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Células da pele podem ser transformadas em óvulos para fertilização in vitro

Débora Calheiros Lourenço
Débora Calheiros Lourenço 30 de setembro de 2025 às 19:02
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Para que a descoberta possa ser utilizada por casais ainda são necessários processos de aperfeiçoamento, que podem demorar mais de uma década.

Investigadores conseguiram criar óvulos humanos a partir de células da pele, uma descoberta que está a ser vista como tendo a possibilidade de revolucionar o tratamento de fertilização in vitro. 

Células da pele transformadas em óvulos para fertilização in vitro
Células da pele transformadas em óvulos para fertilização in vitro AP Photo/Elise Amendola

A investigação ainda se encontra num estado inicial, mas se os cientistas conseguirem aperfeiçoar o processo será possível criar óvulos geneticamente relacionados com mulheres inférteis, seja devido a uma doença, tratamento médico ou idade. O mesmo procedimento pode ainda ser adotado para produzir óvulos para casais do mesmo sexo.

Shoukhrat Mitalipov, especialista da Universidade de Saúde e Ciência de Oregon, nos Estados Unidos, foi o responsável pelo estudo e considerou que “o maior grupo de pacientes que poderia beneficiar desta descoberta seriam as mulheres em idade materna avançada”, mas também “aquelas que passaram por quimioterapia”, uma vez que os tratamentos podem “afetar a sua capacidade de produzir óvulos viáveis”.

Mitalipov explicou ainda que as mulheres podem não ser as únicas beneficiárias desta descoberta uma vez que é possível utilizar células da pele masculina para fazer o mesmo procedimento: “Poderíamos produzir óvulos para homens e, dessa forma, é claro, isso seria aplicável a casais do mesmo sexo.” 

O trabalho feito pelos cientistas, e publicado num artigo na , tem por base a prática de clonagem iniciada na década de 1990 no Instituto Roslin, na Escócia, através da qual uma equipa utilizou a transferência nuclear de células somáticas para criar a ovelha Dolly. O processo envolveu a retirada do núcleo de uma célula adulta de ovelha e a sua inserção num óvulo de ovelha cujo núcleo foi removido. Agora os cientistas utilizaram uma abordagem semelhante para recolher células da pele de mulheres e removerem o núcleo de cada uma, depois cada núcleo de célula da pele foi colocado num óvulo de uma doadora saudável, cujo núcleo foi removido. 

O núcleo de uma célula contém 46 cromossomas que carregam os cerca de vinte mil genes que compõem o código genético humano. No entanto foi aí que a investigação enfrentou os seus principais problemas, ao contrário das outras células, os óvulos humanos saudáveis contêm apenas 23 cromossomas, uma vez que os outros 23 são provenientes do espermatozoide. Para ultrapassar este problema, após fertilizar os óvulos com espermatozoides a equipa ativava-os através da utilização de um composto chamado roscovitina, que fez com que os óvulos movessem cerca de metade dos seus cromossomas para uma estrutura chamada corpúsculo polar e permitisse que os restantes formassem pares com os vindos do espermatozoide.  

Todo o processo levantou algumas questões, especialmente depois de ter sido descoberto que os cromossomas dos óvulos inseminados pela equipa de Oregon formaram pares de forma aleatória, o que fez com que embriões tivessem o número errado de cromossomas: “Não se espera que esses complementos de cromossomas anormais resultem num bebé saudável”, referiu Paula Amato, coautora do estudo.

Agora a equipa está a trabalhar para descobrir maneiras de aprimorar todo o processo e conseguir contornar o problema criado pela criação de pares de cromossomas. Dos 82 óvulos criados no laboratório, menos de 10% desenvolveram-se até ao estágio em que os outros embriões de fertilização in vitro normalmente são transferidos para o útero da mãe pelo que Mitalipov considerou que para aperfeiçoar a técnica pode ser necessária mais de uma década.

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