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Relatório sobre acidente do elevador da Glória aponta responsabilidade à Carris

Diogo Barreto
Diogo Barreto 20 de outubro de 2025 às 19:15
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Relatório preliminar fala em manutenção sem atualização técnica, falha nos sistemas de frenagem e ausência de supervisão.

O relatório preliminar do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e Acidentes Ferroviários (GPIAAF) aponta várias desconformidades em toda a operação no elevador da Glória, principalmente no que diz respeito ao cabo que foi instalado em 2022 no elevador da Glória e em 2023 no do Lavra. Apesar de não avançar com responsáveis pelo acidente, o relatório afirma que “mecanismos organizacionais de controlo interno [da Carris] não foram suficientes ou adequados para prevenir e detetar tais falhas”.

Acidente no elevador da Glória em Lisboa sob investigação
Acidente no elevador da Glória em Lisboa sob investigação Sérgio Lemos

O cabo inadequado

O cabo instalado no elevador da Glória não correspondia à especificação da Carris para aquele veículo e não estava certificado para ser usado em instalações de transporte de pessoas, de acordo com o relatório preliminar do GPIAAF.

De acordo com este relatório, o cabo inadequado foi instalado em 2022 no elevador da Glória e em 2023 no elevador do Lavra. Também o cabo do elevador de Santa Justa não corresponde às especificações no que toca à graduação do aço e respetiva certificação.

O GPIAAF refere ainda que apesar de ter recebido os cabos em 2022, os mecanismos internos não detetaram as divergências e foram substituídos por cabos da mesma especificidade dois anos depois.

Mas os autores deste relatório ressalvam que a utilização deste cabo não é justificação suficiente para ter motivado o acidente. Isto porque, “cabos iguais estiveram em uso durante 601 dias no Ascensor da Glória (e 606 no Ascensor do Lavra) sem incidentes”. "Não é possível neste momento afirmar se as desconformidades na utilização do cabo são ou não relevantes para o acidente”, pode ler-se.

A pinha gasta

O relatório dá importância ao estado da pinha - peça que trata da fixação do cabo ao veículo. Foi numa das pinhas que liga o cabo ao veículo que ocorreu a rutura.

Os autores do relatório sublinham que cabia à empresa externa que fazia a manutenção destes equipamentos para a Carris desde 2019 — a MNTC (Main) — a responsabilidade de montar o cabo e a pinha de fixação. Mas ressalvam que a execução da pinha é “feita segundo um processo empírico histórico na CCFL e passado de geração em geração de trabalhadores responsáveis”. Ou seja, não existe “qualquer procedimento escrito registado no sistema documental da Carris definindo o tratamento de preparação dos arames do cabo, a composição e preparação da liga de fundição, e a execução e controlo de qualidade da pinha”. Ou seja, os técnicos da MNTC não tinham informação sobre como executar as pinhas.

Carris diz desconhecer "incumprimento"

A Carris afirmou desconhecer qualquer incumprimento por parte da empresa que fazia a manutenção do Elevador da Glória, em Lisboa, após ser conhecido o relatório preliminar.

Num comunicado, a Carris destacou que o conselho de administração da empresa desconhecia “toda a factualidade descrita”, uma vez que “este incumprimento nunca foi reportado pela Direção de Manutenção do Modo Elétrico, nem pelo Gestor do Contrato, que aliás reiteraram a máxima confiança no desempenho desta empresa, mesmo após o acidente ter ocorrido”.

O acidente

O primeiro embate ocorreu a uma velocidade estimada de entre os 41 e os 49 quilómetros hora, tendo decorrido 33 segundos desde a preparação para a viagem e 20 segundos desde o início do movimento.

A investigação sublinha que “a zona onde o cabo rompeu não era passível de inspeção visual sem desmontagem do destorcedor do trambolho superior [zona de fixação do cabo]”.

“Uma análise macroscópica das extremidades dos cordões rompidos evidencia roturas progressivas, portanto, ocorrendo gradualmente ao longo do tempo, e de diversos tipos. As peritagens metalográficas que serão realizadas no decurso da investigação esclarecerão os mecanismos de rotura envolvidos”, lê-se no relatório preliminar.

O GPIAAF revela também que, “imediatamente antes da preparação para o início da viagem” do acidente, na cabina 1, que se encontrava no cimo da Calçada da Glória, estavam 27 pessoas, incluindo uma criança e o guarda-freio, enquanto no interior da cabina 2, junto à Praça dos Restauradores, estavam 33 pessoas, incluindo três crianças e o guarda-freio.

“Portanto, ambas bem abaixo da sua lotação máxima de 42 ocupantes”, frisa este organismo, acrescentando que no dia do acidente os ascensores “haviam realizado 53 viagens no total”.

“A ocupação média foi de 22 passageiros na cabina 1 e de 17 passageiros na cabina 2, sendo que a lotação máxima de 42 passageiros foi atingida em duas viagens na cabina 1 e em uma viagem da cabina 2”, constatou a investigação.

No relatório preliminar, o GPIAAF adianta ainda que ambos os ascensores “estavam equipados com quatro câmaras de videovigilância, cada um, e com um dispositivo dotado de acelerómetros [equipamentos para medir a aceleração] de baixa precisão”, dando conta de que na Calçada da Glória “existem também diversas câmaras de vigilância”.

“Tal permitiu à investigação estabelecer com o rigor suficiente a sequência de eventos que antecederam o acidente”, indica o documento.

O primeiro embate ocorreu a uma velocidade estimada de entre os 41 e os 49 quilómetros hora, tendo decorrido 33 segundos desde a preparação para a viagem e 20 segundos desde o início do movimento.

Com Lusa

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