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Como “Borgen” antecipou a luta pela Gronelândia, que Trump quer

Na 4.ª temporada da série dinamarquesa, EUA e China interessam-se por este território, o que dá origem a uma trama política intrincada. A ficção talvez tenha inspirado Trump, mas a história é antiga.

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Como “Borgen” antecipou a luta pela Gronelândia, que Trump quer
Gonçalo Correia 27 de janeiro de 2025 às 07:00
DR

"Descobri que o Ártico é, de certa forma, subestimado. E é subestimado na Dinamarca, na Gronelândia e no resto do mundo." A frase talvez seja pouco atual, pelo menos desde que Donald Trump voltou a manifestar a vontade férrea de que os Estados Unidos da América controlem o território desta região autónoma do Reino da Dinamarca. Talvez até já fosse pouco atual quando Martin Lidegaard, antigo ministro dinamarquês dos Negócios Estrangeiros e do Clima e da Energia (teve as duas pastas) a expressou em 2022. Mas na altura, havia uma série para promover.

A série era Borgen, um intrincado e rendilhado drama político que a televisão dinamarquesa (mais concretamente, a estação DR) exibiu entre 2010 e 2022 - e cujas quatro temporadas viriam a entusiasmar, também, a crítica internacional e sobretudo os espectadores do restante continente europeu.

Lidegaard expressou aquelas palavras num artigo publicado pela estação britânica BBC, em 2022. Na altura, discutia-se o facto da quarta temporada da série - em que alguns críticos viram uns pozinhos de West Wing, outros umas costelas de House of Cards - centrar-se na Gronelândia, que Trump agora quer. Ou que Trump, na verdade, já queria. Já lá vamos.

Toda a quarta temporada de Borgen seguia "um único fio narrativo", lia-se aquando da estreia no jornal The New York Times: a descoberta súbita de grandes reservas de petróleo na Gronelândia, que na série gerava grandes" tensões geopolíticas" internacionais e motivava um debate sobre "assuntos como soberania, alterações climáticas e descolonização". Ou, como enquadrava a BBC, uma descoberta que "punha em causa velhas alianças e a relação entre a Dinamarca e a Gronelândia, na medida em que potências bastante maiores como os EUA e a China" tentavam exercer a sua influência no território.

Na altura, o político dinamarquês e ex-ministro que trabalhou como consultor de informação da equipa de guionistas lembrava que era grande a incerteza quanto ao que aconteceria se o mundo começasse, por algum motivo - neste caso, a descoberta de petróleo -, a prestar atenção à Gronelândia: "A ideia básica era: estamos completamente impreparados para uma situação como essa, com todos os aspetos geopolíticos que lhe estão inerentes".

Mas será que a série dinamarquesa antecipou este aparente conflito diplomático entre dois aliados, EUA e Dinamarca, desavindos quanto ao destino da região? A resposta é: sim e não. Afinal, Donald Trump já tinha manifestado interesse relativamente à Gronelândia antes desta quarta temporada de Borgen: em 2019, o Presidente americano tinha cancelado uma visita de Estado à Dinamarca devido à recusa da primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, em negociar o trespasse do controlo da região.

À época, Trump comunicou: "A Dinamarca é um país muito especial com pessoas incríveis, mas dados os comentário da primeira-ministra Mete Frederiksen, que disse não ter interesse em discutir a compra da Gronelândia, vou adiar o nosso encontro, agendado para daqui a duas semanas, para uma outra altura".

Na altura, Lindegaard já comentava esse interesse Trumpiano, dizendo que se tivesse sugerido a cena referida ao guionista Adam Price, este ter-lhe-ia respondido: "Martin, francamente, vamos lá ser um bocadinho realistas." Mal poderia imaginar Martin que, três anos depois, Trump ressurgiria como uma fénix, novamente com uma sede pela Gronelândia no bico. Como diz o velho ditado: a história repete-se, realmente.

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