Estudos e especialistas indicam que ao longo do tempo, as crianças têm vindo a perder capacidades motoras básicas, resultante dos ecrãs mas também das sociedades superprotetoras.
Brincar, saltar, correr, trepar árvores, cair e fazer uma nódoa negra ou esfolar o joelho, pode não parecer, mas são atividades que desenvolvem não só as competências motoras das crianças, mas também as competências cognitivas. Quem o diz é Rita Cordovil, professora na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa e especialista na mesma área, que alerta para o impacto de estas serem atividades cada vez menos comuns em idades precoces.
Liz Hafalia/AP
Um inquérito realizado nos Estados Unidos e publicado na EducationWeek, e referência num artigo recente da National Geographic, relata que cada vez mais as crianças têm vindo a ter dificuldades no que toca ao desenvolvimento de capacidades motoras básicas como utilizar tesouras, lápis, capacidades sociais e emocionais, seguir instruções e partilhar.
A maioria dos educadores de infância norte-americanos revelam que em relação há cinco anos, as crianças que entraram no novo ano escolar de 2024/2025 têm mais dificuldade em desenvolver capacidades como ouvir e seguir instruções, utilizar tesouras, lápis e canetas, assim como no ato da partilha e dar a vez a outro colega.
Rita Cordovil explica à SÁBADO que existem uma "série de problemas relacionados com as oportunidades que estamos a dar às crianças para se desenvolverem" e que contribuem para esta regressão "geracional". Desde a "sociedade em que vivemos", à forma como as famílias são formadas, e a "falta de oportunidades (das crianças) brincarem no mundo físico, de se magoarem, de aprenderem com os erros, de brincarem com os amigos".
Apesar de a especialista estar mais envolvida no estudo da motricidade geral nas crianças, como correr, saltar, brincar, e não na motricidade fina, como a utilização de tesouras ou canetas, repara que são capacidades que, tal como nos estudos, se têm vindo a desenvolver mais tarde.
Ainda, o relatório School Readiness(Preparação Escolar) da Kindred, que tem em conta o ponto de vista dos pais e dos professores e mede a preparação das crianças na entrada para o 1.º ciclo, apresenta alguns resultados que Rita Cordovil considera "preocupantes". Nomeadamente que 25% das crianças não estão treinadas para utilizar a casa de banho, uma competência que devia ser adquirida "aos 2 ou 3 anos de idade", representando uma "falta de autonomia crescente de geração para geração". Mais "estranho" ainda é que um quarto dos pais achem normal isto acontecer. Apenas 44% dos pais acham que as crianças devem saber manusear um livro antes de entrar na escola, quando ambos os estudos observaram que as crianças tentam folhear os livros como se fossem tablets, a arrastarem o dedo para a direita, esperando que a página mude.
No entanto, há quem desdramatize. Para o neuropediatra Nuno Lobo Antunes, não se trata de uma perda destas competências, "quanto muito" de "adquiri-las mais tardiamente". Ressalvando que a maioria das crianças portuguesas "frequentam infantários com estimulação necessária ao seu desenvolvimento", e onde os educadores têm "experiência suficiente para detetar anomalias no percurso ou desenvolvimento", assim como os pais que têm mais filhos.
A questão desse retrocesso é multidimensional, Rita Cordovil responsabiliza não só os pais mas "toda a sociedade". Uma sociedade do Sul da Europa "superprotetora" com "aversão ao risco" e que não valoriza tanto o "brincar com risco", que é mais normalizado a Norte e ajuda no desenvolvimento motor. Desde a cidade "que tem de estar preparada para dar autonomia" às crianças, à escola "que deve estar virada para a promoção da competência motora" e não da excessiva promoção das competências cognitivas. "Quando se brinca ou se arrisca, não se está só a desenvolver a nível motor", explica, está-se a ganhar "autoconfiança e capacidades cognitivas, principalmente nos primeiros anos", rejeitando que as competências cognitivas sejam apenas fomentadas numa sala de aula.
Também Joana Rato, especialista em neuropsicologia, citando estudos internacionais, acredita que hoje em dia "há uma diminuição do tempo fora, tempo de rua, que claramente permitia que as crianças se movimentassem mais, além de socializar", resultante da "falta de estímulos" que contribuem para este retrocesso. Joana Rato aponta ainda que existem diferenças entre o meio urbano e rural no que toca ao tempo que é passado fora de casa, "se calhar se falar com um grupo de crianças rurais, toda a gente vai saber andar de bicicleta, no meio urbano não tanto".
Além do meio onde estas crianças se inserem, a especialista aponta para o efeito da pandemia. Apesar de ter terminado há quatro anos, as pessoas "são propícias a um comportamento pós-pandemia, mais caseiro, que não permite esta saída das crianças à rua, de uma brincadeira mais livre". Para a professora universitária, as atividades desportivas pós-escola não podem ser comparáveis a este tempo fora, "ainda é muito estruturado, com um perfil de competitividade", onde não se "trabalha a relação com o outro".
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