Sábado – Pense por si

Síria. 13 anos depois, guerra civil ganha novo impulso

Gabriela Ângelo com Leonor Riso 02 de dezembro de 2024 às 18:31
As mais lidas

Regime de Bashar al-Assad parece ter sido apanhado de surpresa pelos ataques rebeldes a Aleppo. Grupos parecem ter aproveitado "distração" da Rússia e do Irão.

A conquista de Alepo por parte dos rebeldes ao regime de Bashar al-Assad fez com que a guerra civil na Síria ganhasse novo impulso, o que traz implicações para a região do Médio Oriente marcada pelo conflito entre Israel e Gaza, e Israel e o Líbano. 

AP

Desde março de 2020, as linhas de conflito na Síria têm estado congeladas após terem sido celebrados cessar-fogos e acordos de segurança feitos pela Rússia, a Turquia, o Irão e os Estados Unidos na região. Tudo isto mudou na quarta-feira, 27, dia em que o cessar-fogo entre o Líbano e Israel foi aprovado. Nesse dia, uma coligação de grupos rebeldes armados lançou uma ofensiva em Alepo, no noroeste da Síria. Desde então, o exército sírio e os seus aliados estrangeiros têm lançado ataques aéreos para travar os militantes. 

Situada perto da fronteira com a Turquia, Alepo é uma das maiores cidades da Síria e situa-se num cruzamento de rotas comerciais. Outrora, foi um dos centros de comércio e cultura no Médio Oriente.

Este foi o primeiro ataque de rebeldes a Alepo desde 2016, ano em que o presidente Bashar al-Assad conseguiu o controlo de 70% do país, que mantinha até dia 27.

Quem são os rebeldes que tomaram Alepo? 

Os rebeldes que tomaram Alepo foram liderados pelo grupo jihadista HTS (Hayat Tahrir al-Sham). Este grupo é considerado terrorista pelos EUA, Rússia, Turquia e outros países. Outra aliança rebelde lançou uma ofensiva diversa, a norte da cidade: são apoiados pela Turquia e operam sob o estandarte do Exército Nacional Sírio.

No domingo, os rebeldes controlavam uma vasta extensão de território nas províncias de Hama, Idlib e Alepo, segundo o grupo de monitorização britânico Observatório Sírio para os Direitos Humanos.

Rebeldes aproveitaram "distração" do Irão e Rússia?

Esta ofensiva lançada aumentou a probabilidade da reabertura de outra frente violenta no Médio Oriente, numa altura em que Israel, apoiado pelos EUA, luta contra o Hamas em Gaza e o Hezbollah no Líbano, ambos grupos aliados do Irão.

O Irão e a Rússia são dois grandes aliados de Bashar al-Assad. Segundo a agência noticiosa Associated Press, o Irão está enfraquecido pelos ataques aéreos israelitas, pelas perdas no terreno e por uma crise económica interna. O Hezbollah foi atingido e diminuído após 13 meses de guerra com Israel que levaram à morte do seu líder, Hassan Nasrallah. A Rússia está agora a chegar ao fim do terceiro ano de uma guerra desgastante com a Ucrânia.

Por isso, os rebeldes parecem ter aproveitado um momento de distração dos principais aliados de Assad - e conseguiram tomar a maior parte da região de Alepo em apenas três dias. 

Desde quarta-feira que a Rússia tem feito alguns ataques aéreos contra os rebeldes e contra as vilas e cidades controladas pelas forças de oposição, mas não têm sido avassaladoras. Segunda-feira, o presidente Bashar al-Assad reuniu-se com Abbas Araghchi, o ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, em Damasco para discutir a cooperação no combate ao terrorismo. A agência noticiosa nacional da Síria, a SANA, revelou ainda que o presidente Vladimir Putin terá falado com Masoud Pezeshkian, o presidente do Irão, ao telefone sobre os ataques.

Qual é a situação na Síria?

O presidente sírio Bashar Al-Assad tem estado em guerra com as forças da oposição que o tentam derrubar há cerca de 13 anos, num movimento que começou com a Primavera Árabe de 2011. O conflito resultou na morte de meio milhão de pessoas e à fuga de 6,8 milhões de sírios. Este fluxo de refugiados contribuiu para a mudança do mapa político da Europa, dando azo a movimentos anti-imigração de extrema-direita, aponta a agência noticiosa Associated Press. 

O governo de Assad controla entre 60 a 70% do país, incluindo a maioria das grandes cidades, mas nem sempre foi o caso. No pico das forças da oposição da guerra civil, e depois de o grupo terrorista Estado Islâmico ter invadido partes da Síria, o governo tinha perdido o controlo da maioria do país.

Embora o Estado Islâmico tenha perdido muita da sua influência na região em 2019, ainda mantém alguns tentáculos escondidos dentro do deserto da Síria, realizando ataques ocasionais contra soldados e civis pró-governo e contribuindo para a instabilidade sentida no país. Os EUA ainda mantêm cerca de 900 soldados no nordeste da Síria, para travar os jihadistas do Estado Islâmico. 

Atualmente, quatro grupos armados competem pelo poder no terreno sírio: as Forças Armadas Sírias, que detêm a principal força militar do governo, lutam ao lado das Forças de Defesa Nacional e são um grupo paramilitar e pró-governo; as Forças Democráticas da Síria, um grupo apoiado pelos Estados Unidos, dominado pelas forças curdas que controlam partes do leste da Síria; o HTS, uma frente da Al-Nusra, que tinha jurado lealdade à Al-Qaeda até romper esses laços em 2016, e que é liderada por Abu Mohammed al-Golani; e as forças rebeldes sírias-turcas ou Exército Nacional Sírio que são apoiadas pela Turquia no norte da Síria.

Artigos Relacionados

Férias no Alentejo

Trazemos-lhe um guia para aproveitar o melhor do Alentejo litoral. E ainda: um negócio fraudulento com vistos gold que envolveu 10 milhões de euros e uma entrevista ao filósofo José Gil.

As 10 lições de Zaluzhny (I)

O poder não se mede em tanques ou mísseis: mede-se em espírito. A reflexão, com a assinatura do general Zaluzhny, tem uma conclusão tremenda: se a paz falhar, apenas aqueles que aprendem rápido sobreviverão. Nós, europeus aliados da Ucrânia, temos de nos apressar: só com um novo plano de mobilidade militar conseguiríamos responder em tempo eficaz a um cenário de uma confrontação direta com a Rússia.