Três investigadoras denunciaram situações de assédio num livro, o que levou a que Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam no CES.
O sociólogo Boaventura de Sousa Santos apresentou uma queixa-crime por difamação contra um grupo de 13 mulheres, investigadoras e antigas estudantes do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, que o têm acusado de assédio.
Marisa Cardoso
“Durante dois anos, o denunciante foi condenado sem julgamento (nem sequer sumaríssimo), sem sequer conhecer alguma vez uma única denúncia efetuada contra si depois de 2024. A conduta das denunciadas destruiu, irremediavelmente, uma reputação que levou mais de seis décadas a construir”, lê-se na queixa-crime a que agência Lusa teve acesso.
A queixa-crime contra as 13 académicas, cujo comportamento acredita configurar os crimes de difamação, com publicidade e calúnia, deu entrada no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Coimbra a 8 de abril.
Três investigadoras que passaram pelo CES denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado “Má conduta sexual na Academia - Para uma Ética de Cuidado na Universidade”, o que levou a que os investigadores Boaventura de Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam no CES, em abril de 2023.
O CES acabou por criar, uns meses depois, uma comissão independente para averiguar as denúncias, tendo divulgado o seu relatório quase um ano depois, em 13 de março de 2024, que confirmou a existência de padrões de conduta de abuso de poder e assédio, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores, sem especificar nomes.
Uma semana depois, um grupo de 13 mulheres instou, num documento assinado por todas, as autoridades judiciárias portuguesas a investigarem com urgência as alegadas condutas criminosas mencionadas no relatório.
Em setembro de 2024, Boaventura de Sousa Santos intentou uma ação cível para tutela da personalidade, com a qual procura assegurar a proteção do seu bom nome e honra, face a acusações desse grupo de mulheres. 0 julgamento teve início em novembro, mas, continua por terminar.
Na queixa-crime, entregue em abril no DIAP de Coimbra, é frisado que, até 2024, não foi feita qualquer denúncia nas instituições onde o grupo das 13 académicas estudavam ou lecionavam, nem “junto das entidades que financiavam as suas bolsas, na comunicação social ou nas redes sociais”.
“Nem uma denúncia anónima houve”, evidenciou, acrescentando ainda que algumas das denunciadas, “as que de mais perto conviveram com o denunciante”, construíram a sua carreira académica “à sombra do denunciante e do seu prestígio”.
“Enquanto o denunciante lhes foi útil para concorrerem a bolsas de doutoramento e pós-doutoramento, para integrarem movimentos sociais, para enriquecerem o seu currículo, para subirem na hierarquia do CES, para integrarem projetos de investigação nacionais ou internacionais todas o elogiavam e demonstravam carinho por ele”.
No documento a que a Lusa teve acesso é ainda indicado que quando Boaventura deixou de lhes ser útil, “todas se associaram como coletivo para o difamar”.
“Todas têm consciência da respetiva motivação que, obviamente, foi instrumentalizada para sanear o denunciante. A conduta cúmplice, e ativamente impeditiva do exercício eficaz do direito de defesa do denunciante por parte dos responsáveis do CES, indicia a determinação séria e dolosa de sanear o denunciante”.
Na queixa-crime, Boaventura pede a responsabilização criminal das 13 mulheres, afirmando que a sua reputação internacional e o trabalho desenvolvido foram atingidos de forma irreparável.
“É manifesta a repercussão internacional que a agressão das denunciadas provocou e alcançou. A imagem, honra, prestígio do denunciante viram-se destruídos, violentamente abalados, senão mesmo aniquilados. Crê, por isso, o denunciante que a via da tutela da personalidade já não acautela os seus direitos, devendo as condutas das denunciadas ser punidas criminalmente”, concluiu.
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O Estado português falha. Os sucessivos governos do país, falham (ainda) mais, numa constante abstração e desnorte, alicerçados em estratégias de efeito superficial, improvisando sem planear.
A chave ainda funcionava perfeitamente. Entraram na cozinha onde tinham tomado milhares de pequenos-almoços, onde tinham discutido problemas dos filhos, onde tinham planeado férias que já pareciam de outras vidas.