Sábado – Pense por si

Mira Amaral: "monstro eléctrico" teve origem no governo de José Sócrates

04 de julho de 2018 às 19:15
As mais lidas

O antigo ministro foi ouvido esta quarta-feira no Parlamento pela comissão de inquérito e negou responsabilidade nas rendas da EDP.

O antigo ministro da Energia Mira Amaral defendeu esta quarta-feira que "o desastre do sistema eléctrico teve origem em 2007, quando o governo de José Sócrates, com Manuel Pinho como ministro, decidiu instalar 8.000 megawatt [MW] de potência eólica remunerada".

Em audição na comissão parlamentar de inquérito às rendas da energia, Mira Amaral chamou a si a introdução das novas fontes de energia renovável, quando abriu "a produção eléctrica ao sector privado, acabando assim com o monopólio da EDP na produção para estimular outros produtores, designadamente de fontes renováveis", o que, realçou, lhe dá "autoridade política, moral e técnica para criticar o monstro eléctrico criado".

"O desastre do actual sistema eléctrico português teve origem em 2007, quando o então governo de José Sócrates, com Manuel Pinho como ministro da Economia, com a tutela da energia, decidiu instalar 8.000 MW de potência eólica remunerada por 15 a 20 anos com tarifasfeed-in [tarifas bonificadas de venda]", defendeu o antigo ministro.

Para Mira Amaral, "o governo de Sócrates esqueceu-se que já havia muita potência contratada através dos CAE [Contratos de Aquisição de Energia] e CMEC [Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual], os quais asseguravam o pagamento dos custos fixos de centrais que passaram a trabalhar então em apoio às intermitentes, tendo começado a instalar capacidade eólica em duplicação a essa potência existente coberta pelos CAE e CMEC".

"Dos 8.000 MW de eólicas intermitentes, vieram-se efectivamente a instalar até agora cerca de 5.300 MW, número este que é muito superior aos 3.500 MW de potência de consumo em Portugal nas horas de vazio durante a noite", afirmou.

Engenheiro electrotécnico de formação, Luís Mira Amaral foi, entre 1987 e 1995, ministro da Indústria e da Energia, altura em que surgiram os CAE, figura criada para "atrair investimento", aplicado a duas centrais privadas. Os CAE aplicados à EDP são "posteriores" à sua saída do governo, disse.

"OS CAE às centrais da EDP são de 1996, não foram comigo, mas do governo de António Guterres", declarou.

CAE que deram origem aos CMEC da EDP são do governo Guterres

Para Mira Amaral, os CAE que deram origem aos CMEC pagos à EDP são "do engenheiro Guterres", defendendo que estes deviam ter sido ajustados antes da privatização da empresa liderada por António Mexia.

Em audição na comissão parlamentar de inquérito às rendas da energia, Mira Amaral precisou que criou os custos de aquisição de energia (CAE) das Centrais do Pego e da Tapada do Outeiro com o objectivo de "atrair investimento privado para a produção de electricidade", mas os CAE posteriores - à EDP - são do Governo liderado por António Guterres.

"Não fui eu que dei os CAE à EDP que deram origem aos CMEC [Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual] à EDP. São do [governo do] engenheiro Guterres", afirmou Mira Amaral, referindo as declarações do especialista em Energia Pedro Sampaio Nunes na semana passada, que lhe imputava a paternidade dos CAE.

Luís Mira Amaral foi ministro da Indústria e da Energia em dois governos liderados por Cavaco Silva, entre 1987 e 1995, altura em que foram criados os CAE, que em 2017 foram substituídos pelos CMEC no caso da EDP.

"Ao atribuir CAE à EDP dava uma previsibilidade [às receitas da empresa] e tornavam-na mais atractiva para a privatização. Eu sei como os governos funcionam, normalmente gostam de embelezar a noiva antes da privatização. Acho que este foi um argumento determinante", declarou.

Referindo a sua experiência como governante, Mira Amaral disse que "o ministro das Finanças manda mais do que os ministros sectoriais. É sempre a preocupação de encaixe para o Tesouro que é determinante".

Ainda assim, defendeu que os investidores que entraram na EDP depois de 2007 "têm que ser respeitados".

Os CMEC são uma compensação relativa à cessação antecipada dos CAE, o que aconteceu na sequência da transposição de legislação europeia no final de 2004, tendo depois sido revistos em 2007. Ainda assim, mantiveram-se dois CAE -- Turbogás e Tejo Energia --, que são geridos pela REN Trading.

São actualmente abrangidos pelo regime dos CMEC 16 centrais hídricas da EDP, cujos contratos terminarão faseadamente até 2027 (Alto Lindoso, Touvedo, Venda Nova, Vilarinho das Furnas, Pocinho, Valeira, Vilar-Tabuaço, Régua, Carrapatelo, Torrão, Crestuma-Lever, Caldeirão, Aguieira, Raiva, Pracana, Fratel).

"A EDP não é culpada. Foi forçada a mudar dos CAE para os CMEC", concluiu.

Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!