bem como das perdas significativas de material militar por parte do Irão. Batista Ramos secunda esta opinião: "Israel, desde o 7 de outubro, decapitou o Hamas, o Hezbolah no sul do Líbano e os houthis foram neutralizados pelos Estados Unidos. Praticamente deixaram de existir, a sua estrutura foi completamente arrasada. Caiu ainda o regime de Hassad na Síria. Numa situação normal todos estes proxys estariam a atacar, mas como Israel os destruiu, tem luz verde para atacar o Irão", defende. Mas esses ataques ficarão, certamente, pela troca de mísseis entre ambas as nações, acreditam.

Nenhum dos dois antevê igualmente que haja um grande escalar da guerra, considerando que depois desta ofensiva com sucesso, Israel vai voltar a concentrar-se em Gaza e na guerra que ali lavra. José Filipe Pinto diz mesmo que nenhuma das três grandes potências com interesse no Médio Oriente (Rússia, EUA e China), pretendem que Israel se torne a potência hegemónica na região e querem que seja obrigado a dialogar com o mundo árabe.

A operação em curso

Na madrugada de sexta-feira, 13 de junho, Israel lançou ataque contra o Irão, deixando assim as táticas de guerra fria, passando para um conflito aberto e público que arrisca atiçar ainda mais a guerra regional em curso há ano e meio. Os ataques provocaram explosões na capital Teerão e em alvos militares. 

Entre os mortos do primeiro ataque encontravam-se três dos principais chefes militares iranianos, o general Mohammad Bagher (supervisionava as forças armadas), o general Hossein Salami (líder da Guarda Revolucionária) e ainda o general Amir Ali Hajizadeh, que dirigia o programa de mísseis balísticos da Guarda Revolucionária. Foram ainda mortos dois cientistas nucleares.

Netanyahu afirmou ainda que os ataques israelitas atingiram o principal local de enriquecimento de urânio do Irão - as instalações atómicas de Natanz -, e visaram os principais cientistas nucleares. O primeiro-ministro israelita afirmou ainda que a operação tinha também como alvo o arsenal de mísseis balísticos do Irão.

Teerão retaliou enviando mais de 100 drones em direção a Israel, a maioria dos quais foi intercetada pelo sistema do Iron Dome (Cúpula de Ferro). No entanto, o exército israelita fechou o espaço aéreo e disse que estava a convocar dezenas de milhares de soldados para proteger as fronteiras do país.

O papel da Rússia 

A Rússia tem procurado manter um equilíbrio entre ambos os lados no Médio Oriente, mantendo relações cordiais com Israel ao mesmo tempo que desenvolve fortes laços económicos e militares com o Irão. Os ataques desta semana colocam Moscovo numa posição difícil e ao mesmo tempo privilegiada. Pode vir a tornar-se o mediador mais importante entre as partes e ser a responsável por pôr fim ao conflito. 

O presidente russo, Vladimir Putin, falou com o primeiro-ministro israelita e com o presidente iraniano, Masoud Pezeshkian, oferecendo-se para ajudar a desanuviar o conflito.

Putin condenou os ataques israelitas e apresentou as suas condolências a Pezeshkian. No seu telefonema com Netanyahu, Putin "sublinhou a importância de regressar ao processo de negociação e de resolver todas as questões relacionadas com o programa nuclear iraniano exclusivamente através de meios políticos e diplomáticos", e ofereceu a sua mediação "a fim de evitar uma nova escalada das tensões", afirmou o Kremlin numa nota de imprensa.

Apesar de a Rússia ter fornecido ao Irão sistemas de mísseis de defesa aérea sofisticados, que, segundo Israel, foram destruídos durante os ataques do ano passado, Moscovo tem adiado a entrega de outras armas, numa aparente resposta às preocupações israelitas. Telavive, por sua vez, pareceu ter em conta os interesses de Moscovo ao minimizar o fornecimento de armas à Ucrânia na guerra contra a Rússia.

Batista Ramos considera que a Rússia não tem qualquer influência neste processo, não tendo influência sobre as decisões do Irão (apesar de comprar armamento a este país para a guerra na Ucrânia) e muito menos sobre Israel. "Quem manda em Netanyahu é Trump. Só os Estados Unidos conseguem controlar os avanços israelitas e não têm grande interesse em fazê-lo."

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