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Balsemão em 5 momentos-chave: do Expresso à revisão constitucional
No longo percurso de Francisco Pinto Balsemão como jornalista, empresário de media e político há uma mão cheia de momentos cruciais – e marcas que ficarão após a sua morte.
Francisco Pinto Balsemão – o patrão dos media que em 1975 teve uma bomba debaixo do seu Porsche 356 e que aguardou de pistola em cima da mesa um assalto de extremistas à redação do Expresso – morreu na terça-feira aos 88 anos, mas o seu longuíssimo percurso faz com que pareça ter vivido mais de 100. Entre os media e a política foi sempre mais dos media, mas nos dois campos liderou, ou participou, em momentos reveladores. Alguns deixaram marcas duradouras no país.
DR
Jornalismo, censura e Lei de Imprensa
Balsemão entrou aos 25 anos para a redação do Diário Popular, o jornal de que o seu tio e o seu pai (em menor grau) eram acionistas. Foi ganhando a confiança da redação, desenvolvendo uma relação para a vida com o jornalismo e dando sinais sobre a forma profissional – e, por isso, disruptiva – como encarava o meio.Leia Também
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O Expresso
A venda do Diário Popular em 1971 foi feita contra a sua vontade – Balsemão nunca gostou de vender os media que tinha, algo que manteve até ao fim da sua vida – e logo a seguir começou a germinar a ideia do Expresso. Fundou-o aos 35 anos. “Na origem da conceção e do arranque do Expresso estava a minha vontade de provar a mim próprio, à família e ao mundo que era capaz de lançar e fazer triunfar um projeto inovador na área da Imprensa”, escreveu nas Memórias. Balsemão usou o privilégio social com que nasceu para ganhar mundo e inspirar-se no que entendia ser o melhor da imprensa britânica (fonte de inspiração para as mudanças que fez durante o seu tirocínio no Diário Popular). Usou, também, a sua vasta rede de amizades bem colocadas e de longa data para apoiar o projeto – dos acionistas aos distribuidores, passando pela gráfica (os Ruella Ramos e os Bullosa ainda são acionistas da Impreger, o acionista maioritário da Impresa). Nas 68 edições feitas ainda durante o Estado Novo, o jornal foi alvo de 4 mil cortes da censura, segundo uma contabilização citada nas Memórias. Do Expresso, um jornal inovador na altura, sairia o grupo de jornalistas liderado por Vicente Jorge Silva que fundaria o Público no início dos anos 90, outro projeto inovador (financiado por Belmiro de Azevedo). O semanário, já com 52 anos, continua a ser líder na imprensa. A sua propriedade futura está em dúvida no contexto das negociações em curso com os italianos da MFE, que na Impresa querem essencialmente a SIC.Resistência e independência
A ação do Diário Popular começou cedo a valer-lhe inimigos na direita mais dura do regime, que não apreciava a defesa das liberdades por alguém oriundo da elite – chegam a aparecer, segundo o Expresso, folhetos anónimos com o seu nome escrito como “BalseMAO”, numa comparação com o ditador comunista chinês Mao Zedong. Esta aversão encontra ecos nos dias de hoje, com contornos sociais distintos, visíveis nas críticas violentas do Chega! a Balsemão e ao seu grupo Impresa. Durante o PREC, foi a extrema-esquerda a maior ameaça ao Expresso (cujo dono já fizera, então, parte da fundação do PSD). O jornal não alinhou no domínio do PCP sobre a imprensa e pagou um preço: a distribuidora controlada por “elementos favoráveis ao PCP” deixou de distribuir o jornal e ficou com o dinheiro de vendas passadas; os ardinas ameaçaram não vender o jornal; alguém pôs uma bomba no carro desportivo de Balsemão, que passou a andar armado (e não exclui que esse atentado tenha sido por alguém da extrema-direita). A cultura de independência continuou quando Balsemão foi quatro anos depois para o governo da AD, liderado por Sá Carneiro, quando assumiu o cargo de primeiro-ministro em 1981 – e ao longo da sua vida como empresário dos media. Nas Memórias refere que teve sempre mais problemas na política por causa do Expresso (e, mais tarde, da SIC), do que no Expresso por causa da política. A batalha que travou para manter o controlo da Impresa perante a ação da Ongoing – liderada por Nuno Vasconcellos, filho de um dos seus melhores amigos, Luiz Vasconcellos – oferece outro exemplo num contexto em que os poderes por trás da Ongoing estavam alinhados com a consolidação de influência do PS de José Sócrates nos media (num alinhamento de interesses que incluía, entre outros, os Espírito Santo).O primeiro-ministro: a revisão constitucional de 82 (e a CEE)
