Mas nem só do vestígio luso é feita a história do Brasil: agrilhoados, submissos, os africanos que foram trazidos à força para o Brasil fazem a sua entrada e, à medida que avançam, a floresta veste-se de plantações de cana-de-açúcar, momentaneamente invadidas por orientais.
No coração do Maracanã, ergue-se a cidade, com três grupos deparkour a pular sobre os telhados, ao som de "Construção" de Chico Buarque. Anoitece. É tempo de um voo nocturno sobre o Rio de Janeiro, personificado na musa Gisele Bundchen, a "Garota de Ipanema" que Tom Jobim cantou.
"Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça", deixando um trilho de Óscar Niemeyer, que ecoa nofunk carioca. Hino das favelas, "RAP da Felicidade" sai dos pés de um garoto que só quer ser feliz e que é a batuta de uma evocação das danças de rua e da nova música brasileira, apresentada ao género de disputa.
Entre fogos de artificio e 'seres' estranhos, instalados numa gigantesca pista de dança, a actriz Regina Casé, uma das mais acarinhadas do país, convida todo o estádio a celebrar as diferenças, numa coreografia que une os 1.500 bailarinos às bancadas, que cantam a plenos pulmões "Moro num país tropical/ Abençoado por Deus".
Terminado o apoteótico baile, um miúdo perde-se num labirinto de espelhos, que revela os desastrosos efeitos das alterações climáticas. Só uma flor, perdida e solitária, o salva. Ao tocá-la, anuncia que cada um dos atletas presentes no Rio2016 plantará uma árvore, que permanecerá como o seu legado para o Rio de Janeiro.
São eles, os atletas, o epicentro dos Jogos Olímpicos, pelo que a maior ovação é sua. A Grécia, pátria-mãe da competição, inicia o desfile das nações, com a equipa de refugiados olímpica, os países vizinhos/latinos, o colosso Estados Unidos, a Itália e o Japão, com grandes comunidades no país, a Palestina, o país-irmão Portugal, e, obviamente, o Brasil, último a entrar no Maracanã, a serem os mais aplaudidos - só a Argentina e a Síria tiveram direito a assobios.
Reunidos os atletas, o símbolo do COI brotou de árvores e os anéis olímpicos iluminaram o céu. "O melhor lugar do mundo é aqui e agora", mesmo que os momentos institucionais tenham arrefecido a festa.
O mítico estádio despertou da curta 'sesta' para acolher os heróis que transportavam a bandeira olímpica, com a futebolista Marta e o basquetebolista Óscar Schmidt a levantarem as bancadas, que começaram a entoar 'Guga', antes de sambarem ao som de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Anitta, que cantaram "Sandália de Prata", num sambódromo improvisado.
E aí, a correr com o seu tradicional sorriso, apareceu Gustavo Kuerten. Mas, ao contrário do que todos os rumores apontavam, o antigo número um do ténis passou a tocha à basquetebolista Hortência, que a transferiu para as mãos de Vanderlei Cordeiro de Lima.
Único desportista latino-americano distinguido com a Medalha Pierre de Coubertin, o antigo maratonista viu a vida retribuir-lhe o ouro que perdeu ao ser empurrado por um espectador em Atenas2004, ao protagonizar o momento mais emocionante da cerimónia de abertura.