Ana Gomes e a detenção de Vieira: "Procissão ainda vai no adro"
Antiga eurodeputada fala num "polvo gigantesco" que "tinha a cabeça no BES" e diz não ter dúvidas de que "grandes clubes que são objeto de infiltração destas redes mafiosas".
Ana Gomes, antiga eurodeputada e ex-candidata à Presidência da República, admitiu no habitual comentário semanal que faz na SIC Notícias não ter ficado surpreendida com a detenção de Luís Filipe Vieira. Fala num "polvo", que "tinha a cabeça no BES", e explica que as revelações do Football Leaks e de Rui Pinto terão sido importantes para este caso. Ana Gomes não tem dúvidas de que "grandes clubes que são objeto de infiltração destas redes mafiosas".
"Acho que já tardava [a detenção]. Para mim isto não foi sobre futebol, ainda que também tenha a ver com a sanidade do futebol. Todos sabemos como o futebol, tanto ao nível nacional como internacional, tem sido permeável à manipulação dos próprios resultados e à instrumentalização para outros efeitos. Mas são esses outros efeitos que sempre me preocuparam no nosso país: a captura do Estado e de instituições do Estado. Não é por acaso que a direção deste clube, este indivíduo e outros da teia a que ele está ligado, sempre se preocuparam em rodear-se de advogados, financeiros, políticos e até juizes. Havia listas de magistrados que recebiam bilhetes para jogos para o Benfica. E não eram pelos seus lindos olhos", explicou Ana Gomes.
"Este caso tem por trás um polvo gigantesco, mas que não envolve apenas este clube em particular. Este presidente foi à comissão de inquérito do parlamento dizer que estava ali por ser presidente do Benfica e os deputados disseram-lhe, e bem, 'não o senhor está aqui por ser um grande devedor à banca'. Este polvo tinha a cabeça no BES, em Ricardo Salgado e nos seus acólitos", prosseguiu.
Ana Gomes fala numa "teia". "Isto importa pelas suas implicações do futebol mas também ao nível das instituições do Estado, porque era uma teia de captura de instituições do Estado. Neste caso concreto o presidente do Benfica tinha um historial, tentou sempre negá-lo. Aliás, chegou a ameaçar-me com um processo, nunca chegou a pô-lo, claro, porque eu estava a dizer a verdade. Em 1993 ele foi condenado pelo roubo de um camião, em coautoria com outras pessoas, uma coisa que tinha acontecido em 1984. A justiça tinha de saber isto. Já pelo BPN foi arguido por causa de 23 milhões de dívida, depois há todos aqueles casos, 'Porta 18', os Emails, os Vouchers, o E-Toupeira, a Operação Lex... Tudo relacionado em última análise como BES. No parlamento ele confessou que era testa de ferro de Ricardo Salgado! E nem falo dos adeptos do clube porque o clube acabou por ser uma vítima. Como é que tanta gente tolerou isto? Designadamente na política, tivemos aquela cena tristíssima de termos o primeiro ministro, António Costa, a prestar-se a ser membro da comissão de honra deste presidente deste clube e depois até ser removido face à polémica que se gerou na opinião publica pelo próprio..."
A antiga eurodeputada acredita que as revelações do Football Leaks foram importantes para este caso. "São os grandes clubes e os grandes partidos que são objeto de infiltração destas redes mafiosas. Metem pequenos clubes ao barulho, para serem ecrãs de esquemas de lavagem de dinheiro, burlas, etc. Neste caso parece-me que as implicações estão para além dos personagens ligados ao clube e espero que a justiça faça o seu trabalho. Estou farta de ver prisões espectaculares, mas também libertações espectaculares, como aconteceu esta semana com Joe Berardo, em que nem sequer a prisão preventiva foi pedida. Espero, e nunca quis outra coisa, que a justiça seja feita. Não tenho dúvida nenhuma que foram muito importantes aqui as revelações do Football Leaks, feitas pelo Rui Pinto. E acho que a procissão ainda vai no adro..."
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