Sábado – Pense por si

Comando Vermelho, a organização criminosa mais antiga do Rio de Janeiro que foi apanhada numa megaoperação

Luana Augusto
Luana Augusto 29 de outubro de 2025 às 21:05
As mais lidas

Grupo surgiu na década de 70 para combater a tortura nas prisões, mas acabou por se dedicar à venda de drogas. Atualmente fabricam até as suas próprias armas e têm drones capazes de lançar explosivos.

A polícia civil e militar do Rio de Janeiro , na terça-feira, que resultou na morte de, entre os quais 115 narcoterroristas, alegadamente todos pertencentes ao Comando Vermelho. A operação teve como objetivo cumprir 100 mandados de detenção e acabou por espalhar o caos por toda a cidade. Envolvendo 2.500 agentes das forças de segurança, é agora considerada a mais violenta operação policial da história do Rio de Janeiro.

Megaoperação policial no Rio de Janeiro contra o Comando Vermelho espalha caos
Megaoperação policial no Rio de Janeiro contra o Comando Vermelho espalha caos AP Photo/Silvia Izquierdo

O que é o Comando Vermelho?

O Comando Vermelho nasceu nos anos 70 com o nome de "Falange Vermelha", e conta atualmente com 54 anos de existência. Fundado por William da Silva Lima - um dos criminosos mais conhecido como o "Professor" - o grupo tinha como objetivo combater a tortura e os maus tratos sofridos nas prisões. 

O grupo nasceu no Instituto Penal Cândido Mendes, em Ilha Grande, onde William da Silva Lima deu entrada em 1971 e foi condenado a 100 anos de prisão. Lá, os presos comuns misturavam-se com os presos políticos, detidos durante a Ditadura Militar, e "ambos tinham uma coisa em comum: assaltos a bancos", segundo explicou à BBC Brasil Jacqueline Muniz, do Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos do Departamento de Segurança Pública. Acontece que com a lei da amnistia de 1979, os presos políticos, pertencentes a este grupo, acabaram por ser libertados.

No livro 400x1: Uma história do Comando Vermelho, escrito por William Lima, o fundador do grupo conta como os presos tiveram de se reorganizar para acabar com a situação em que viviam: em 1979, os prisioneiros passaram a dar início às fugas e mais de 100 conseguiram escapar da prisão, tendo deixado os banqueiros em desespero, além disso, passaram a investir num outro ramo: a venda de cocaína.

Devido à rivalidade, os membros do Comando Vermelho viram necessidade em protegerem as suas mercadorias de tentativas de roubo. Para isso, tiveram de se armar. "Os polícias também passaram a fornecer armas", explicou à BBC Brasil a socióloga Carolina Grillo. 

Em 1985, o Comando Vermelho controlava já cerca de 70% de todos os pontos de venda de droga, segundo a CNN Brasil, o que gerava muito lucro, e isso deu lugar a várias guerrilhas. Nos anos 90, os índices de violência atingiram um dos piores picos da história do Rio de Janeiro. Só em 1994 foram registados 64 mil homicídios por 100 mil habitantes, sendo que atualmente o número de mortes nesse Estado é de 24 mil, aponta a BBC.

Nesse mesmo ano morreu também um dos líderes do Comando Vermelho, mais conhecido "Orlando Jogador". Segundo a CNN, terá sido assassinado por "Uê" devido a problemas que envolviam mulheres. Após a morte de "Orlando Jogador", "Uê"  fundou um grupo rival ao Comando Vermelho - a ADA.

O Comando Vermelho chegou até a aliar-se ao PCC com o objetivo de partilharem as rotas de tráfico. No entanto, segundo as forças de segurança brasileiras, terá havido uma rutura entre os grupos em meados de 2016.

A expansão do Comando Vermelho

Atualmente, o Comando Vermelho é considerada a principal organização criminosa do Rio de Janeiro. Segundo a BBC, isso deveu-se principalmente ao facto de o governo local ter transferido os líderes do grupo para diferentes prisões. As autoridades pretendiam enfraquecer este grupo, mas ao invés disso esta decisão teve um efeito oposto: a organização acabou por partilhar os seus ideiais com outros prisioneiros.

Segundo o jornalista Rafael Soares, nos últimos seis anos o Comando Vermelho passou a marcar presença em 25 Estados, enquanto que antes a organização estendia o seu domínio a apenas 10 Estados. O Mapa dos Grupos Armados, citado pela BBC, faz até referência à expanção do grupo nos últimos anos: ao que tudo indica, o Comando Vermelho foi a única organização criminosa que conseguiu ampliar o seu controle no Rio de Janeiro, enquanto todas as outras perderam terreno. 

Drogas e armas

Atualmente, o tráfico de drogas continua a ser uma das principais atividades do grupo. O Comando Vermelho domina sobretudo em àreas de fronteira na Amazónia. No entanto, o lucro já não provêm apenas da droga. Um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, publicado em fevereiro deste ano, aponta que a venda irregular de combustível, ouro e cigarros são bastante mais lucrativas.

Já no que toca ao armamento, o grupo mudou a sua forma de abastecimento. Até alguns anos os traficantes armavam-se através de duas formas: das vendas ilegais que provinham do Paraguai ou dos desvios das próprias forças de segurança. Hoje, o grupo já tem formas de criar as suas próprias armas, recorrendo à ajuda de empresas ilegais. Tem até na sua posse drones capazes de lançar explosivos.

"São fábricas com equipamentos de última geração, máquinas caríssimas, que custam até meio milhão de reais. São impressoras 3D, que trabalham com metal e entregam peças prontas", detalha à BBC Bruno Langeani, consultor sénior do Instituto Sou da Paz.

Em agosto, as autoridades chegaram até a descobrir uma fábrica clandestina de montagem de armas em Rio das Pedras e apreendeu quatro impressoras 3D.

As histórias de Balsemão

Em 88 histórias (tantas quantos os anos de vida), traçamos o retrato de Francisco Pinto Balsemão. E ainda: violência e assédio sexual; pessoas que sofrem com a Covid longa.