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Os bastidores das negociações que levaram Julian Assange a conseguir a liberdade

A pressão política exercida pela Austrália levou que fosse formalizado um acordo com os EUA para libertar o fundador do portal WikiLeaks. Depois da libertação, advogada australiana agradeceu ao primeiro-ministro.

Há anos que a pressão diplomática da Austrália tentava libertar o fundador do WikiLeaks, Julian Assange, detido em Inglaterra e acusado nos EUA de crimes de espionagem. Um esforço que culminou esta semana com o acordo que permitiu libertar o australiano, depois de 14 anos de um intensiva batalha legal. Ainda assim, Assange teve de assinar um acordo no qual se declara culpado, mas sem necessidade de cumprir mais anos de prisão.

Depois de assinado o acordo, a advogada de Assange fez questão de agradecer publicamente ao primeiro-ministro australiano, Anthony Albanese, pelo seu empenho no caso.

REUTERS/Edgar Su

Após viver sete anos exilado na embaixada no Equador e mais cinco numa prisão de segurança máxima, ambas em Londres, o fundador do WikiLeaks teve carta branca para regressar ao seu país natal, a Austrália, na terça-feira, tendo chegado esta quarta-feira a casa. 

Dezenas de deputados australianos apoiaram a campanha para trazê-lo de volta a casa, confessou John Shipton, pai de Assange, à agência noticiosa Reuters. Exemplo disso, foi a moção parlamentar aprovada em fevereiro deste ano e que pedia a libertação do denunciante.

A juntar-se a esta pressão interna e visível, estiveram as ações da diplomacia apoiadas pelo governo. "Em cada oportunidade, e quando os oficiais australianos contactavam os EUA, sabiam que estavam a agir com a total cobertura do primeiro-ministro da Austrália", explicou Jennifer Robinson, a advogada australiana de Assange.

As negociações duraram dois anos, após o governo trabalhista vencer as eleições em maio de 2022. "A minha posição é clara e esclareci à administração dos EUA que é altura de este assunto ser encerrado. Ele é um cidadão australiano", declarou o primeiro-ministro, Anthony Albanese.  

A nomeação de Kevin Rudd e Stephen Smith para os principais cargos diplomáticos em Londres e Washington, no final de 2022, ajudou à causa de Assange. Smith chegou mesmo a visitá-lo na prisão de Belmarsh em abril de 2023.

A Austrália aprofundou também os laços de segurança com os EUA através de um novo pacto - AUKUS - que ajudou a impulsionar os esforços diplomáticos, admitiu Mark Kenny, professor da Universidade Nacional da Austrália. Porém, o acordo chegou a estar em risco, em julho do ano passado. Os EUA ponderaram manter as acusações, mudando de ideias um mês depois, após Caroline Kennedy, embaixadora dos EUA em Camberra, afirmar que um acordo seria possível.

Já em setembro, após administração Biden receber uma delegação de políticos australianos, que tinham como objetivo falar com os legisladores democratas e republicanos sobre o caso do fundador da WikiLeaks, o discurso pareceu ficar mais moderado.

Mas foi a decisão do Supremo Tribunal do Reino Unido, em maio deste ano, que permitiu que Assange recorresse da sua extradição que desencadeou o avanço nas negociações sobre um acordo judicial, segundo a sua mulher, Stella. 

Por fim, as autoridades norte-americanas concordaram com um acordo, no qual o australiano de 52 anos, teve de declarar-se culpado de uma única acusação de espionagem, sem necessidade de cumprir tempo numa prisão, pois a pena estipulada - 62 meses - foi retirada ao tempo que ele já cumpriu na prisão no Reino Unido. 

Antes deste acordo, Assange enfrentava uma pena máxima de prisão de 175 anos por 17 acusações de violação da Lei de Espionagem e ainda uma acusação relacionada com hackers, nos EUA. O processo foi desencadeado pela divulgação de documentos secretos sobre a guerra no Iraque e Afeganistão, divulgados no site WikiLeaks, criado por Assange.

O acordo foi assinado na ilha Saipan, já que Assange não podia ir ao território continental dos EUA e onde não poderá voltar mesmo depois do acordo. A ilha foi escolhida pela proximidade com Austrália.

Assange foi transferido da prisão de Belmarsh para o aeroporto de Stansted, em Londres, na madrugada de terça-feira, com forte segurança, a viagem foi realizada no jato privado, e já há uma campanha de financiamento coletivo para arrecadar 520 mil dólares (cerca de 486 mil euros) em dívida ao governo australiano pelos voos, até agora já tinha sido arrecadado 330 mil libras (aproximadamente 390 mil euros).

O acordo marca o fim de uma saga legal que se seguiu à divulgação em massa de documentos secretos dos EUA pelo WikiLeaks em 2010, uma das maiores violações de segurança na história militar dos EUA. 

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