Os casos de violência nas escolas têm motivado pais a pedirem um aumento da segurança dentro dos estabelecimentos, inclusive câmaras de vigilância. CONFAP e ANDAEP dizem que não é prioridade.
No final de janeiro, começou a circular um vídeo nas redes sociais. Nele via-se um adolescente autista a ser agredido por um aluno mais velho na Escola Fragata do Tejo, na Moita. As agressões duram alguns segundos e quando o jovem já está no chão é pontapeado com violência oito vezes. À volta, veem-se vários colegas a assistir a alguma distância, não tendo sequer ajudado a criança quando esta se tentava levantar. O sucedido voltou a trazer o tema da segurança nas escolas para o debate público, incluindo a introdução de videovigilância nas instituições. A SÁBADO sabe que houve escolas que receberam pedidos de pais a apelar a que os espaços de ensino sejam vigiados com sistemas de videovigilância para garantir a segurança dos seus educandos. Mas as direções apelam a que haja um reforço do pessoal não-docente primeiro.
Cofina Media
"A escola reflete o que se passa na sociedade e quantas vezes não vimos já, nos últimos tempos, as pessoas a pedir o aumento da videovigilância nas suas ruas e cidades", sublinha à SÁBADO Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), quando questionado sobre estes pedidos dos pais dos últimos meses. "Não tinha mal nenhum que a videovigilância fosse introduzida em todas as escolas porque tem a ver com a segurança de todos, simplesmente não é a principal prioridade", defende. O presidente da ANDAEP encara a possibilidade de introduzir a videovigilância nas escolas como a encara noutros espaços: "Existem câmaras nos centros comerciais e nos estádios de futebol. Por que não numa escola onde a densidade populacional é tão ou mais elevada como nestes sítios?", questiona.
Mariana Carvalho, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP), é da opinião que a videovigilância deve ser um último recurso e nunca aplicado de forma universal. "Existem formas de assegurar a segurança nas escolas e nós defendemos que haver mais pessoal não-docente e reforçar os meios do programa da Escola Segura são as principais formas de conseguir essa segurança", refere. "Só numa situação limite e só se a escola decidir que não existe outra alternativa, é que achamos que podemos avançar para a solução da videovigilância", sublinha a presidente da CONFAP.
"Poderá ter de haver um reforço da Escola Segura junto de certas comunidades educativas e isso é mais importante que videovigilância que obriga um funcionário a olhar constantemente para o visor para onde estão direcionadas as câmaras. Preferia mais recursos humanos do que mais recursos tecnológicos", conclui Filinto Lima.
O presidente da ANDAEP sublinha que a videovigilância já existe em algumas escolas que decidiram adquirir esse material, mas que a maior parte dele já "estará deteriorado" ou até mesmo "fora de serviço". "Gostaríamos que essas câmaras estivessem a funcionar, porque podia ser um fator dissuasor de comportamentos incorretos", defende Filinto Lima.
As câmaras que já existem foram colocadas nos espaços exteriores e nos interiores comuns aos alunos, como corredores ou recreios. Mas podem ser colocadas também em sala de aula?
"Câmaras restringem a liberdade pelo medo"
Apesar de defender um aumento da vigilância nas instituições, assumindo que o caminho pode mesmo passar por aí, Filinto Lima diz que as salas de aula devem ser zonas sem vigilância. E a lei está do seu lado.
"Os trabalhadores estão protegidos no seu local de trabalho", explica o advogado Gonçalo Simões de Almeida da KGSA. "Uma câmara dentro de uma sala de aula a captar imagem e até som pode interferir com a liberdade de exercer a profissão dos professores. O Código de Trabalho reconhece que a videovigilância em exercício de trabalho corresponde a uma pressão muito grande sobre a pessoa e por isso proíbe que haja gravação de pessoas no seu local de trabalho", explica o especialista.
O advogado tem muitas reservas relativamente à videovigilância nas escolas, lembrando que temas como este entram no direito à imagem e também no tema da proteção de dados pessoais. ""As pessoas, neste caso, encarregados de educação e alunos, devem estar informados sobre videovigilância, que se deve cingir a locais muito específicos e configura sempre medida excecional e não a regra."
E essa vigilância afeta também as crianças. Dois especialistas explicam que as câmaras até podem ter um efeito dissuasor no bullying, mas podem também influenciar diretamente a liberdade das crianças que se sentem intimidadas e deixam de ter comportamentos naturais, como trocar bilhetes entre si, conversar, desenhar. Há também uma maior pressão sobre o seu desempenho escolar podendo ter mais vergonha em tirar dúvidas ou até errar num exercício, prejudicando a sua aprendizagem. "As câmaras têm o papel de restringir a liberdade pelo medo e receio que impõem", complementa o advogado da KGSA.
Mas depois entra outro problema em campo: quem trata e tem acesso aos dados? Um funcionário? As autoridades, a empresa de videovigilância? Quais as instituições que regulariam estas imagens. Estas são algumas das questões levantadas por Gonçalo Simões de Almeida.
Os dados da violência nas escolas
A SÁBADO questionou o Ministério da Educação sobre o tema da videovigilância, mas não obteve resposta. O programa da Escola Segura da PSP ainda não tem os dados referentes ao ano de 2024, mas no ano letivo passado foram registadas 4.445 ocorrências. Já a GNR registou 103 crimes de bullying.
No início deste ano a PSP lançou a operação "Violência? Não, obrigado!" com o objetivo de sensibilizar os alunos do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário para temas como a violência escolar, o uso e posse de armas e a delinquência juvenil.
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui ,
para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana. Boas leituras!
Para poder adicionar esta notícia aos seus favoritos deverá efectuar login.
Caso não esteja registado no site da Sábado, efectue o seu registo gratuito.
Para poder votar newste inquérito deverá efectuar login.
Caso não esteja registado no site da Sábado, efectue o seu registo gratuito.
A PSP enfrenta hoje fenómenos que não existiam ou eram marginais em 2007: ransomware, ataques híbridos a infraestruturas críticas, manipulação da informação em redes sociais. Estes fenómenos exigem novas estruturas orgânicas dedicadas ao ciberespaço, com autonomia, meios próprios e formação contínua.