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Debate. Joana Mortágua fez de Nuno Melo apêndice do PSD

Pedro Henrique Miranda
Pedro Henrique Miranda 16 de abril de 2025 às 22:55
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Afável e incisiva, a deputada do Bloco de Esquerda colocou o líder do CDS na defensiva - uma postura em que Nuno Melo não fez boa figura.

Nuno Melo vinha numa trajetória ascendente como substituto de Luís Montenegro nos debates. Depois de uma estreia tremida contra Isabel Mendes Lopes, do LIVRE (numa noite em que a própria não esteve brilhante), foi unânime que revelou maior solidez contra Inês Sousa Real, do PAN - a única líder parlamentar com quem se cruzaria. A sua última oportunidade para sair do ringue com boa figura viria esta noite, em que a perspetiva de fugir à belicosidade de Mariana Mortágua poderia jogar a seu favor.

Quem tivesse apostado nesse desfecho sairia desiludido. A posição difícil e pouco dignificada que teve de assumir como líder periférico de uma coligação desigual - e que, para seu prejuízo, Nuno Melo acusou durante os debates - foi aproveitada por uma surpreendentemente afável e assertiva Joana Mortágua, bem-sucedida a fazer do líder do CDS apêndice de Luís Montenegro. Nessa posição, Melo foi obrigado a jogar à defensiva, e o seu ressentimento notou-se.

O debate da RTP1 começou sem incidentes. Uma provocação do moderador Hugo Gilberto sobre a notícia do momento - a averiguação preventiva da Procuradoria-Geral da República a Pedro Nuno Santos - não licitou grandes reações: "Não vou fazer a Pedro Nuno Santos o que há 40 dias Pedro Nuno Santos faz a Luís Montenegro", começou Nuno Melo; "Este debate não é sobre as decisões do Ministério Público", terminou Joana Mortágua.

O tema seguinte, a habitação, inaugurou a desigualdade. Mortágua foi sucinta, acusando Nuno Melo de não ser capaz de "fazer o resumo dos últimos 11 meses na habitação", e que sintetizou numa série de aumentos: o aumento no preço das casas quatro vezes superior ao da zona euro, do número de pessoas que pediu ajudas para pagar a renda e do número de casas que os salários não podem pagar. Resumo: "Todas as medidas que a AD tomou sobre a habitação aumentaram o preço das casas", uma oportunidade para voltar a defender a medida de assinatura do Bloco - tetos às rendas - e voltar a mencionar o caso de suposto sucesso da Holanda com esta medida.

Em resposta, Melo não soube bem aproveitar o seu tempo. Acusou o Bloco de "não acreditar muito no mercado", de um "ataque à propriedade privada" e de defender uma medida que "degrada o parque habitacional" e "afasta investidores privados", e ainda tentou colar a proposta do partido a uma medida do Estado Novo de 1948 - uma intervenção aproveitada pela bloquista mais tarde, ao condenar os "fantasmas de Salazar" evocados pelo líder do CDS.

Assim se deu boa parte do restante debate, que não abrangeu muitos mais pontos. Depois de uma tentativa não muito convincente de Nuno Melo de apelo ao voto útil no centro-direita, Joana Mortágua encana o debate para a Saúde, voltando ao ataque: "Prometeram que iam salvar o SNS em 60 dias e falharam". Em defesa, Melo optou por debitar uma verborreia de números (alguns deles diferentes dos citados por Luís Montenegro), culminando com a ideia de que herdou um sistema falido e de que "em 11 meses não se consegue inverter esse ciclo".

Também na imigração Mortágua levou a melhor, apontando a mentira de Leitão Amaro sobre Portugal ser um dos países da Europa com maior percentagem de migrantes e usando as palavras do ex-líder do CDS, Paulo Portas, contra o atual. Nuno Melo, por sua vez, ilustrou o ponto de Mortágua de que a direita está a passar por uma "Venturização", reproduzindo em larga medida o discurso do Chega sobre o excesso de imigrantes com recurso a apoio visual. 

Apenas na Defesa o ex-ministro da pasta conseguiu levar a melhor, apontando ao Bloco a sua oposição à NATO e esforçando-se para transmitir a ideia de que um aumento de gastos em armamento não colocaria em causa áreas como a Saúde ou a Educação. Mortágua vacilou em resposta - "a NATO é controlada pelo maior aliado de Putin" - mas era tarde demais para Nuno Melo.

Os momentos do debate:

O embaraço

Nuno Melo tentou aproveitar um deslize de Joana Mortágua quando esta se referiu ao "governo do PSD" - "É o governo da AD, não faça confusão", ripostou, mas Mortágua aproveitou para fazer pouco do hino da coligação: "É 'Deixa o Luís trabalhar', e não o Luís e o Nuno". Melo ficou mal na fotografia.   

KO

Num volte-face inesperado, Joana Mortágua citou declarações recentes do ex-líder do CDS, Paulo Portas, para criticar a atual posição da AD sobre a imigração, referindo-se à importância da mão-de-obra migrante para "servir às mesas" ou nas "gruas da construção civil". "Quando até Paulo Portas percebe a necessidade de imigração, é preciso reconhecer", disse. Foi tiro e queda.

Pinóquio

O final do debate deixou um impasse no ar: em resposta à proposta da AD de um investimento de 3% do PIB na Defesa, Joana Mortágua declarou que esse valor é maior do que o previsto no Orçamento de Estado para a Educação, ao que Nuno Melo insistiu com veemência que era mentira.

Tendo em conta o PIB de 2024 (€284,9 mil milhões) e o orçamento previsto para a Educação no OE 2025 (7.470,6 milhões), verificamos que corresponde a 2,6% - menos, de facto, do que a AD propõe para a Defesa. 

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