Sábado – Pense por si

O que disse Bruno de Carvalho sobre o ataque a Alcochete

28 de fevereiro de 2020 às 21:37
As mais lidas

Disse que ia despedir Jesus e Frederico Varandas, acusou William de Carvalho de mentir e acusou a justiça de o colocar no "lado errado da barricada". "Não compreendo como é que estou aqui na qualidade de arguido", atirou no testemunho em tribunal.

Bruno de Carvalho, presidente do Sporting na altura das agressões aos jogadores e técnicos, na academia dos "leões" em maio de 2018, garantiu, esta sexta-feira, em tribunal que não teve conhecimento de "nada de nada" sobre o sucedido no centro de treinos dos "leões" até ter sido informado durante uma reunião. O antigo dirigente defendeu também que foi colocado do "lado errado da barricada" ao ser arguido no processo. "Aquilo que se passou em Alcochete foi vergonhoso. Lamentável e indescritível o que as pessoas passaram", defendeu também.

 "Colocaram-me do lado errado da barricada, quando decidiram passar-me de testemunha a arguido 44", disse Bruno de Carvalho na 35.ª sessão do julgamento da invasão à academia, acrescentando: "Passados quase dois anos do acontecimento, não compreendo como é que estou aqui na qualidade de arguido".

O antigo presidente leonino, que voltou a classificar a invasão à academia, ocorrida em 15 de maio de 2018, como "um crime hediondo e vergonhoso", garantiu não ter "qualquer conhecimento ou suspeita" de que algo do género pudesse acontecer.

Bruno de Carvalho, que liderou o clube entre março de 2013 e junho de 2018, admitiu ter assistido aos incidentes que se seguiram à derrota (2-1) do Sporting na Madeira, "pela televisão" e disse ter ficado com a ideia de que existia um problema na Juventude Leonina entre Fernando Mendes e Nuno Mendes, conhecido por Mustafá, antigo e atual presidentes da maior claque do clube, respetivamente, e ambos também arguidos no processo.

Bruno de Carvalho referiu que na reunião que teve com o plantel no dia 14 de maio, depois da derrota no Funchal, perguntou aos futebolistas Acuña e Battaglia "porque é que se tinham metido logo com o antigo líder da claque, no aeroporto da Madeira".

O ex-presidente do Sporting, para quem o futebolista William de Carvalho é "useiro e vezeiro a mentir", disse ainda que o atual jogador do Bétis de Sevilha o acusou de ser o responsável pelo ataque. "Assim que cheguei à academia [depois do ataque], o William disse-me: 'Pensa que não sabemos que foi você que mandou fazer isto'", referiu.

O arguido disse ter estado, a pedido de André Geraldes, 'team manager' do clube à data, numa reunião "que não teve ponta por onde pegasse", na 'casinha', a sede da Juve Leo, em 7 de abril de 2018, dois dias depois da derrota (2-0) do Sporting no terreno do Atlético de Madrid, para a Liga Europa. "Estavam dezenas de pessoas, todas aos gritos, muitas a fumar charros, quiseram agredir-me, o primeiro que me quis agredir foi o Camará, que é o mais 'pequenino' deles todos. Até disseram que iam pôr tarjas contra mim", contou, acrescentando ter dito "façam o que quiserem" porque o que queria "era fugir dali".

Admitindo que ele e Fernando Mendes não gostavam um do outro, Bruno de Carvalho explicou que a relação com 'Mustafá' era de respeito. "Conseguimos ganhar uma relação de respeito, mas a verdade dos factos é que eu acabei por gostar do Nuno Mendes porque ele é tão genuíno, que nos faz rir. Sempre me respeitou e eu o respeitei. Ele era sempre mais uma solução do que um problema", referiu, descartando a hipótese de o presidente da Juve Leo ser "uma espécie de guarda pretoriana".

As culpas de Jesus, segundo BdC

O antigo presidente do Sporting defendeu ainda que, se o treinador Jorge Jesus não tivesse retirado "algumas medidas de segurança", a invasão à Academia de Alcochete não teria sido possível.

