Nuno Rebelo de Sousa foi ouvido esta quarta-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), no âmbito do caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com Zolgensma, um medicamento de €2 milhões. Logo no arranque da audição, onde esteve presente por videochamada, o filho do Presidente da República invocou a condição de arguido e remeteu-se ao silêncio.
"Conforme informei previamente, através dos meus advogados, seguirei, nesta audição, o seu conselho. Conselho esse que vai no sentido de não responder a perguntas nesta Comissão", afirmou Nuno Rebelo de Sousa na declaração inicial na CPI.
"O meu silêncio nesta Comissão é, pois, integral, porque é esse o conselho profissional que recebi, e que sigo. Dito isto, caso pretenda esta Comissão levar a cabo os turnos e as rondas de perguntas dos Ex.mos Senhores Deputados dos Partidos com assento nesta Comissão, informo desde já, com a mesma transparência com que sempre respondi às comunicações desta Comissão, desde a primeira convocatória, e em coerência com o que acabo de dizer, que a minha resposta a cada uma das perguntas será a seguinte, seguindo, uma vez mais, a formulação que me foi aconselhada pelos meus advogados: 'Pelas razões referidas, não respondo'".
“Fomos ao encontro de Lacerda Sales para falar do Conahp. Não tratámos de outros assuntos”
Pela Iniciativa Liberal, a deputada Joana Carneiro questionou Nuno Rebelo de Sousa sobre qual a "ajuda maior" que esperava obter por parte da Presidência da República. Depois de receber a resposta "tipo", afirmou que a
mãe das gémeas "não se escondeu", ao contrário de Nuno Rebelo de Sousa e
António Lacerda Sales. "Isto é cobardia", acusou a liberal.
A deputada Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda, acusou Nuno Rebelo de Sousa de mentir por afirmar que sempre contactou a Presidência da República pelas vias formais, lembrando que enviou um mail para o endereço pessoal do pai. "Pelas razões referidas, não respondo."
O deputado comunista Alfredo Maia não fez perguntas sobre o caso concreto por sentir que não faz sentido fazer perguntas que ficarão sem resposta. Questionou-o então sobre o preço dos medicamentos usados para tratar as meninas. A testemunha recusou-se a responder. Pelo Livre, Paulo Muacho não apresentou qualquer pergunta.
O deputado João Almeida, do CDS, pediu que Rebelo de Sousa se identificasse. "Sou português. Resido no Brasil há 15 anos, agora. Em São Paulo. Atualmente sou diretor da EDP Brasil, empresa para a qual trabalho desde 2011 no Brasil." Pediu depois para que o economista identificasse o seu grau de relação com vários intervenientes do caso, tendo Nuno Rebelo de Sousa recusado-se a identificar essas mesmas relações. O centrista acusou-o de incorrer em desobediência. "Pelas razões referidas, não respondo."
O deputado do PSD, António Rodrigues, à semelhança do que aconteceu com o PCP e o Livre, também se recusou a continuar a colocar qualquer questão. Referiu apenas que "estamos quase no domínio da comédia" e que esta é uma "história de ficção".
Já o deputado do PS, João Paulo Correia, sublinhou que o filho do Presidente da República teria muito mais a ganhar se "esclarecesse as questões", uma vez que reconhece haver algumas "contradições insanáveis". Achou, então por bem, perguntar se recebeu algum pagamento por ter "atuado no papel de facilitador de negócios" e se "tem mantido conversações com os advogados dos pais das crianças nos últimos dias". A resposta foi a mesma: "Pelas razões referidas, não respondo". O líder do Chega, André Ventura, que leu várias trocas de e-mails, tentou também arrancar algumas palavras, ao questionar Nuno Rebelo de Sousa sobre o "impacto que isto pode ter para o Presidente da República" e se "tem consciência que a sua atitude criou um enorme problema na imagem de Portugal", mas nem assim houve qualquer resposta.
Os advogados e Nuno Rebelo de Sousa já haviam informado previamente, através de uma carta entregue à Comissão de Inquérito, que o empresário iria "usar do seu direito ao silêncio e (...) fazê-lo na íntegra".
"Não pretenderá o senhor dr. Nuno Rebelo de Sousa prestar qualquer depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito em causa ou fornecer qualquer esclarecimento ou ponderar fornecer qualquer documento. Aliás, não apenas perante a CPI, mas perante qualquer outra entidade que não a entidade
dominus do inquérito criminal que, como é público, o Ministério Público está a conduzir", lê-se na carta assinada pelo seu advogado, Rui Patrício.
Inicialmente, também Nuno Rebelo de Sousa, que se encontra a viver no Brasil, já se havia mostrado indisponível para prestar esclarecimentos sobre o caso das crianças, que foram tratadas em 2020 no Hospital de Santa Maria para a atrofia muscular espinal. Justificou na altura ter "várias obrigações profissionais e familiares no país da sua residência".
Nuno Rebelo de Sousa
foi constituído arguido no caso das gémeas pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa. Suspeita-se que tenha interferido para que as crianças recebessem este tratamento em Portugal.
A Comissão Parlamentar de Inquérito desta quarta-feira arrancou com a votação para as audições de Augusto Santos Silva e de Francisca Van Dunem - ambas a serem aprovadas. Também a nora de Marcelo Rebelo de Sousa será ouvida. Além disso, foi também votado se o Chega deveria iniciar novamente a audição na comissão, mas acabou por ser a IL a começar as perguntas.