Sábado – Pense por si

Francisco Paupério
Francisco Paupério Investigador
22 de janeiro de 2025 às 09:39

Os loucos anos 20

O mundo que imaginávamos para estas décadas, de cooperação internacional, de resolução de crises ambientais e de paz, não se veio a instalar.

Os "loucos anos 20" do século XXI já estão marcados por contradições. Por um lado, a sensação de que tudo está à beira de um colapso: a democracia, o ambiente, a guerra. Por outro, a persistência de movimentos e ideias que tentam reverter o curso da história. Mais uma vez há uma batalha contínua entre o velho e o novo, o progresso e o retrocesso, a apatia e a luta. Dizem que a história é cíclica, repetindo-se ao longo dos anos. E se os loucos anos 20 do século passado foram uma época de prosperidade, de procura do prazer, de usufruto da vida e de renovação artística, infelizmente estes anos 20 são loucos por outros motivos. Pelo contrário, o que encontramos foi um mundo sacudido por crises sanitárias, desigualdades e tensões políticas que expuseram, mais do que nunca, a fragilidade do nosso sistema. A pandemia levou-nos para um tempo novo e inimaginável, introduzindo uma espécie de prenúncio para o que ia acontecer nesta década. Uns loucos anos 20 onde tudo parece imprevisível. E pior, ninguém parece estar a salvo dos acontecimentos.

O mundo que imaginávamos para estas décadas, de cooperação internacional, de resolução de crises ambientais e de paz, não se veio a instalar. Pelo contrário, temos agora um dos períodos mais perigosos para quem já nasceu em Democracia. Os desafios são diversos e numerosos. O avanço da extrema-direita em várias partes do mundo ameaça a democracia. As liberdades fundamentais são constantemente colocadas em risco, enquanto as fake news e a manipulação digital em rede moldam eleições e debates públicos. Mesmo emergindo uma tentativa de regulação do poder das big techs, temos falhado em reduzir o poder aos bilionários que controlam dados e informações e influenciam comportamentos. Exemplo disto são a presença e o protagonismo destes bilionários americanos (e não só) na política doméstica, apoiando Donald Trump, o seu discurso e as suas políticas. Quando vemos a importância de Elon Musk, a aproximação e doação de dinheiro dos principais CEOs para os fundos públicos de Trump, sabemos bem o que esperar desta administração: um aprofundamento das desigualdades. Confesso já ter saudades de quando havia exemplos de empreendedores e empresários inspiradores, com visões para o mundo mais alinhados com os valores democráticos, progressistas e sustentáveis. Neste momento, parecem ter sido expostos ao que realmente são, actores também políticos forçados a golpes de teatralidade apenas para manter o seu controlo financeiro, influência e, acima de tudo, a esfera de poder. Estas pessoas não têm valores, não têm amor à democracia nem amor às próprias pessoas que acabam por venerá-los. É apenas uma paixão egoísta ao seu estatuto. Tornou-se o novo normal assistirmos a piruetas políticas ou intelectuais cheias de contradições, colocando de parte os seus valores para serem e sentirem-se valorizados pela maioria.

E enquanto o barco anda, não conseguimos contar pelas mãos os furos que já acumula. Enquanto nos focamos num problema, outros surgem e adensam-se. Na década da sustentabilidade, com os objetivos de desenvolvimento sustentável bem construídos, vemos cada vez mais esta prioridade ser colocada de lado, como tem acontecido ao longo da história. Isto só mostra como nunca foi nem é prioridade para as nossas lideranças. E não será para a população enquanto um problema mais substancial for resolvido: o fim do mês. Não conseguiremos ter cidadãos ativos e participativos, com interesse político, com visão de futuro se não conseguirmos garantir para demasiada gente uma chegada calma e sem tumultos ao fim do mês. Enquanto o fim do mês vier antes do fim do mundo estamos também reféns deste espaço temporal para as discussões que realizamos.

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