Bruno e Ristovski temeram pela vida da família, tendo-lhes dito para sairem de Lisboa. Para Vasco Fernandes, o ataque pareceu-lhe "uma eternidade", apesar de ter durado apenas alguns minutos.
O que disseram Vasco Fernandes, Ristovski e Bruno Fernandes sobre o ataque a Alcochete
Vasco Fernandes, Stefan Ristovski e Bruno Fernandes foram as testemunhas ouvidas esta terça-feira no Tribunal de Monsanto, Lisboa, no âmbito do processo do ataque à Academia do Sporting, em Alcochete, a 15 de maio de 2018. Tal como tinha contecido com as testemunhas ouvidas na segunda-feira, todos descreveram a situação como traumática.
Militares da GNR, os primeiros a chegarem após a invasão da Academia de Alcochete, foram esta terça-feira ouvidos
Miguel Coutinho, advogado do Sporting, requereu que oito dos futebolistas que ainda se mantêm no atual plantel fossem inquiridos através de videoconferência, invocando razões de ordem psicológica. O coletivo de juízes acedeu ao pedido e Wendel, Mathieu, Acuña, Battaglia, Luís Maximiano, Coates, Ristovski e Bruno Fernandes vão então prestar declarações por videoconferência.
O julgamento prossegue na quinta-feira com as inquirições do médico Virgílio Abreu, de manhã, e, à tarde, serão ouvidos o jogador Daniel Podence, via Skype, e Ricardo Vaz.
Secretário técnico "completamente petrificado"
Vasco Fernandes explicou que 20 a 30 elementos forçaram a porta da entrada no balneário e que "começaram logo a bater, a ameaçar e a injuriar" os jogadores. Este tentou fechar a porta dos vestiários, mas que nesse momento recebeu "dois estímulos": um do jogador Petrovic, que lhe disse "não feches, não feches, eles que venham", e um outro de Raul José, treinador adjunto, que lhe "berrou" para não fechar a porta, pois "o homem está lá fora e vão matá-lo", referindo-se ao então treinador Jorge Jesus.
"Começaram logo a bater nos jogadores. Não entraram para falar com ninguém. O comportamento era agressivo, desde bater, ameaçar e atirar objetos. Aconteceu tudo muito depressa. Lembro-me do Montero que levou uma estalada. Vi o Acuña que também lhe estavam a bater. Mais para o lado direito estava o Rui Patrício, o William e o Battaglia, que também lhes estavam a bater no peito, não sei se de mão aberta", descreveu a testemunha.
Luís Maximiliano, Marcus Wendel e Jeremy Mathieu foram as testemunhas ouvidas esta segunda-feira no Tribunal de Monsanto, Lisboa, no âmbito do processo do ataque à Academia do Sporting, em Alcochete, a 15 de maio de 2018. Os três descreveram a situação como traumática.
Para o secretário técnico do Sporting, o ataque pareceu-lhe "uma eternidade", apesar de ter durado apenas alguns minutos.
"Começaram a bater, a ameaçar, a injuriar. A dizer que matavam toda a gente. Toda a gente que se ponha à frente, diziam: 'sai da frente, senão mato-te' e chamavam nomes. Há uma situação perfeitamente clara para mim. Estava à entrada [do balneário] o Rafael Leão e nesse ninguém bateu. Até fiquei surpreendido, pois cumprimentaram-no e diziam 'a ti não te vamos fazer mal'", acrescentou Vasco Fernandes.
A testemunha assumiu perante o coletivo de juízes ter sentido pânico. "É um momento de terror. Fiquei completamente petrificado. O momento mais violento foi o vivido dentro do balneário. Estavam com as cabeças tapadas e depois não fazia ideia se traziam armas. Temi, pois não sabia onde é que aquilo ia parar", frisou Vasco Fernandes.
Já no final do ataque, o funcionário do Sporting recorda uma frase dita por um dos elementos e repetida por outros dos invasores e o treinador Jorge Jesus com o nariz ensanguentado.
"Ouvi um deles a dizer: 'está na hora, vamos embora', e outros a repetir. Como se tivessem aquilo planeado ou algum 'timing' a cumprir. E começaram a sair. Saio do edifício, vou em direção à estrada e deparo-me com o Jorge Jesus com a mão cheia de sangue e com o nariz ensanguentado", relatou Vasco Fernandes.
Nesse momento, explicou, o então treinador do Sporting Jorge Jesus estava no exterior do edifício a falar com Fernando Mendes, antigo líder da claque Juventude Leonina, e com Elton Camará (Aleluia), dois dos 44 arguidos no processo, ambos de cara destapada. "Parecia que o Jorge Jesus estava a pedir satisfações, indignado", afirmou.
Ristovski com medo que se volte a repetir
Stefan Ristovski contou que os elementos que entraram no balneário da academia de Alcochete disseram "isto vai ser a vossa última chance, não podem jogar desta maneira", relatando o "caos" vivido e agressões a colegas. "Depois deste incidente fiquei sempre com medo. Ainda hoje, cada vez que o Sporting perde um jogo, fico com medo que isto se volte a repetir", assumiu.
