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“Medicamento vivo” desenvolvido por hospital em Madrid já salvou a vida a oito jovens com leucemia

Neste momento existem oito tratamentos com células CAR-T autorizados na UE, úteis em casos de crianças com diagnósticos terminais. No entanto, as farmacêuticas cobram um valor superior a 300 mil euros por paciente.

Um hospital público em Madrid está a desenvolver um “medicamento vivo”, produzido através de células vivas, que já conseguiu salvar a vida de oito jovens com leucemia linfoblástica aguda de células B, o cancro infantil mais comum. 

Hospital em Madrid desenvolve tratamento para leucemia, salvando oito jovens
Hospital em Madrid desenvolve tratamento para leucemia, salvando oito jovens DR

Todos os pacientes têm menos de 24 anos e tinham recebido um diagnóstico terminal depois de múltiplas recaídas e não terem respondido a nenhuma das terapias convencionais até que foram escolhidos para acederem a este tratamento experimental. A terapêutica consiste na extração de uma amostra de células imunológicas e na sua reorganização em laboratório para aumentar a capacidade de destruir células cancerígenas, posteriormente estas células são reintroduzidas no organismo e têm demonstrado capacidades de eliminar o tumor. 

Normalmente o tratamento envolve a adição de uma espécie de radar nos glóbulos brancos dos pacientes, capaz de detetar a proteína CD19 presente nas células cancerígenas da leucemia e do linfoma. 

Antonio Pérez é o responsável pela investigação e esta quinta-feira que o método atingiu uma taxa de sobrevivência de 70% depois de mais de um ano e meio de acompanhamento. O evento, que teve lugar no Hospital Universitário La Paz, contou também com a presença de Lucía Álvarez, uma paciente de 15 anos que recentemente se juntou à lista de jovens que foram curados por esta terapia.

A primeira criança sujeita à CART-T foi Emily Whitehead, em 2012. A norte-americana tinha na altura 6 anos e um diagnóstico de leucemia em estado terminal, hoje os médicos consideram que está curada. Carl June, imunologista norte-americano, foi o responsável pelo desenvolvimento do tratamento com células modificadas e considera que esta abordagem é capaz de criar ressurreições “como a de Lázaro”, figura bíblica que milagrosamente foi ressuscitada por Jesus Cristo. Apesar deste otimismo, a ciência já demonstrou que as terapias com células CAR-T nem sempre funcionam e só foram capazes de salvar metade das crianças com tumores muito graves e sem outra alternativa, uma vez que em alguns casos a proteína CD19 consegue camuflar-se.

O pediatra Antonio Pérez referiu, esta quinta-feira, que este é “um tratamento de curta duração” e “uma terapia de ponte que precisa de ser consolidada com um transplante de medula óssea”, mas que oito dos onze pacientes do Hospital de La Paz viram o seu cancro desaparecer e tornar-se indetetável num prazo de um mês. Cinco dos jovens já receberam o transplante de medula, que realmente salvou as suas vidas.

Apesar do aparente sucesso, o especialista alerta que estes resultados devem ser interpretados com cautela até que novos estudos sejam realizados. Neste momento, existem apenas oito tratamentos com células CAR-T autorizados na União Europeia, sete comerciais e um académico. A farmacêutica suíça Novartis cobra um valor superior a 300 mil euros por paciente pelo tratamento Kymriah, utilizado para leucemias e linfomas. No entanto, o atual processo em Madrid, e um anterior em Barcelona, demonstram que estas terapias revolucionárias podem ser desenvolvidas em hospitais públicos, com um custo muito menor. Cada tratamento realizado em Barcelona custou apenas 90 mil euros, cerca de um terço do valor pedido pela farmacêutica.  

Segundo os dados da Organização Mundial de Saúde, cerca de 400 mil crianças e adolescentes são diagnosticados com cancro todos os anos a nível global e a taxa de sobrevivência ultrapassa os 80% nos países desenvolvidos. Apesar de serem casos raros, para cada duas em dez crianças continua a ser impossível encontrar um cura.

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