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Debate. As "bandeirinhas" de Ventura e o "gajo mesmo bom" de Montenegro

Alexandre R. Malhado
Alexandre R. Malhado 25 de abril de 2025 às 00:09
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Imagine um casal de ex-namorados que se reencontra — e volta a discutir. O debate desta quinta-feira entre Luís Montenegro e André Ventura foi pessoal, um verdadeiro revisionismo histórico de um antigo namoro.

Luís Montenegro: [O André Ventura] juntou-se ao PSD em 2002, desvinculou-se em 2019 e nunca teve uma única palavra contra. Foi conselheiro nacional do PSD e autarca — e era colaborante com tudo. Até andava de bandeirinha na mão, dizia que o melhor líder era o que está agora à sua frente.

André Ventura: Eu tive vários anos no PSD, mas a única vez que nos encontrámos não fui eu... foi Luís Montenegro que se colou à minha campanha em Loures. E até dizia: "Aquele gajo era mesmo bom. O André Ventura era o melhor talento que temos."

Foi o revisionismo histórico de um antigo namoro. O debate desta quinta-feira que colocou frente a frente Luís Montenegro, primeiro-ministro e líder do PSD, contra André Ventura, presidente do Chega, foi pessoal. Para perceber melhor, é preciso voltar a 2018, quando Rui Rio vencer a liderança do PSD, Ventura lançou um movimento interno para destituir Rui Rio, recém-empossado do PSD, chamado Chega.

Sábado

Não é mesmo não

Segundo o livro Dias de Raiva - Os segredos da ascensão de André Ventura, Ventura avançou com aval de Luís Montenegro, a quem prestaria apoio para uma eventual candidatura. "Faz o que quiseres", terá dito por telefone o então líder parlamentar do PSD, na versão de Ventura. Mais tarde, Ventura sentir-se-ia traído por Montenegro. "Não concordo, não patrocino e não me condiciono por iniciativas que visem destituir o líder do PSD intempestivamente. O PSD precisa de bom senso e maturidade. O nosso adversário é o PS, António Costa e o imobilismo deste Governo amarrado à esquerda radical", disse o então líder parlamentar (hoje primeiro-ministro), em entrevista ao Expresso. Em comunicado, Ventura respondeu: "Fui traído, apunhalado pelas costas e enganado. Para a história ficarão aqueles que desde o início me apoiaram e incentivaram e depois vieram publicamente demarcar-se."

Volvidos sete anos, os dois encontram-se frente a frente em debate — Luís Montenegro enquanto primeiro-ministro e líder do PSD, André Ventura enquanto presidente do Chega, o terceiro partido mais votado — e as mágoas do passado são usadas como arma de arremesso político. "É por essa postura que não tem lugar no Conselho de Ministros, nem nunca vai ter. Não é enquadrável com a função, que exige capacidade de ouvir e respeito", atirou Montenegro, que asseverou e reforçou o "não é não", a linha vermelha de entendimento entre PSD e Chega.

Foi nessa toada que Luís Montenegro arrancou o debate. "Já fui muito claro: é impossível governar com o Chega. Não tem fiabilidade pensamento, comporta-se como um catavento. André Ventura e o Chega têm um pendor destrutivo, virado para falar mal de tudo, está sempre contra tudo e não tem vocação para exercer funções de Governo. E não tem maturidade ou decência." O primeiro-ministro lembrou ainda a despesa pública de 40 mil milhões de euros das propostas eleitorais do Chega: "Seria trágico para os portugueses." Contudo, sobre a nega do PSD para um eventual acordo de Governo, Ventura não deixa Montenegro sem resposta: "Luís Montenegro não quer contar com o Chega nem com ninguém, quer muletas como teve IL e CDS."

Ventura insiste em Saúde, o desconforto de Montenegro

Se o debate fosse um combate de judo, o líder do Chega conseguiu ganhar pontos quando apertou a pega e desequilibrou Montenegro ao tapete com o tema das urgências fechadas. "Enquanto vem dar ar de maturidade e sentido de Estado, mais uma grávida debaixo do seu Governo teve um parto à porta de casa", atirou Ventura, que tenta forçar a ideia de também ser candidato a primeiro-ministro. "Há mais de mil pessoas para lá do tempo de espera nas cirurgias oncológicas. (...) Um rácio de doentes oncológicos que não conseguiram ter uma consulta", atirou noutra altura. E culpou o PSD de colocar "boys do partido a dirigir o SNS": "No primeiro dia que tomar posse como primeiro-ministro, metade destes boys vão ser postos na rua."

Em resposta, Luís Montenegro acusa-o de hipocrisia. "O senhor convive mal com a verdade e gosta de conviver mal com a verdade. É uma forma de estar", atira o primeiro-ministro, que se defendeu com a linha SNS Grávida.

"É a possibilidade de as mulheres grávidas entrarem em contacto com o SNS e serem encaminhadas para o tratamento necessário. Isto ajuda mesmo a salvar vidas."

No fim, foi um dos debates mais intensos destas legislativas. Com Ventura de gravata rosa, que Luís Montenegro diz "condizer com a ação política" do Chega em coligações negativas com o PS, o líder do Chega arrancou o debate calmo, de postura de estadista, quiçá para atrair eleitores do PSD, sem falar de minorias étnicas, nem do caso da empresa familiar de Montenegro, mas acabou por resvalar para a "bandalheira" à medida que o debate aqueceu. "Estou em frente a António Costa, versão olhos azuis, votar no PS e no PSD é a mesma coisa", acusou o líder do Chega, em chave de ouro. Por outro lado, o primeiro-ministro de gravata azul-escura (cor do Chega?) entrou em modo ofensivo contra Ventura, falou de imigração e atingiu o coração de quem vota Chega.

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