"Nada disto teria acontecido se as medidas de segurança que eu tinha implementado não tivessem sido retiradas", afirmou, explicando que Ricardo Gonçalves, chefe de segurança à data dos acontecimentos (15 de maio de 2018), lhe disse que Jorge Jesus mandou retirar no início da época, à sua revelia, algumas medidas de segurança que tinham sido implementadas, como o cartão de passagem pelas portas eletrónicas.

BdC vincou ainda ter sido "sempre contra" a ida de adeptos ao centro de treinos dos 'leões' e que essa situação só foi possível devido a um precedente aberto pelo antigo técnico do clube. "O grande mal foi, em dezembro de 2017, depois de eu ter dito não, o senhor Jorge Jesus ter dito sim, nas minhas costas, e deixar as claques entrarem na academia", adiantou, acrescentando: "O problema é a primeira vez, e no meu mandato aconteceu uma vez e à minha revelia."

Nesse sentido, o antigo líder leonino revelou ter chamado de seguida o treinador Jorge Jesus e lhe ter dito que, "na próxima vez" que o desautorizasse, "ia para a rua".

Paralelamente, Bruno de Carvalho assegurou não ter sido responsável pela alteração da hora do treino de dia 15 de maio de 2018 para a tarde, atribuindo essa decisão a Jorge Jesus na reunião da véspera. "Nem sugeri, nem tinha de a sugerir [a alteração da hora de treino]. É uma invenção total. Foi ele que, falando com o [adjunto] Raul José, explicou que poderia receber um 'papelinho' [nota de culpa] a dizer que estava suspenso. Eu respondi que ia reunir com a equipa jurídica de manhã, mas que isso não queria dizer que havia papelinho. O que ele entendeu é que de manhã vão fazer o papel, por isso passou o treino para a tarde", resumiu.

Já na parte final do depoimento, o antigo presidente disse que foi o "único despedido no meio disto tudo", admitindo que no dia 14 de maio queria despedir duas pessoas: "Um acabou condecorado [Jorge Jesus] e outro é hoje presidente [Frederico Varandas]".

Por outro lado, Bruno de Carvalho referiu na sessão de hoje a existência de mal-estar entre Jorge Jesus e o plantel, ao revelar o que disse aos jogadores na reunião, do dia seguinte à derrota (2-1) frente ao Marítimo. "Na reunião de 14 de maio queria dizer aos jogadores que o Jorge Jesus não ia ser mais o treinador e até queria dizer mais: 'Sei que vão todos fazer um jantar de comemoração'", afirmou.

Finalmente, o ex-presidente do Sporting contestou a acusação da autoria moral dos 97 crimes formulada pelo Ministério Público e a ideia de que ele seria responsável por juntar as pessoas em Alcochete a uma hora específica para serem alvo do ataque.

"As pessoas todas trabalhavam na Academia. Uma possível teoria em que eu juntei as pessoas para serem agredidas não faz sentido. Não atraí ninguém que não trabalhasse na Academia. Não fiz nada de nada", concluiu.

Alegações finais com data marcada

Bruno de Carvalho foi o 22.º e último arguido depor, depois de durante a sessão de hoje terem sido ouvidos Eduardo Nicodemes, Ricardo Neves e Fernando Mendes.

O julgamento prossegue em 11 de março com as alegações, dia em que todos os arguidos são obrigados a comparecer em tribunal.

O antigo presidente do Sporting Bruno de Carvalho, tal como o líder da claque Juve Leo, Mustafá, e Bruno Jacinto, ex-oficial de ligação aos adeptos, responde, como autor moral, por 40 crimes de ameaça gravada, por 19 crimes de ofensas à integridade física qualificadas e por 38 crimes de sequestro (estes 97 crimes classificados como terrorismo, puníveis com pena de prisão de dois a 10 anos ou com as penas correspondentes  a cada um dos crimes, agravadas em um terço nos seus limites mínimo e máximo, se estas forem iguais ou superiores).

Os restantes arguidos (41) são acusados da coautoria de 40 crimes de ameaça agravada, de 19 crimes de ofensa à integridade física qualificada e de 38 crimes de sequestro, todos estes (97 crimes) classificados como terrorismo.

Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!