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Chinelo de direita ou de esquerda? Como um anúncio das Havaianas está a dividir o Brasil

Fernanda Torres é protagonista de um anúncio que está a gerar críticas entre os "bolsonaristas" e até já há quem peça o boicote à marca.

As divisões políticas do Brasil têm uma nova, e inesperada, cara: a marca de chinelos brasileiros Havaianas. Tudo começou com o mais recente anúncio publicitário da marca em que Fernanda Torres – atriz nomeada para os Óscares – afirma que não quer que os brasileiros entrem em 2025 “com o pé direito”, mas sim “com os dois pés”.  

Fernada Torres em publicidade da Havaianas
Fernada Torres em publicidade da Havaianas Havaianas

“Desculpe, mas eu não quero que você comece 2026 com o pé direito. Não é nada contra a sorte, mas vamos combinar... a sorte não depende de você. O que eu desejo é que você comece o ano novo com os dois pés, os dois pés na estrada, na porta, os dois pés na estrada, os dois pés na jaca, os dois pés onde você quiser. Vai com tudo, de corpo e alma”, afirma a atriz. 

Esta frase foi suficiente para os “bolsonaristas” considerarem que o anúncio era uma crítica à direita política, começando a pedir o cancelamento da marca. As reações foram quase imediatas e surgiram de toda a parte, Eduardo Bolsonaro – filho do ex-presidente brasileiro, condenado a 27 anos e três meses de prisão por tentativa de golpe de Estado – publicou um vídeo nas redes sociais a atirar para o lixo um par de Havaianas: “Eu achava que isto era um símbolo nacional. Enganei-me. Eles escolheram como garota-propaganda da sandália uma pessoa declaradamente de esquerda. E ainda diz para não começar o ano com o pé direito. Isso não foi por acaso. O pé direito e o pé esquerdo estão no lixo”. 

Num país extremamente politizado, outros políticos e influencers juntaram-se ao boicote. O deputado Rodrigo Valadares utilizou as redes sociais para considerar que a “Havaianas escolheu lado. A direita escolhe o boicote”, enquanto o ex-repórter da Globo Thiago Asmar partilhou: “Estou a queimar o pé no asfalto, mas Havaiana nunca mais”. Depois desta publicação o agora influencer já fez várias outras sobre a marca onde refere, por exemplo, que “Havaianas perdeu 200 milhões de reais num dia por causa do boicote da direita! E ainda teve esquerdistas 'debochando' dizendo que o boicote não adiantaria nada!” 

Outras figuras públicas brasileiras anunciaram que passariam a utilizar marcas concorrentes, como as Sandálias Ipanema, ou as Crocs, como protesto. A deputada Bia Kicis partilhou um vídeo onde atirava os chinelos para o lixo e afirmava: “Se as Havaianas não nos querem, nós também não queremos as Havaianas”.  

Não faltou também quem se pronunciasse contra o cancelamento. A cantora Valesca Popozuda utilizou as suas redes sociais para partilhar a sua surpresa. "Com tantos casos de feminicídio e a 'galera' cancelando chinelo, tanta gente descalça na rua e a galera cortando chinelo”. Já vários influenceres têm ironizado a polémica dizendo que se devia cancelar os canhotos ou o coração, por se encontrar no lado esquerdo do corpo; muitos outros têm alertado para o desperdício causado pelo movimento de cancelamento uma vez que Havaianas em bom estado são deitadas para o lixo enquanto poderiam ser doadas.  

Fábio Porchat, humorista membro da Porta dos Fundos, gravou um vídeo na embaixada brasileira em Roma onde interpreta um gestor de crise que liga para a atriz e deixa um recado: “Fernandinha (...) não dá para os enganar, eles são muito inteligentes, eles entendem todas as nossas coisas feitas por baixo das mensagens ocultas”. 

Fernanda Torres ainda não comentou a polémica, mas em 2024, durante a promoção do filme 'Ainda Estou Aqui', a atriz já tinha assumido de forma clara a sua oposição a Jair Bolsonaro.  

Uma marca que começou para os trabalhadores e 'virou' símbolo nacional

A Havaianas foi fundada em 1962 inspirada nas sandálias japonesas zori. No início existia apenas o modelo branco e não possuía um grande atrativo visual. No entanto os chinelos eram vendidos a um valor acessível e passado apenas um ano já eram produzidos mais de 13 mil pares por dia. 

Durante os primeiros trinta anos da marca os principais compradores eram os trabalhadores das classes mais baixas, tanto que as Havaianas eram conhecidas como “chinelo de pobre”, mas em 1991, com o lançamento do modelo Havaianas Sky, as classes mais altas começaram a ser conquistadas. 

Foi depois desse marco que mais modelos, e lojas, começaram a surgir e com o tempo as Havaianas tornaram-se um dos produtos mais usados no quotidiano dos brasileiros e um símbolo do país.  

A marca, que atualmente conta também com acessórios para a praia, sandálias e toalhas, vende mais de 200 milhões de pares de Havaianas por ano e está presente em mais de 100 países.  

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