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Um quarto dos alunos em casas sem condições. Como será o ensino online para eles?

Sara Capelo 04 de fevereiro de 2021 às 20:15

Grupo de investigadores da Nova SBE juntou dados para sensibilizar o Governo para a necessidade de ter alternativas presenciais para os alunos em risco.

Num país desigual, todas as crianças podem ficar a partir dapróxima segunda-feira,8, em casa em regime de ensino não presencial?

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Escolas Covid-19
Foto: Lusa
Foto: Pedro Simões

Alguns números antes da resposta. PeloInquérito às Condições de Vida e do Rendimento, revelado pelo INE em 2019, sabe-se que: 
- 25,8% das crianças com menos de 12 anos viviam, à época, numa casa em que o telhado deixa passar água, as paredes, fundações e chão são húmidos e os caixilhos das janelas ou o chão estavam apodrecidos. 
- 15,5% viviam em alojamentos sobrelotados.
- 9,2% não tinham luz em casa. 
- 6,5% em zonas de crime e violência. 

O inquérito do ano anterior revelara também que:
- 9% das crianças viviam em famílias sem condições para comparar alimentos para refeições completas e saudáveis.
- 3% tinham fome.

A isto somam-se as estatísticas da ação social escolar, "um indicador de baixos rendimentos", com alguns municípios em que 80% dos alunos beneficiavam deste apoio entre 2007 e 2018. Ou a desigualdade nos desempenhos escolares (nomeadamente a Português e a Matemática) existente em função da formação das mães ou da região de residência. 

A resposta: um sistema de ensino desigual

Estes dados nacionais são pré-pandemia e podem pecar por defeito, entendem os autores do estudo "Crianças em Portugal e ensino a distância: um retrato", enviado ao Governo e revelado esta tarde à comunicação social.  

E podem até apresentar uma estimativa que os autores assumem ser "inferior das privações materiais das crianças" dada a situação vivida com a pandemia nos últimos 11 meses.

E quais as consequências, então? "Mesmo no seu funcionamento habitual, o sistema de ensino é fortemente desigual. O ensino a distância só vem piorar esta desigualdade", lê-se no relatório que cita alguns estudos internacionais sobre as "consequências da disrupção dos sistemas de ensino" durante o ano de 2020. 

Para os investigadores da Nova SBE (Susana Peralta, Mariana Esteves, Pedro Freitas e Bruno P. Carvalho) e do Ambition Institute (Miguel Herdade) que assinam o relatório, este serve "para alertar para a importância de se cumprir o que está naResolução do Conselho de Ministros de julho de 2020. Esse documento prevê que, durante a vigência do ensino a distância, manter as escolas abertas para os alunos "para os quais a escola considere ineficaz a aplicação dos regimes misto. 

Exemplos internacionais

Na Alemanha, segundoum levantamento do IFO Institute, da Universidade de Munique junto de 10.338 pais de alunos alemães entre os 6 e os 18 anos, caiu para metade o tempo médio que estes dedicaram à aprendizagem.

No Reino Unido, o fosso educativo entre os alunos mais desfavorecidos acentuou-se. Os dados são dorelatório anual do Education Policy Institute. Se em 2019 era de 9,3 meses para quem estava no ensino primário e de 18,1 meses nos estudantes do secundário, com o período de confinamento em casa a diferença aumentou 36%, "o que equivale à perda de 10 anos de progresso na diminuição das desigualdades educativas".

E tudo isto tem consequências futuras nos alunos, segundo concluiu a OCDE em 2020, referem os autores: "Com base nos estudos existentes, a OCDE estima que os jovens afetados podem ter uma perda salarial de cerca de 3% ao longo da vida, em média." E no próprio PIB português: notal estudopara a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento, Eric Hanushek e Ludger Woessmann concluíram, "tomando por base os padrões históricos" que o encerramento das escolas no ano passado poderá significar uma perda de mais de 212 mil milhões de euros no PIB. 

Estar na escola: a exceção que devia ser tida em conta

Os autores do relatório não deixam margem logo na introdução: o que se pretende com este documento, enviado a vários governantes, é "reforçar a importância de regressar ao ensino presencial assim que as condições sanitárias o permitam, respeitando a prioridade dada aos alunos até ao segundo ciclo prevista no planeamento do ano letivo."

É que, recordam, na resolução do Conselho de Ministros de 20 de julho de 2020, que planeou o ano letivo que agora decorre, referia-se um alargamento do regime misto ou não presencial apenas de modo "excecional" aos primeiros ciclos de ensino em função do agravamento da pandemia. Caso contrário, este deveria privilegiar os alunos a frequentar o 3.º ciclo e o secundário.

E havia um ponto nas exceções que devia ser levado agora em conta: os alunos deveriam ficar na escola sempre que esta "considere ineficaz a aplicação dos regimes misto e não presencial". 

Ora, referem os autores do relatório que colige dados estatísticos e evidências internacionais (e que pode descarregar aqui em baixo), esta exceção deve ser agora ponderada com o reinício das atividades letivas.

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