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Menos países executaram mais 32% de condenados à morte em 2024

Débora Calheiros Lourenço 08 de abril de 2025 às 01:01

Chiara Sangiorgio, especialista em pena de morte da Amnistia Internacional, explicou à SÁBADO as tendências das penas de morte e execuções relatadas em 2024, ano durante o qual o Irão, Iraque e Arábia Saudita foram responsáveis por 91% das execuções globais.

O número de penas de morte executadas globalmente em 2024 aumentou 32%, representando 1.518 pessoas. Ainda assim, o número de países onde a pena de morte foi executada atingiu um mínimo recorde. Estas são algumas das principais conclusões do relatório da Amnistia Internacional sobre as penas de morte e execuções, publicado esta terça-feira, 08.   

Vincent Thian/ AP

2024 foi o ano com mais execuções desde 2015 e este aumento foi justificado essencialmente pelo aumento em três países: Irão, Iraque e Arábia Saudita, responsáveis por 91% das execuções globais.  

Chiara Sangiorgio, especialista em pena de morte da Amnistia Internacional, explica à SÁBADO que este relatório expõe "a continuação de uma tendência, já registada nos últimos anos, que demonstra um isolamento por parte dos países que levam a cabo as execuções": "Estamos a assistir a uma diminuição do número dos países que aplicam a pena de morte, mas ao mesmo tempo vemos uma posição enraizada em países onde existe uma determinação em aplicar a pena de morte, violando também o direito internacional, aconteça o que acontecer".  

No Irão, onde ocorreram 64% de todas as execuções, foram mortas pelo menos 972 pessoas, na Arábia Saudita pelo menos 345, no Iraque pelo menos 63, no Iémen pelo menos 38, na Somália pelo menos 34, nos Estados Unidos 25, no Egito 13, em Singapura 9, no Kuwait 6 e em Omã 3. 

Um número longe do real 

Ainda assim, a Amnistia Internacional alerta que o relatório não inclui as penas aplicadas na China, que é classificada no relatório como "líder mundial nas execuções", nem na Coreia do Norte, Vietname e Afeganistão, uma vez que estes países não tornam públicos os dados sobre a pena de morte - na China e no Vietname são até considerados como segredo de Estado. A dificuldade de apurar o número de penas de morte na China levou a Amnistia Internacional a deixar de publicar o seu valor estimado em 2009 porque as autoridades chinesas "deturpavam os números apresentados". Porém, o movimento considera que "a informação disponível indica que cada ano milhares de pessoas são executadas e sentenciadas à morte". Chiara Sangiorgio considera que o caso da China é especialmente importante e "particularmente difícil" porque "há uma quantidade enorme de execuções que não são relatadas nos meios de comunicação social".

A especialista esclarece que "o Supremo Tribunal Popular da China chegou a publicar todas as suas decisões, mesmo as de execução, durante alguns anos. Mas nos últimos dois anos assistimos a uma espécie de recuo por parte das autoridades, que voltaram a encobrir a pena de morte". Com uma exceção: "Sempre que se quer enviar uma mensagem, as autoridades são muito boas a divulgar todos as informações". "E isso acontece sobretudo no caso dos crimes mais hediondos, que suscitam grande interesse por parte da opinião pública, mas também nos casos de corrupção, quando querem mostrar que não há tolerância com aqueles que tentam tramar o estado". 

Devido à crise no Médio Oriente o relatório também refere que não foi possível verificar se foram feitas execuções na Palestina nem na Síria. No entanto o movimento acredita que "execuções continuam a ocorrer a penas de morte a ser impostas".  

Penas de morte fora da lei internacional  

A Amnistia Internacional alerta para o facto de "a pena de morte continuar a ser uma ferramenta utilizada por vários governos para exercer controlo na população e abafar dissidentes, particularmente utilizada contra defensores dos direitos humanos, manifestantes e oponentes políticos". Exemplo disso é o facto de as autoridades iranianas terem utilizado a pena de morte contra manifestantes que marcaram presença dos protestos Mulher, Vida, Liberdade, que eclodiram no país entre setembro e dezembro de 2022. A Amnistia Internacional refere no relatório que a pena de morte continua a ser utilizada de formas em que não respeita o direito internacional. Durante o ano de 2024 foram verificadas oito execuções públicas, oito menores foram submetidos a penas de morte, assim como pessoas com problemas mentais.

Além disso foi verificado que a pena de morte foi utilizada contra crimes que não incluíram assassinatos voluntários, como é o caso de crimes relacionado com o tráfico de drogas, que atingiu um máximo de 637 execuções e 337 novas penas, crimes económicos, corrupção, ofensas relacionadas com a religião, violação, espionagem e até por relações sexuais foram do casamento por dois adultos com consentimento. As penas de morte são ainda apresentadas como tendo "um impacto desproporcional naqueles que pertencem a uma minoria religiosa ou étnica". 

Chiara Sangiorgio explica que "no Irão, mais de metade das execuções foram levadas a cabo por causa de crimes relacionados com drogas". Também "na China, no Vietname e na Coreia do Norte a criminalidade relacionada com a droga continua a ser amplamente punida".  

Novas condenações à morte 

Foram emitidas 2.087 novas penas de morte, uma diminuição de 14% quando comparado com o relatório do ano passado. Além disso, foram também menos os países que emitiam penas de morte (46, menos seis do que em 2023).   

Ainda assim em alguns países existiram aumentos de sentenças que se tornam preocupantes, na República Democrática do Congo, onde mais do que triplicou, Iraque, Mauritânia, Niger, Tunísia e Iémen.    

Globalmente pelo menos 28 mil pessoas estavam sob sentenças de morte no final de 2024, 42% delas na região Ásia-Pacífico. 
Os dados apresentados pela Amnistia foram "recolhidos de uma variedade de fontes, incluindo: julgamentos, informações de sentenças à morte individuais, familiares e representantes, reportagens e outras associações da sociedade civil".

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