Sábado – Pense por si

Abusos no direito à amamentação? Ministra do Trabalho "não percebe nada"

Maria do Rosário Ramalho disse numa entrevista que havia mães que amamentam até à entrada dos filhos na escola primária só para terem um horário de trabalho reduzido. À SÁBADO, uma associação diz que é normal haver este tipo de casos, embora não seja "tão comum".

A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social denunciou, no domingo em entrevista ao Jornal de Notícias (JN) e à TSF, a existência de abusos no direito à amamentação. Segundo Maria do Rosário Ramalho, há mães a amamentar até à entrada dos filhos na escola primária, ou seja até aos seis anos, só para terem um horário de trabalho reduzido.

Amamentação não tem prazo, basta que a mãe entregue atestado depois dos 2 anos de idade dos filhos
Amamentação não tem prazo, basta que a mãe entregue atestado depois dos 2 anos de idade dos filhos Getty Images

"Infelizmente, temos conhecimento de muitas práticas em que, de facto, as crianças parece que continuam a ser amamentadas para dar à trabalhadora um horário reduzido, que é duas horas por dia que o empregador paga, até andarem na escola primária", denunciou.

SÁBADO questionou a tutela para perceber quantos casos destes é que o Governo tem conhecimento, mas até à data de publicação deste artigo não obteve qualquer resposta. Não obstante, a Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto classificou estas declarações como "lamentáveis".

"Estas declarações são, de facto, lamentáveis e foram claramente feitas por alguém que não percebe nada de amamentação", disse à SÁBADO a fundadora desta associação. Segundo Sara do Vale, é normal que as mães amamentem os filhos até esta idade, embora não seja "tão comum" e as "taxas de amamentação não se comparem às dos países nórdicos".

"A Organização Mundial da Saúde (OMS) diz que o filho deve ser idealmente amamentado durante os primeiros seis meses de vida e depois disso complementa-se como as mães quiserem", lembra.

A amamentação não só é recomendada pela OMS por ajudar no desenvolvimento da criança, como também está já comprovado que pode trazer benefícios para a saúde da mãe. No entanto, com a alteração da lei laboral proposta pelo executivo de Luís Montenegro, as mães passariam a poder amamentar os seus filhos apenas até aos 2 anos de idade, sendo que neste período seria necessária também a apresentação de atestados médicos de seis em seis meses.

"Parar de amamentar aos dois anos é estar a definir uma deadline (prazo) perigosa. A amamentação traz vantagens para a mulher: reduz o risco de cancro da mama e de cancro do ovário", recordou Sara do Vale.

As declarações da ministra surgem na Semana Mundial do Aleitamento Materno e pouco tempo depois de o Governo ter proposto uma alteração à lei laboral, que segundo alguns especialistas irá prejudicar as famílias. Para a fundadora da Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, esta medida não traz nada de "revelante para a economia". Além disso, prevê-se que a mesma leve a "baixas taxas de natalidade".

"É uma medida que convém ao patronato mas muito pouco às famílias. Vai claramente afetar a sociedade mais vulnerável a nível económico, como é o caso das mães solteiras e vai empobrecer as famílias", queixa-se.

Se hoje só é necessário um atestado médico para amamentação após o primeiro ano de vida do bebé, com as alterações propostas este passaria a ser necessário logo no início do processo de amamentação. Para Sara do Vale, trata-se de uma exigência preocupante.

"Preocupa-me a medida de obrigatoriedade de um atestado médico desde o início da amamentação. Onde é que os pais vão conseguir um atestado se nem uma consulta para o acompanhamento do estado de saúde do bebé conseguem obter?"

A mesma crítica é feita pela Ordem dos Médicos que alerta para um retrocesso legal que privilegia a produtividade e promove stresse desnecessário às mães.

Sara do Vale espera agora que esta medida "não tenha pernas para andar". Entretanto, já foi lançada uma petição que recolheu um total de 22 mil assinaturas e para dia 16 de setembro está prevista uma manifestação em Lisboa. Para o mesmo mês está previsto que a associação se reúna com todos os grupos parlamentares. Atendendo às reações de PS e Chega, a proposta deverá ser chumbada no Parlamento.

Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!

Férias no Alentejo

Trazemos-lhe um guia para aproveitar o melhor do Alentejo litoral. E ainda: um negócio fraudulento com vistos gold que envolveu 10 milhões de euros e uma entrevista ao filósofo José Gil.

Cuidados intensivos

Loucuras de Verão

Até porque os primeiros impulsos enganam. Que o diga o New York Times, obrigado a fazer uma correcção à foto de uma criança subnutrida nos braços da sua mãe. O nome é Mohammed Zakaria al-Mutawaq e, segundo a errata do jornal, nasceu com problemas neurológicos e musculares.