Sábado – Pense por si

Ana Gabriela Cabilhas
Ana Gabriela Cabilhas Nutricionista e deputada do PSD
24 de março de 2024 às 10:25

O Dia do Estudante venceu a ditadura

A Universidade deve permitir à sociedade ver-se a si própria, em perspetiva e com profundidade, rompendo com a espuma dos dias, pelo conhecimento que produz e pelo espaço privilegiado de discussão e pluralidade de exercícios críticos que proporciona.

Assinala-se, hoje, o Dia Nacional do Estudante. Os estudantes são, não raras vezes, impulsionadores de mudança. No tempo do regime ditatorial do Estado Novo, a juventude universitária apareceu como estrutura combativa e de oposição ao regime. Em 2014, na Praça Maidan, milhares de estudantes ucranianos manifestaram-se com grande coragem, iniciando o movimento que culminou no fim do regime corrupto pró-russo.  

A trajetória das Instituições de Ensino Superior possibilita que estas leiam os sinais dos tempos que vivemos e que ajustem a sua missão às mudanças e aos desafios que ocorrem em Portugal, na Europa e no Mundo. Ignoraram-se os sinais que mostram que a democracia está verdadeiramente ameaçada pelo populismo, pela desinformação e pelos regimes autoritários. Neste regresso paradoxal ao passado, a defesa da nossa democracia é de todos – dos cidadãos e das instituições. 

A Universidade deve permitir à sociedade ver-se a si própria, em perspetiva e com profundidade, rompendo com a espuma dos dias, pelo conhecimento que produz e pelo espaço privilegiado de discussão e pluralidade de exercícios críticos que proporciona. A ciência e o conhecimento, ao estarem intimamente ligados ao projeto de País, servem de alicerce de uma sociedade melhor, com cidadãos mais capazes, informados e esclarecidos. Não tenhamos dúvidas desta função do Ensino Superior, ao despertar intelectualmente a condição e a experiência humanas, e a tomada de consciência, para que a sociedade se torne renovada, ao invés de anacrónica e redutora.  

Por isso, as Instituições de Ensino Superior devem ser guardiãs da liberdade e assegurar a sustentabilidade dos valores da nossa democracia. Para tal, não podem perder a capacidade de se questionarem, do mesmo modo que interpelam a sociedade.  

A formação superior não pode ser uniforme nem homogeneizadora. Urge deixar cair o modelo de ensino-aprendizagem passivo, expositivo e pouco inovador, assente na dependência enraizada de reter apenas o que é apresentado. Ao estudante impõe-se novas competências: filtrar informação, interpretar, identificar ideias e notícias falsas, ter sentido crítico e um sentido de agência pessoal que impulsiona a ação. Mais do que a transmissão de saber, que está à distância de um clique ou do ChatGPT, espera-se que as Instituições de Ensino fomentem a partilha, problematização e estruturação dos conhecimentos, e que atinjam um ensino centrado nas especificidades dos estudantes e dos percursos flexíveis que almejam.  

Acresce que as Instituições de Ensino Superior devem apoiar a sua comunidade a fazer uso da liberdade académica, encorajando discussões abertas, participadas e baseadas em evidência. Respirar independência e pensamento livre é um compromisso da Academia com a construção de um País melhor. As Universidades portuguesas não podem estar fechadas sobre si próprias. A endogamia mantém as ideias em circuito fechado. Sem diversidade de percursos académicos e interesses científicos, e sem exposição a culturas institucionais, formas de investigar e de ensinar diferentes, não há espaço para a inovação. A mobilidade não pode ser uma etapa exclusiva dos discentes.  

Por fim, a democracia para ser defendida tem de ser exercida, o que naturalmente se aplica à promoção da democracia interna nas Universidades e Politécnicos. Não há democracia plena sem democracia formal, com regras e respeito por cada um dos grupos sociais que das instituições fazem parte. A educação não é feita somente para os estudantes, também parte deles. Proteger a democracia é incentivar a sua participação na vida escolar, e não deixar nenhum estudante para trás, promovendo o sucesso de estudantes diversos. 

Se no ano negro de 1962 o Governo de Salazar proibiu a celebração do Dia do Estudante, volvidos mais de 60 anos, o Ensino Superior não pode deixar de ser escola de cidadania, democracia e liberdade.  

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