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Medicamentos para emagrecer devem ser comparticipados? “É essencial”

Diogo Barreto 16 de novembro de 2025 às 08:00

A comparticipação destes remédios pode ter um custo de €600 milhões por ano. Mas especialistas apontam para os benefícios.

Os medicamentos para emagrecimento,, estão já nas farmácias nacionais, mas sem comparticipação para esse fim, por isso, quem adquirir este medicamento injetável terá de gastar cerca de 244 euros por mês. Mas a aprovação do Programa Nacional de Prevenção e Gestão de Obesidade, que prevê a implementação do Percurso de Cuidados Integrados para a Pessoa com Obesidade no Serviço Nacional de Saúde (SNS), pode levar a que estes medicamentos possam ser comparticipados. O Infarmed tem agora 30 dias para apresentar ao Governo a sua avaliação dos medicamentos a comparticipar e em que percentagem.
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Segundo um estudo preliminar do Infarmed, citado pelo jornal , calcula-se que a comparticipação de medicamentos para obesos em estado grave (grau II e III) custaria 600 milhões de euros num ano, tendo por base uma comparticipação no escalão máximo a 90%. “É muito dinheiro para um País como Portugal”, sublinha Carla Pedrosa que não deixa de elencar que o tratamento da obesidade pode ajudar a reduzir várias comorbidades e melhorar o estilo de vida de milhares de pessoas.

1Como funcionam estes medicamentos?

O endocrinologista João Sérgio Neves ressalva que os medicamentos para o emagrecimento não funcionam todos da mesma maneira e apesar “dos mecanismos de ação serem variados”, a maior parte deles funciona através da redução do apetite e o aumento da saciedade, o que leva à perda de peso. O docente e investigador na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto explica ainda que nos medicamentos que “atuam via ativação do recetor do GLP-1 (liraglutido, semaglutido e tirzeaptida)”, os principais efeitos sentidos por quem os toma são a diminuição da ingestão calórica (devido ao sentimento de satisfação), a melhoria da sensibilidade à insulina e uma melhoria de vários parâmetros relacionados com o metabolismo e sistema cardiovascular como pressão arterial, glicemia, colesterol e triglicéridos. Os dois medicamentos mais conhecidos - o Ozempic (apesar de ser receitado para tratamento de diabetes, é muitas vezes utilizado por quem quer emagrecer) ou o Wegovy - são fármacos da Novo Nordisk, empresa dinamarquesa, e são administrados através de uma caneta injetável e que, segundo os cientistas, têm resultados quase imediatos. O medicamento funciona mimetizando os efeitos da incretina, hormona responsável por regular o apetite e a ingestão de alimentos. De acordo com o Instituto Nacional para os Cuidados com a Saúde britânico (Nice, no original), pacientes a quem seja recomendado o tratamento com Wegovy podem perder até 10% do peso em dois anos.

2São seguros?

O endocrinologista João Sérgio Neves explica que estes fármacos são bastante seguros e os seus efeitos benéficos para a saúde. A sua utilização está associada a redução do risco de desenvolvimento de diabetes, de enfarte do miocárdio, de AVC e de insuficiência cardíaca, explica o especialista. No entanto, como em todos os medicamentos, , como problemas  gastrointestinais como náusea, vómitos, diarreia ou obstipação.

3Basta tomá-los para emagrecer?

A resposta simples é "sim". Atuando diretamente no apetite do utente, estes fármacos não precisam (na grande maioria dos casos) de outro tipo de complemento para ajudar quem os toma a perder peso. No entanto, todos os especialistas avisam que a toma isolada não tem um efeito milagroso. Carla Pedrosa, vice-presidente da Ordem dos Nutricionistas, explica que em muitos casos, os utentes que emagreceram voltam a ganhar peso depois de deixarem de tomar os medicamentos. “E se não tiver havido uma alteração de comportamentos a nível de atividade e alimentação, há uma séria possibilidade de recuperarem o peso que haviam perdido”, acrescenta. “Os medicamentos para o tratamento da obesidade devem ser sempre integrados numa abordagem que permita o atingimento de estilos de vida saudáveis, onde se integra uma alimentação equilibrada e a prática de exercício físico”, diz João Sérgio Neves, acrescentando: “Mais do que medicamentos de emagrecimento, estes medicamentos devem ser vistos como ferramentas de tratamento da obesidade, com o grande objetivo de reduzir o risco de complicações da obesidade”. Ambos os especialistas ressalvam a necessidade de acompanhamento do processo de emagrecimento tanto a nível de alteração de hábitos de vida como de toma de medicamentos.  

4São uma solução a longo prazo?

“Os medicamentos para o tratamento da obesidade devem ser vistos como terapêuticas de longo prazo, nunca devendo ser vistos como uma solução rápida para uma doença complexa como é a obesidade”, começa por ressalvar o endocrinologista. Porque medicamentos como o Wegovy e só funcionam durante o seu período de utilização, à semelhança do que acontece com medicamentos para outras doenças crónicas como a diabetes ou a hipertensão. “E é exatamente por isso que há quem defenda a sua utilização de forma crónica e não apenas até atingir um determinado objetivo”, explica Carla Pedrosa.

5Devem ser comparticipados?

O Infarmed calcula que a comparticipação de medicamentos para obesos em estado grave (grau II e III) , tendo por base uma comparticipação no escalão máximo a 90%. “É muito dinheiro para um País como Portugal”, sublinha Carla Pedrosa que não deixa de elencar que o tratamento da obesidade pode ajudar a reduzir comorbidades.  “A obesidade afeta múltiplos órgãos e sistemas e está relacionada com mais de 200 complicações, incluindo diversos tipos de cancro, doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2”, recorda João Sérgio Neves. O endocrinologista lembra ainda que esta doença afeta de forma desproporcional “os grupos socioeconómicos mais desfavorecidos, que têm menor acesso a cuidados de saúde, alimentação saudável e oportunidades de prática física”, além de ter um fator visual que pode sujeitar os pacientes a um estigma. “Neste contexto, a comparticipação é essencial para garantir equidade. Sem ela, corre-se o risco de criar uma barreira económica que deixaria o tratamento acessível apenas a quem tem capacidade financeira, aumentando a desigualdade no combate a uma doença crónica com profundo impacto na saúde e qualidade de vida”, defende o médico. "Há muito a ideia da pílula milagrosa e isso é errado. Um doente que faça a cirurgia sem fazer mudança de hábitos alimentares, pode facilmente voltar aos pesos antigos. O doente tem de perceber que tem de mudar hábitos e o mesmo acontece com estes medicamentos. A questão da correção de hábitos alimentares deve ser a base, juntamente com exercício, e complementada com o fármaco. Estas vias vêm revolucionar o tratamento, mas o medicamento não faz magia e não atua sozinho", conclui Carla Pedrosa.
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