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Mistério dos 'hobbits' das Flores mais perto de ser desvendado

Ana Bela Ferreira
Ana Bela Ferreira 07 de agosto de 2024 às 07:00
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Descoberta dos ossos já encontrados pode ajudar a perceber quem são estes humanos de baixa estatura que podem ter encolhido depois de chegar à ilha do Pacífico, há cerca de um milhão de anos.

Há pouco mais de um milhão de anos, algunsHomo erectusque já tinham colonizado a ilha de Java, na Indonésia, continuaram a sua viagem para este e acabaram por chegar à ilha Flores. Aí se mantiveram isolados e, por um fenómeno evolutivo que pode acontecer nas ilhas, começaram a encolher. Cerca de 300 mil anos depois, os habitantes da ilha que chegaram lá com uma estatura semelhante à dos humanos atuais, não mediam mais de um metro e tinham cérebros mais pequenos, mas mantiveram a capacidade de fazer ferramentas. Esta é uma das teorias para a descoberta dos ossos mais pequenos já encontrados, que pertencem aos Homo floresiensis, conhecidos comohobbits. Os primeiros fósseis foram descobertos nas Flores em 2004.

Yousuke Kaifu

Agora um novo estudo, publicado na terça-feira na Nature Communications, que analisou fósseis de dentes e osso do braço com 700 mil anos, sugere que os Homo floresiensis podem ter sido mais pequenos do que se pensava. Já sobre a forma como esta espécie evoluiu parece haver ainda alguma divisão entre os cientistas.

Os hobbits foram descobertos há 20 anos dentro da gruta Liang Bua na ilha indonésia das Flores. Cientistas australianos e indonésios escavaram ossos e dentes, juntamente com objetos em pedra, que provavelmente serviram para cortar carne.

Com base nos ossos encontrados, os cientistas estimaram que estes humanos teriam cerca de 1,06 metros de altura. Mas mais surpreendente do que a sua estatura foi a descoberta de que os seus cérebros eram muito pequenos - cerca de um terço do cérebro moderno.

A comunidade científica debateu-se para encaixar o Homo floresiensis na família dos humanos e dos seus parentes extintos. Os hominídeos mais antigos eram de facto pequenos e com um cérebro pequeno, mas há cerca de dois milhões de anos que eles tinham sido substituídos pelos hominídeos mais altos e com cérebros maiores. E as análises ao chão da gruta colocavam estes ossos algures no período de há 100 mil ou 60 mil anos.

Alguns cientistas sugeriam que estes ossos pudessem ter pertencido a humanos com problemas de desenvolvimento. Mas esta hipótese era rebatida por outros especialistas porque a anatomia de humanos com essas patologias não se assemelha em nada aos fósseis encontrados. Até que em 2016, os cientistas foram surpreendidos com a descoberta de um conjunto de fósseis bem mais antigos numa outra área das Flores, conhecida por Mata Menge. Os fósseis com 700 mil anos consistiam em seis dentes e uma parte do maxilar. Estes fósseis eram tão ou mais pequenos do que os descobertos em Liang Bua.

Esta terça-feira, a equipa que estuda os fósseis de Mata Menge revelou mais dois dentes e um pedaço de úmero (o osso superior do braço). "Não sabíamos dizer se pertencia a uma criança ou adulto. Essa era a questão-chave", admitiu o paleoantropólogo da Universidade de Tóquio, Yousuke Kaifu, ao jornal The New York Times.

Depois de comparar o osso a úmeros atuais de crianças e adultos, a equipa percebeu que o fóssil tinha sinais de ter deixado de crescer, sugerindo tratar-se de um adulto. A descoberta foi chocante porque se trata do úmero mais pequeno já descoberto de um hominídeo adulto. Segundo Kaifu e a sua equipa, o dono do braço não teria mais de um metro de altura.

Para Yousuke Kaifu terá sido a falta de comida na ilha que levou esta espécie a tornar-se mais pequena, já que neste local em particular não corriam maior risco de serem mortos pelos predadores por serem pequenos. "Numa ilha isolada não há lá tigres nem leões, não precisamos de ser grandes", defendeu.

A parte mais inusitada para o professor de Tóquio, no entanto, foi o tamanho do cérebro destes humanos que mantiveram capacidade para fazer ferramentas. "Isso foi bastante surpreendente para mim", assumiu, acrescentando: "Pensamos que tornar-se inteligente e ter cérebros maiores era o destino dos humanos. Mas os floresiensis dizem-nos que não é necessariamente assim".

Porém, nem todos os cientistas acreditam que estes hominídeos evoluíram do Homo erectus. Deborah Argue, paleoantropóloga da Universidade Nacional Australiana, que não participou neste estudo, contesta esta hipótese. "Não podemos assumir que esta espécie chegou às Flores", referiu ao New York Times. Tal como Matthew Tocheri, também paleoantropólogo mas na Universidade Lakehead no Canadá. "As provas para essa ideia são muito fracas."

Para estes dois cientistas até aparecerem mais provas, todas as hipóteses estão em aberto. Até que estes hobbits tenham descendência de hominídeos de África que eram já mais pequenos quando chegaram à Ásia.

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