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Manuel perde casa para a barragem do Alto Tâmega e já não quer ficar em Sobradelo

15 de abril de 2019 às 15:56
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Manuel Gomes disse que foi "um choque" quando lhe disseram que ia "perder tudo" aquilo que conquistou com uma vida de trabalho lá fora.

Em Sobradelo, concelho de Boticas, Manuel Gomes queixa-se de ter de deixar a sua casa e terreno junto ao rio, onde escolheu viver depois de 40 anos emigrado em França, por causa da barragem do Alto Tâmega.

"Na aldeia, não quero cá ficar. Não consigo ficar aqui a ver tudo isto que é meu debaixo de água", afirmou o ex-emigrante de 67 anos.

Manuel Gomes ainda não tinha 18 anos quando emigrou para França, onde sempre trabalhou na agricultura. Foi lá que nasceram os três filhos e os cinco netos.

Em 2015, quatro décadas depois, regressou definitivamente à aldeia de Sobradelo, no distrito de Vila Real, onde já tinha comprado um terreno junto ao rio, construído uma casa e, mais recentemente, recuperado uma outra habitação de granito.

Dois anos depois, foi informado de que tem que deixar tudo devido à subida das águas do rio, na sequência da construção da barragem do Alto Tâmega, uma das três que constitui o Sistema Eletroprodutor do Tâmega (SET), que foi concessionado à espanhola Iberdrola.

Manuel Gomes disse que foi "um choque" quando lhe disseram que ia "perder tudo" aquilo que conquistou com uma vida de trabalho lá fora.

Ainda anda "com o coração apertado" e com receio pela vida que vai ter que recomeçar "do zero" até agosto de 2020 e ainda não sabe onde.

Não quer ficar em Sobradelo, mas não descarta a hipótese de ir para Boticas ou até mesmo regressar a França, onde vivem os filhos.

O ex emigrante referiu que não aceitou a indemnização proposta pela Iberdrola, porque considerou que é "muito inferior" ao que vale a propriedade, pelo que a empresa avançou para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Guimarães.

Esta família é a única que vai ficar sem casa em Sobradelo, mas outros residentes vão perder terrenos agrícolas para a barragem.

É o caso de José Varão, de 58 anos, que vai perder a maior parte da sua vinha para o rio Tâmega e uma importante "fonte de rendimento".

"Vai custar ver tudo coberto de água. Mesmo que paguem o justo valor, que não o pagam, preferia continuar a ter a vinha do que o dinheiro", salientou.

O Sistema Eletroprodutor do Tâmega é um dos maiores projetos hidroelétricos realizados na Europa nos últimos 25 anos, contemplando a construção de três barragens (Daivões, Gouvães e Alto Tâmega), que vão afetar os concelhos de Boticas, Vila Pouca de Aguiar, Ribeira de Pena, Chaves e Cabeceiras de Basto.

A concessionária disse à agência Lusa que, no total, foram identificadas 52 habitações na área de influência direta das albufeiras, tendo 25 delas ocupação permanente.

Segundo a Iberdrola, a maioria das habitações afetadas encontra-se em Ribeira de Pena, pelo que se encontra a "trabalhar com a autarquia em soluções que permitam fixar a população no concelho".

Em agosto de 2017, aquando da concretização da Declaração de Utilidade Pública, "todos os proprietários foram notificados sobre a necessidade de expropriação e, desde esse momento, foi alcançado um importante número de acordos".

A Iberdrola afirmou que este processo "tem avançado de forma positiva" e que, de acordo com o calendário estabelecido, "os proprietários terão de abandonar as habitações até finais de 2019, no caso das que estão afetas à barragem de Daivões, e até 31 de agosto de 2020, no caso das habitações afetas à barragem do Alto Tâmega".

Explicou que todas as parcelas afetadas pelo SET foram, "previamente, avaliadas por peritos da lista oficial para fixação da justa indemnização, nos termos do Código das Expropriações", e que, nos casos de expropriação de habitações, tenta "sempre um acordo amigável com os proprietários, evitando o procedimento expropriativo pela via judicial".

A Iberdrola reforçou ainda que "tem reunido todos os esforços para encontrar, em cada caso, a melhor solução junto dos proprietários afetados pela construção do Sistema Eletroprodutor do Tâmega".

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