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Como é que a Ucrânia e Israel condenaram Assad na Síria?

Leonor Riso 08 de dezembro de 2024 às 12:15

Falta de apoio dos seus principais aliados levou à queda de um regime de 24 anos. Presidente sírio Bashar al-Assad fugiu para Moscovo.

Há dez anos, no pico da guerra civil que dura há quase 14 anos na Síria, Bashar al-Assad estava em sérios apuros: as forças rebeldes tinham tomado o controlo de Aleppo e aproximavam-se de Damasco. Nessa altura, recorda a Associated Press, foi salvo pela Rússia e pelo Irão, a par do Hezbollah. O presidente sírio recuperou Aleppo e a guerra virou a seu favor.

REUTERS/Firas Makdesi

Nos últimos quatro anos, as linhas ofensivas pouco se alteraram, graças à proteção russa, iraniana e do Hezbollah, enquanto a Turquia continuava a proteger as forças rebeldes ao regime que dominam parte do norte do país, e os EUA mantinham forças no este e nordeste da Síria. Tudo mudou a 27 de novembro, quando Aleppo foi de novo tomada pelos rebeldes. Esta manhã, Bashar al-Assad fugiu rumo à Rússia, onde lhe foi concedido asilo político. As verdadeiras mudanças começaram em 2022, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, e em 2023, quando o Hamas atacou Israel. Porquê? 

Moscovo entrou em guerra com a Ucrânia em fevereiro de 2022, virando as atenções para outro conflito. Desde o avanço dos rebeldes na Síria esta semana, levou a cabo ataques ocasionais, mas não conseguiu dar uma resposta suficientemente forte. A Síria era importante para Moscovo controlar a influência norte-americana na região: há várias bases militares navais e aéreas russas no território. Fonte do governo russo garantiu este domingo não existirem ameaças graves à segurança destas bases, que está a tomar todas as medidas para assegurar a segurança dos russos no país e que está em contacto com todos os grupos da oposição a Assad. Pediu ainda uma transição pacífica.

A Rússia diz-se agora disposta a apoiar a Síria, mas só em certas circunstâncias: "Se o povo da Síria continuar a precisar do nosso apoio, será dado. Mas dificilmente no no contexto de uma guerra civil de grande escala. Os sírios terão que lidar com isso sozinhos", afirmou o vice-presidente do Conselho da Federação Russa, Konstantin Kosachyov.

Irão e Hezbollah ficaram debilitados com ataques israelitas

Ao Irão, a Síria interessa pela ligação ao Mediterrâneo e pelos abastecimentos militares ao Líbano, onde está a milícia Hezbollah. O líder desta última prometeu apoio à Síria, mas não mencionou o envio de combatentes.

O Irão envia armas ao Hezbollah através do Iraque e da Síria. Em troca, Irão e Hezbollah enviaram combatentes para Assad.

Mas já na sexta-feira, 6, o Irão começou a retirar comandantes e soldados da Síria.

A Síria é uma parte importante do "eixo da resistência" constituído pelo Hezbollah, pelo Hamas e pelos Hutis no Iémen, cujo objetivo é destruir Israel e reduzir o poder dos EUA no Médio Oriente. Contudo, desde os ataques de 7 de Outubro de 2023 que Israel tem atingido as lideranças não só do Hamas mas também do Hezbollah, o que impede o apoio deste último à Síria.

"O assalto rebelde sublinha a natureza precária do controlo do regime na Síria", explicou Mona Yacoubian, analista do Instituto para a Paz dos EUA, à Associated Press. "A sua erupção súbita e a velocidade com que os grupos rebeldes conseguiram dominar Aleppo… expõe as dinâmicas complexas que residem abaixo da superfície na Síria e que podem transformar calma superficial num grande conflito."

Aron Lund, especialista na Síria ouvido pela AP, confirma que a situação é um desastre para a Rússia e para o Irão. "Ficaram certamente surpreendidos com o que aconteceu e têm todo o tipo de constrangimentos de recursos", como a guerra na Ucrânia e as perdas do Hezbollah no Líbano.

Exército da Síria sem recursos

Há quase 14 anos que os sírios vivem em guerra civil, desde o levantamento de 2011 que não conduziu à queda de Assad. Mais de meio milhão de pessoas morreu e milhões fugiram das suas casas.

Desde 2020 que as linhas do conflito pareciam paralisadas, mas a crise económica nunca cessou. A imposição de sanções pelos EUA, a crise bancária no vizinho Líbano e até um terramoto em 2023, além do conflito, são razões dadas pela Associated Press para as dificuldades económicas graves que afetam quase todos os sírios.

Isso enfraquece as instituições e os salários - soldados incluídos. "Se não se consegue pagar aos soldados um salário, então não se pode esperar que eles fiquem e lutem quando milhares de jihadistas entram nas cidades", frisa Aron Lund. "É um regime exausto, quebrado e disfuncional."

Vitória da Turquia?

Ancara surge como uma "vencedora" nesta situação, ao ver os grupos rebeldes que apoia a conseguir retirar Assad do poder. Já controlava uma zona ao longo da fronteira norte da Síria.

Apoia facções do conflito como o Exército Nacional Sírio, uma coligação de grupos rebeldes armados, e terá dado aprovação à ofensiva lançada pelo grupo fundamentalista islâmico Hayat Tahrir al-Sham (HTS). 

Do lado dos EUA, o presidente-eleito também se manifestou sobre a queda do regime. "Assad desapareceu. Ele fugiu do seu país. A sua protetora, Rússia, Rússia, Rússia, liderada por Putin, já não estava interessada em protegê-lo", escreveu no Truth Social. "Não há razão para a Rússia ter lá estado em primeiro lugar. Perderam todo o interesse na Síria por causa da Ucrânia... uma guerra que nunca devia ter começado, e pode prolongar-se para sempre."

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