“Existiam, para o nosso País, duas grandes causas concretas pelas quais valia a pena lutar, dois objetivos essenciais a atingir no curto prazo: a revisão da Constituição, eliminando o papel predominante dos militares, e a negociação e entrada do nosso país na então CEE – Comunidade Económica Europeia”, escreveu nas Memórias. Eram estas as suas duas prioridades quando subiu a primeiro-ministro a 10 de janeiro de 1981, após a morte de Francisco Sá Carneiro no desastre aéreo em Camarate. Balsemão governou em circunstâncias muito duras no plano interno: havia a oposição cerrada dentro do seu próprio partido (que o comparou sempre desfavoravelmente a Sá Carneiro; Cavaco Silva foi um dos principais opositores), fervia a contestação social muito forte ainda na ressaca do período revolucionário e agravava-se a degradação económica, que ampliava os riscos e ameaçava um novo resgate do FMI em Portugal (que chegaria em 1983). O grande feito de Balsemão como primeiro-ministro foi a revisão constitucional de 1982, que extinguiu o Conselho da Revolução, tirando os militares do coração das regras do regime e criando o Tribunal Constitucional – foi um dos passos decisivos no processo de transição de Portugal para a democracia liberal. A revisão contava com uma forte oposição do PCP e da CGTP (na altura com muita influência na “rua”), de uma parte importante do PS, da hierarquia militar, do próprio Conselho da Revolução e, por fim, do Presidente da República Ramalho Eanes (cujos poderes de dissolução da Assembleia da República seriam limitados). Balsemão conseguiu fazer passar a revisão em 1982 com o apoio do PS, contando para isso com o papel crucial de Mário Soares, líder dos socialistas, que comprou uma guerra interna e algo solitária no seu partido para impor as alterações constitucionais (Balsemão elogia repetidamente Soares nas Memórias). Além da revisão constitucional, o governo AD de Balsemão conseguiu ultrapassar o que chama de “ponto de não-regresso” nas negociações para a adesão à CEE – negociações que, depois de uma crise económica duríssima, seriam concluídas três anos depois (1985) pelo governo de bloco central PS/PSD, liderado por Mário Soares.A SIC: revolução na TV (e não só)
A 6 de fevereiro de 1992, 19 anos depois da fundação do Expresso, Balsemão soube que o seu projeto televisivo SIC foi um dos dois que ganhou uma das licenças para operadores privados de televisão generalista. O empresário construiu inicialmente a SIC tal como fizera com o Expresso – usando a sua rede de contactos para atrair acionistas para um negócio promissor numa altura de grande optimismo na economia portuguesa (os iniciais incluíam os Mello, os Espírito Santo, a família Oliveira – da Riopele – entre muitos outros). A tentativa recente de Francisco Pedro Balsemão, o atual CEO da Impresa, de atrair dinheiro português para o negócio carenciado inspirou-se em parte neste percurso do pai. A SIC – na qual se destaca o papel de Emídio Rangel, diretor de informação que acumularia durante algum tempo a direção de programação – foi um motor de revolução da televisão portuguesa, introduzindo uma abordagem mais agressiva na cobertura noticiosa televisiva e uma série de programas entre o irreverente e popular. A estação tornou-se no grande gerador de receitas do grupo Impresa – a SIC é a estação com mais semanas como líder de audiências, lugar que ocupa hoje – e, ironicamente, na origem de boa parte da dívida da Impresa, que nunca deixou de pesar nas contas. Foi em 2005 que o BPI vendeu à Impresa os 41,36% que detinha na SIC, emprestando dinheiro (cerca de 150 milhões de euros) para o efeito. O negócio, num setor que se foi alterando ao longo dos anos, acabou por não gerar receita suficiente para o serviço da dívida, o que explica em boa parte a situação atual da Impresa, na qual os Balsemão deverão perder o controlo. Esse, contudo, é um capítulo ainda por escrever – e já sem Francisco Pinto Balsemão na “torre de comando”.Artigos Relacionados
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