O internacional macedónio explicou que estava na sala onde se guardam as chuteiras quando viu "quatro a cinco pessoas do lado de fora, com a cara tapada, a baterem na porta e a fazerem tudo para entrar", enquanto "gritavam e faziam ameaças como 'vamos matar-vos'".
O futebolista Stefan Ristovski contou hoje que os elementos que entraram no balneário da academia de Alcochete disseram "isto vai ser a vossa última chance, não podem jogar desta maneira", relatando o "caos" vivido e agressões a colegas.
O jogador, indicou que ainda tentaram fechar a porta do balneário, mas que entraram 15 a 25 pessoas no edifício e entre 10 a 15 elementos no vestiário, lembrando-se de ter visto uma pessoa "com um dente dourado, com barba" e duas pessoas "de raça negra". Confrontado com fotos que constam dos autos, o jogador conseguiu identificar o arguido com o dente dourado.
"Quando entraram, tentaram perceber quem é que se encontrava onde, quem estava em pé. Eu estava de pé, ao mau lado estava o Acuña, sentado, começaram a gritar uns palavrões. Nesse momento, percebemos a intenção. O Acuña foi agredido com chapadas na cara e na cabeça. Ele tentou evitar, mas não conseguiu, pois estavam quatro a cinco pessoas de volta dele", descreveu Ristovski.
"Referiram o nome do Acuña e do Battaglia, mas dirigiram-se para todos e disseram: 'isto vai ser a vossa última chance, não podem jogar desta maneira'", contou o jogador. Além da agressão ao internacional argentino Marcus Acuña, o defesa disse ter assistido às agressões a Rodrigo Battaglia.
"Vi a agressão ao Battaglia, que se encontrava no fundo do balneário, onde estavam quatro a cinco pessoas, mas não vi bem, pois estava a tentar proteger-me para também não ser agredido. Não presenciei, não vi as aressões aos outros jogadores porque naquele momento havia um grande caos no balneário", afirmou a testemunha.
"Ninguém tentou sair [do balneário]. Ficámos paralisados dentro do balneário, de braços cruzados à espera de sermos agredidos. Só meia hora depois é que saímos do balneário, porque tínhamos medo que ainda estivessem destas pessoas, e ficámos à espera que nos viessem dizer alguma coisa", explicou o internacional macedónio, que declarou não ter sido agredido.
Após o ataque, levado a cabo em 15 de maio de 2018, o defesa enviou a família para o seu país. "Mandei a mulher e a filha para a Macedónia, eu fiquei alojado num hotel e no final do jogo [final da Taça de Portugal, disputada no domingo seguinte] fui ter com eles", revelou.
Bruno Fernandes contratou segurança
O futebolista Bruno Fernandes assumiu que após a invasão ficou "mais nervoso" e com "mais ansiedade" antes dos jogos, além do receio que afirmou sentir que esta situação volte a acontecer se a equipa "tiver um resultado menos positivo". "Contratei segurança pessoal, na sequência destes factos", revelou Bruno Fernandes, que a manteve entre "quatro a seis dias", até ir para a concentração na seleção nacional, que ia disputar o mundial.
A nível pessoal, referiu, este episódio teve influência na vida familiar, revelando que, após a invasão, teve "medo" do que pudesse acontecer à sua família, razão pela qual telefonou à mulher para que pegasse na filha de ambos e fossem para o Porto.
Bruno Fernandes relatou ter visto a entrar no balneário cerca de 20 a 25 pessoas, que foram entrando gradualmente, tendo visto os primeiros seis a sete elementos. "Os primeiros dois foram diretos ao Rui Patrício e ao William Carvalho e depois outros foram na direção do Acuña e do Bataglia. O Ricardo Gonçalves [diretor de segurança e operações da academia] tentou travá-los, enquanto gritavam o nome do Rui Patrício, do William Carvalho, do Acuña e do Bataglia", descreveu o capitão do Sporting.
O Tribunal de Monsanto recebe, esta terça-feira, mais uma sessão do julgamento do ataque à Academia de Alcochete a 15 de maio de 2018, em que jogadores e membros da equipa técnica do Sporting foram agredidos por um grupo de elementos da claque Juventude Leonina.
Bruno Fernandes explicou que os colegas foram agredidos com empurrões, socos, murros, chapadas e tentativas de pontapés. De acordo com o jogador, os invasores gritaram ainda frases como "'vamos matar-vos, tirem essa camisola, vocês não merecem essa camisola'", acompanhadas de injúrias aos atletas.
O médio explicou que ele e o defesa-central Sebastian Coates tentaram demover os elementos, os quais afastaram os dois capitães do Sporting, dizendo: "'Isto não é nada convosco, afastem-se'." "Não tive reação. O momento foi demasiado rápido para reagir, ou sequer pensar. Não era comigo, ninguém me tocou", referiu. O internacional português lembra-se de ter visto alguns dos elementos a bloquear a porta do balneário.
"Fiquei com a convicção de que ficaram ali [à porta do balneário] para impedirem a saída. Ficaram lá alguns parados. Ninguém saiu, ninguém conseguiu sair. No fim, há um grito de um deles: 'vamos embora, vamos embora' e começaram a sair. Nesse momento ainda dizem a frase: 'não ganhem no domingo que vocês vão ver o que vos acontece, e lançaram uma tocha", relatou o jogador.
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