Luís Montenegro, o Governo e o líder parlamentar do PSD falharam na comunicação sobre os incêndios. Ventura é quem fala melhor com o seu eleitorado. Se Manuel Pizarro quer que à terceira seja de vez no Porto tem de mostrar que corrigiu erros. As falhas e as boas práticas numa entrevista à autora de "3-2-1 Política com Impacto".
Como se prepara um líder político ou um candidato autárquico? Que influência tem o autoconhecimento na quantidade de votos que este atrai? O humor conta? A relação entre a psicologia e a política em entrevista à psicóloga Cristina Valente, autora do livro 3-2-1 Política com Impacto, publicado em junho.
Cristina ValenteDR
Qual é o líder político português que comunica
melhor com o seu eleitorado?
André Ventura, sem qualquer sombra de dúvida. O Chega foi perceber a grande causa de
descontentamento da geração Z portuguesa, que não votava, que estava muito mais
desligada da política e de causas importantes ligadas ao País; foi ver onde é
que eles [jovens] estão e o que é que eles procuram. Foram ter com eles e
apresentar-lhes a política. Este partido soube entender o que é que os jovens não
tinham nos políticos ou nos partidos tradicionais.
Escreveu que “estamos a entrar numa nova era na
liderança política e não nos temos preparado para essa transformação”,
sugerindo que os partidos tradicionais não estão a ouvir os novos eleitores. Têm de acordar?
Há uma característica que está muito pouco associada
a políticos e a candidatos políticos, que é a humildade. E a humildade não
é apenas o contrário de arrogância e de orgulho; é sobretudo um mindset de
serviço ao outro. Os políticos precisam, em primeiro lugar, de
trabalhar o seu autoconhecimento. A inteligência emocional já não é um bónus.
Os nossos resultados, do ponto de vista científico, dependem 95% do nosso lado
irracional, ou seja, da emoção. Portanto, a maior falha que vejo é de
inteligência emocional. Quando não me conheço o suficiente, como é que posso querer que a minha audiência, os meus eleitores, olhem para mim como um
ser humano?
Faltou inteligência emocional ao primeiro-ministro
na gestão dos incêndios nas últimas semanas?
Faltou inteligência emocional aos políticos e faltou inteligência emocional a quem assessora os políticos. É necessária uma nova
geração de assessores políticos que sejam especialistas em comunicação,
especialistas em comportamento humano de base científica.
Foi um erro muito grave em termos de comunicação
política. Acompanhei isto pessoalmente no terreno: a ausência de uma nota que podia ter gerado logo mais conexão com as pessoas,
sobretudo com as pessoas que estão a sofrer. Depois, houve uma comunicação do
Hugo Soares [líder parlamentar do PSD] a dizer que não houve falhas: isso é o maior erro de um político. Perante
uma tragédia, não olhar para dentro e não tentar um processo de melhoria
contínua.
Houve ainda uma outra comunicação a
dizer que estava tudo melhor — mas tendo-se gerado o mesmo resultado — isto é um absurdo. Nestes casos, um
líder político tem de olhar com pinças, com muita humildade e com muita
coragem. Não vai sempre correr bem: isso é impossível num processo de
liderança. Aquilo que distingue um líder do outro é a forma como agem depois de as coisas correrem mal.
Como se prepara um candidato para vencer uma
campanha?
Primeiro, prepara-se um candidato para ser melhor
ser humano. Tem que se mudar as perguntas: Como é que faço para o candidato
entender melhor os seus comportamentos? Como é que faço para o candidato
entender padrões inconscientes que não consegue controlar. Há microexpressões,
há posturas, há pausas, há tons de voz, há padrões de respiração que vêm do
inconsciente (por isso é que estas ferramentas são utilizadas na psicologia
forense para detetar se a pessoa está a mentir). A única forma
de estar descansada com a congruência do que digo e faço é conhecer esses padrões. Isso gera congruência no
eleitorado ou na audiência; aumenta a conexão; e aumenta a confiança. E mudar a partir de dentro não pode ser visto como forma para se ser rico ou para se ter mais eleitores. Tem de ser uma preocupação genuína em conhecer os padrões de comportamento e crenças negativas. É um trabalho duro, porque faz o candidato sair da zona de conforto. E a
maior parte das pessoas não quer ou não tem tempo, porque a emergência é estar
bem colocado em sondagens, ganhar aquele debate...
Enumera três fatores que podem impedir que um
político atinja o seu objetivo: a existência de uma estratégia, a falta de
competência ou uma crença limitante. Têm todas a mesma
importância ou há uma que custa de forma mais óbvia uma eleição?
Essa resposta vem de um processo de coaching e de
autoconhecimento que a pessoa faça. Posso ter uma determinada crença
limitante que seja maior do que a falta de uma competência.
E como é que se regressa depois de uma derrota? Por
exemplo, no caso de Manuel Pizarro que se está a lançar à Câmara do Porto com duas derrotas no bolso.
Tem muito a ver com a forma como pessoa sente essa derrota e como encara as verdadeiras causas dessa derrota. Essas causas
geralmente estão em mim, não estão nas circunstâncias. Se estive rodeada de
pessoas erradas, tenho de perceber como foi esse processo de decisão, porque a decisão decorre de uma crença que tenho. E o que é que são crenças? São
verdades escritas na pedra para o meu sistema, mas que podem ser mudadas; elas
não estão realmente escritas na pedra, só que elas levam-me a tomar decisões que, às vezes, não são as melhores e que me podem levar a uma derrota e
a não ver onde estão as oportunidades. Neste caso, uma retratação é algo muito importante quando se falha, mas os políticos fogem como o
diabo da cruz.. Uma retratação não é só pedir desculpa, mas mostrar à outra pessoa ou ao meu eleitorado que sei
o que é que eu poderia ter feito de outra maneira. Se não entendi o que é
que me levou àquela falha, vou falhar de novo, porque é um padrão inconsciente.
Defende também que o humor tem hoje um papel
fundamental na aceitação de um político e diz mesmo que a fusão do trabalho
com a diversão “tornou-se necessária e altamente valorizada”. Dançar no Tik Tok atrai votos fundamentais?
Refiro no livro o caso da Theresa May, que estava a
ser arrasada na internet, e que entra no congresso do partido dela a dançar
Dancing Queen, e isso é uma forma muito inteligente de usar o humor que foi
usado contra uma pessoa para ressignificar a postura enquanto líder. O humor tem é de ser genuíno. O que acontece muitas vezes quando se imita uma situação que não é genuína é que não se gera conexão.
O pretexto para a publicação deste livro foram as
eleições autárquicas de outubro. A proximidade, que é uma característica destas
eleições, torna-as mais desafiantes ou é uma oportunidade para os candidatos?
Para o candidato que é o empresário da sua terra, que conhece bem os problemas desta, conhece as suas gentes, conhece a cultura, isso é um plus.
Mas também há o contrário. Como é que alguém com um
perfil mais partidário e que venha de fora disputa com sucesso a eleição com um
local?
É perceber qual é a visão de serviço que aquela
pessoa tem. Em que é que o candidato acredita que vai adicionar, porque pode
perfeitamente ser um estrangeiro daquela terra e pode ganhar. É
sobre a qualidade da pessoa. O mais importante é saber comunicar o que consegue fazer enquanto candidato, o que o move.
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