Três detidos em operação da PJ na Madeira
Miguel Albuquerque, presidente do Governo Regional da Madeira, é suspeito de crimes de corrupção, participação económica em negócio e prevaricação e também de eventual violação de regras comunitárias em matéria de adjudicação.
A Polícia Judiciária e o Ministério Público estão esta quarta-feira a realizar mais de 130 buscas na câmara do Funchal e outros locais por suspeitas de corrupção, numa operação que envolve o presidente da câmara, Pedro Calado, e o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, avança oCM.
Segundo o CM, Pedro Calado e Avelino Farinha, líder do grupo AFA no Funchal, foram dois dos três detidos. A detenção de três pessoas foi confirmada pela Polícia Judiciária em comunicado, que revela ainda estarem em causa suspeitas dos crimes de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, prevaricação, recebimento ou oferta indevidos de vantagem, abuso de poder e tráfico de influência.
Os três detidos vão ser presentes à Autoridade Judiciária competente, no Tribunal Central de Investigação Criminal, com vista a interrogatório judicial e aplicação de medidas de coação.
As buscas domiciliárias e não domiciliárias tiveram lugar na Região Autónoma da Madeira (Funchal, Câmara de Lobos, Machico e Ribeira Brava), na Grande Lisboa (Oeiras, Linda-a-Velha, Porto Salvo, Bucelas e Lisboa) e, ainda, em Braga, Porto, Paredes, Aguiar da Beira e Ponta Delgada.
A operação abrange três inquéritos iniciados pelo Ministério Público, que investigam negócios privados do presidente do Governo Regional da Madeira. Estes negócios envolvem também outros membros do Governo e autarquias madeirenses, como a câmara do Funchal, que é liderada por Pedro Calado.
Miguel Albuquerque é suspeito de crimes de corrupção, participação económica em negócio e prevaricação e também de eventual violação de regras comunitárias em matéria de adjudicação. Em causa está uma investigação aberta em 2019 no Funchal, que a SÁBADO revelou em maio de 2020.
A autarquia confirmou as buscas num comunicado citado pela agência Lusa: "A Câmara Municipal do Funchal informa que um grupo de inspetores da Polícia Judiciária deu entrada esta manhã nas instalações do edifício dos Paços do Concelho, para a realização de buscas".
A câmara ainda confirma que "está a colaborar na investigação em curso e a prestar toda a informação solicitada, num espírito de boa cooperação".
A operação, que tem no terreno mais de uma centena de inspetores da PJ e procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), teve início após os indícios apontados numa denúncia recebida no Ministério Público da Madeira sobre uma eventual relação suspeita entre Miguel Albuquerque e o grupo Pestana.
A suspeita envolve a venda de quatro imóveis, dos quais a Quinta do Arco, a um fundo imobiliário que tem sede nas Amoreiras, em Lisboa, em 2017, por cerca de 3,5 milhões de euros. Após a venda, a Quinta do Arco foi arrendada ao grupo Pestana, tendo-se transformado em mais de um dos empreendimentos turísticos do grupo madeirense liderado por Dionísio Pestana.
A investigação incide então nas circunstâncias em que o líder do governo regional, e a sua ex-mulher, Elisabete Andrade, venderam a Quinta do Arco, e na suspeita de que os 3,5 milhões de euros tenham sido pagos de forma ilícita.
Esta venda ainda coincidiu com uma outra situação. Apenas 57 dias antes da assinatura dos negócios imobiliários, tinha-se iniciado um novo contrato de renovação da concessão da Zona Franca da Madeira, que o executivo da Madeira concedeu sem concurso público a uma empresa de capitais privados e públicos controlada pelo grupo Pestana.
As buscas decorrem essencialmente em empresas, inclusive no Grupo AFA, que detém os Hotéis Savoy, apurou o Observador. Segundo a CNN, Pedro Calado terá trabalhado neste grupo antes de assumir a presidência da câmara do Funchal.
"As diligências executadas visaram a recolha de elementos probatórios complementares, a fim de consolidar as investigações dos crimes de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, prevaricação, recebimento ou oferta indevidos de vantagem, abuso de poderes e tráfico de influência. Nos inquéritos referenciados investigam-se factos suscetíveis de enquadrar eventuais práticas ilícitas, conexas com a adjudicação de contratos públicos de aquisição de bens e serviços, em troca de financiamento de atividade privada; suspeitas de patrocínio de atividade privada tendo por contrapartida o apoio e intervenção na adjudicação de procedimentos concursais a sociedades comerciais determinadas; a adjudicação de contratos públicos de empreitadas de obras de construção civil, em benefício ilegítimo de concretas sociedades comerciais e em prejuízo dos restantes concorrentes, com grave deturpação das regras de contratação pública, em troca do financiamento de atividade de natureza política e de despesas pessoais", indica a PJ em comunicado.
DCIAP: Investigado o condicionamento de meios de comunicação
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) também confirmou as buscas em comunicado. "Sob investigação estão, além do mais, várias dezenas de adjudicações em concursos públicos envolvendo, pelo menos, várias centenas de milhões de euros. Existem suspeitas de que titulares de cargos políticos do governo regional da Madeira e da Câmara Municipal do Funchal tenham favorecido indevidamente algumas sociedades/grupos em detrimento de outras ou, em alguns casos, de que tenham exercido influência com esse objetivo", lê-se na nota.
"Suspeita-se, designadamente, que as sociedades visadas tenham tido conhecimento prévio de projetos e dos critérios definidos para a adjudicação, assim como acesso privilegiado às propostas e valores apresentados pelas suas concorrentes diretas nos concursos, o que lhes terá possibilitado a apresentação de propostas mais vantajosas e adequadas aos requisitos pré-determinados. Investiga-se, também, um conjunto de projetos recentemente aprovado na Região Autónoma da Madeira, ligados às áreas do imobiliário e do turismo, que envolvem contratação pública regional e/ou autorizações e pareceres a serem emitidos por entidades regionais e municipais, relativamente aos quais se suspeita de favorecimento dos adjudicatários e concessionários selecionados, de violação de instrumentos legais de ordenamento do território e de regras dos contratos públicos, nalguns casos com o único propósito de mascarar contratações diretas de empresas adjudicatárias", adianta.
"Existem ainda suspeitas de pagamento pelo Governo Regional da Madeira a uma empresa de construção e engenharia da região de elevados montantes a coberto de uma transação judicial num processo em que foi criada a aparência de um litígio entre as partes, bem como suspeitas sobre adjudicações pelo Governo Regional da Madeira de contratos públicos de empreitadas de construção civil relativamente aos quais o Tribunal de Contas suscitou dúvidas e pediu esclarecimentos. A investigação incide, de igual modo, sobre atuações que visariam condicionar/evitar a publicação de notícias prejudiciais à imagem do Governo Regional em jornais da região, em moldes que são suscetíveis de consubstanciar violação da liberdade de imprensa", indica o comunicado, que acrescenta que em causa estão factos ocorridos a partir de 2015.
"Participam nas buscas seis magistrados do MP do DCIAP, dois juízes, oito especialistas do Núcleo de Apoio Técnico (NAT) da Procuradoria-Geral da República e um elevado número de inspetores, técnicos informáticos e peritos da Unidade de Perícia Financeira e contabilística da Polícia Judiciária. As investigações têm sido desenvolvidas em estreita e permanente articulação com a Polícia Judiciária, que coadjuva o MP nestes inquéritos", conclui.
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