Se nós queremos recuperar a credibilidade da política e dos políticos, não basta escutar os problemas ou criar leis bem-intencionadas. Precisamos mesmo de assegurar que elas passam à prática.
O início do ano é tradicionalmente um momento de balanços, uma oportunidade para refletirmos sobre o caminho percorrido e o que ainda há a fazer. É também a altura em que muitas leis entram em vigor, mas, por vezes, essas leis ficam aquém de cumprir o propósito para o qual foram criadas. Com cinco anos de trabalho parlamentar, tive a felicidade de ver várias leis da minha autoria aprovadas, mas esta experiência trouxe-me também uma preocupação crescente: o fosso entre a aprovação de uma lei e a sua aplicação prática.
Um exemplo paradigmático é a Lei de Bases do Clima, cuja discussão e aprovação na generalidade, no passado dia 6 de janeiro, completou quatro anos. Pouco depois, também o Direito ao Esquecimento, que visava proteger sobreviventes de doenças oncológicas, diabéticos, seropositivos e outros contra discriminações em seguros e créditos à habitação, foi aprovado. Estas leis geraram debates intensos tanto no Parlamento como na sociedade civil. Contudo, permanecem em grande medida por implementar.
Não é, seguramente, por serem temas de menor importância - A importância destas leis é evidente. O Direito ao Esquecimento, por exemplo, tem um impacto direto na vida de centenas de milhares de pessoas. Quando trouxe esta solução a partir da intervenção da Rita Merenda no Congresso do PS FAUL, sustentada nos testemunhos da Associação Acreditar e inspirada em outros países europeus , percebi rapidamente o contraste entre a ausência de reclamações registadas por entidades como o Banco de Portugal e a ASF e os inúmeros relatos pessoais de discriminação. O entusiasmo com a aprovação da Lei foi tão grande que rapidamente o Grupo Parlamentar do PS começou a discutir como debelar outras discriminações, como por exemplo no acesso a seguros de saúde.
A mesma coisa se pode dizer do clima, justamente no ano em que o planeta esteve 1,55º acima da média pré-industrial. As catástrofes climáticas mais impactantes causaram mesmo a morte a 2 mil pessoas e danos de 229 mil milhões de dólares. A Lei de Bases do Clima portuguesa foi reconhecida por muitos como uma das mais ambiciosas e exigentes do mundo. A arquitetura de planeamento, avaliação e políticas públicas transversais, indo além da política ambiental para cobrir a segurança e o sistema financeiro, foi construído para ser resistente a ciclos políticos. Todavia, aos dias de hoje, o elemento central dessa arquitetura – o Conselho de Ação Climática (CAC) – ainda não foi constituído. Sendo o parecer do CAC obrigatório para a maioria dos instrumentos de política, a sua adoção tornou-se inviável. Entretanto, os elementos que podiam ser adotados, como a Estratégia Industrial Verde, o Atlas de Risco Climático ou os Planos Municipais de Ação Climática encontram-se por elaborar.
Todos têm responsabilidade nesta matéria, incluindo o Parlamento. Apesar das audições que fizemos, por exemplo com o Banco de Portugal sobre a avaliação de risco climático no setor financeiro, não fomos capazes de resolver o impasse em que tanto desta lei se encontra. Em matéria de direito ao esquecimento, perante a desresponsabilização das entidades reguladoras, aprovámos um "cavaleiro" no Orçamento do Estado para 2024 que aprimorava a lei, atribuindo competências ainda mais concretas e prazos claros para a regulamentação da lei. Nos primeiros dias deste ano, a ASF já publicou uma norma regulamentar visando a implementação desta lei. O trabalho não acaba aqui, com o acordo por assinar, tendo o atual Governo deixado expirar o prazo de um ano que consta da lei e com o qual se havia comprometido em audição parlamentar.
Se nós queremos recuperar a credibilidade da política e dos políticos, não basta escutar os problemas ou criar leis bem-intencionadas. Precisamos mesmo de assegurar que elas passam à prática. Para isso, o Parlamento deveria dispor de mecanismos próprios e sistemáticos que permitam monitorizar a aplicação da legislação aprovada. Não se trata apenas de avaliar os efeitos concretos das leis, mas também de examinar as consequências da sua não implementação, identificando os bloqueios que impedem o cumprimento das medidas. Este acompanhamento contínuo seria um passo fundamental para assegurar que o trabalho legislativo tem impacto real na vida dos cidadãos.
Ao garantir a execução das leis podemos responder à frustração que tantos sentem com as instituições democráticas. Podemos enfrentar a ameaça do populismo, que se alimenta da simplificação de problemas complexos e da apresentação de soluções extremadas. Num mundo cada vez mais polarizado, a moderação não se faz com perceções ou falsas equivalências. Não chega uma mera triangulação de posições ou uma geometria variável de acordos. A verdadeira moderação faz-se com seriedade e compromisso a entregar resultados concretos aos cidadãos. E que falta faz.
Álvaro Almeida, diretor executivo do SNS, terá dito, numa reunião com administradores hospitalares, que mesmo atrasando consultas e cirurgias, a ordem era para cortar.
O problema começa logo no cenário macroeconómico que o Governo traça. Desde o crescimento do PIB ao défice, não é só o Governo da AD que desmente o otimista programa eleitoral da AD.
Até pode ser bom obrigar os políticos a fazerem reformas, ainda para mais com a instabilidade política em que vivemos. E as ideias vêm lá de fora, e como o que vem lá de fora costuma ter muita consideração, pode ser que tenha também muita razão.
Ventura pode ter tido a sua imagem em cartazes pelo país fora que não engana os eleitores. Os portugueses demonstraram distinguir bem os atos eleitorais.
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É muito evidente que hoje, em 2025, há mais terraplanistas, sim, pessoas que acreditam que a Terra é plana e não redonda, do que em 1925, por exemplo, ou bem lá para trás. O que os terraplanistas estão a fazer é basicamente dizer: eu não concordo com o facto de a terra ser redonda.
O espaço lusófono não se pode resignar a ver uma das suas democracias ser corroída perante a total desatenção da opinião pública e inação da classe política.
O regresso de Ventura ao modo agressivo não é um episódio. É pensado e planeado e é o trilho de sobrevivência e eventual crescimento numa travessia que pode ser mais longa do que o antecipado. E que o desejado. Por isso, vai invocar muitos salazares até lá.