Os Médicos Sem Fronteiras (MSF) denunciaram hoje o "elevado número" de casos de violência que milhares de pessoas enfrentam na travessia do estreito de Darién, entre a Colômbia e o Panamá, onde prestaram 30.000 consultas médicas a migrantes.
Em comunicado hoje divulgado, os MSF avançam ter realizado 30.000 consultas médicas às pessoas em trânsito entre a Colômbia e o Panamá, pela selva do estreito de Darién, e exortam os governos dos dois países a estabelecerem rotas seguras.
"Os ataques violentos contra pessoas migrantes, frequentemente agravados por agressão sexual e violação, repetem-se por toda a região. Os números de casos de violência sexual assistidos pelas equipas da Médicos Sem Fronteiras (MSF) são chocantemente elevados", pode ler-se no documento.
De acordo com a organização humanitária, são famílias inteiras que se estão a deslocar rumo a Norte, vindas de diversos países da América do Sul e, das 30 mil consultas realizadas, dez mil foram a menores de idade e cerca de 1.000 a mulheres grávidas.
Desde abril, as equipas médicas da MSF atenderam 288 vítimas de violência sexual.
Nas últimas semanas, de acordo com o comunicado, as equipas médicas estão a observar "uma ligeira melhoria no estado físico das pessoas", adiantando que a comunidade Bajo Chiquito, no Panamá, está a oferecer às pessoas a opção de fazer o último trecho do trajeto numa canoa, para que seja um pouco mais curto, dois dias.
"Os migrantes que podem pagar pelo serviço viajam até Bajo Chiquito, a primeira comunidade do lado do Panamá", explicou Owen Breuil, coordenador do projeto de campo da MSF no Panamá.
"Isso significa que eles não chegam em condições físicas tão extremas como antes. Mas ainda estamos a ver o tremendo impacto que os ataques estão a ter na saúde física e mental dos pacientes que cuidamos", reconheceu o responsável.
Segundo a MSF, os atuais altos níveis de violência ocorrem apesar de uma diminuição percetível nos ataques em algumas semanas em outubro, coincidindo com uma maior presença de tropas do SENAFRONT (Serviço Nacional de Fronteiras), ao longo da rota.
"Essa redução teve vida curta, e agora estamos a assistir a violência extrema e a violência sexual aumentou novamente", disse Owen Breuil.
Das mais de 30.000 consultas médicas prestadas às pessoas que chegaram a Bajo Chiquito, no Panamá, onde a MSF colabora com o Ministério da Saúde, e nos centros de receção de migrantes de Lajas Blancas e San Vicente, as condições mais comuns observadas pelas equipas de saúde incluem lesões por quedas, problemas de pele devido a picadas e mordidas e problemas nos pés.
"A grande maioria dos migrantes que vemos são famílias de haitianos que viveram nos últimos anos no Brasil ou no Chile. Muitos deles perderam os seus meios de subsistência devido à pandemia e foram forçados a mudar para o norte em busca de oportunidades", acrescentou.
Além de cuidados médicos, a MSF oferece cuidados de saúde mental, dos quais as pessoas precisam muito depois das suas experiências traumáticas cruzando a selva, revela o documento.
Até o início de outubro, a MSF deu 877 consultas individuais de saúde mental e 3.475 pessoas participaram em consultas de grupo.
De acordo com o Departamento de Migração do Panamá, em 2021, 121.737 migrantes entraram no Panamá pela selva de Darién, 29.604 deles só em outubro.
Em apenas 10 meses deste ano, tantos migrantes cruzaram a selva de Darién quanto nos últimos 11 anos.
"O trânsito livre e ordenado entre os dois países é a única opção sustentável para garantir a proteção dessas pessoas. Exortamos por rotas seguras para famílias migrantes e para que os governos regionais forneçam proteção contra a violência", disse Breuil.