Ministério Público acusou um jovem português de 240 crimes, desde associação criminosa, instigação ao homicídio, e crimes de ódio e racismo.
Na vida real, Miguel P., 18 anos, vivia com a mãe e o padrasto e frequentava um curso de Técnico Especialista em Manutenção Industrial. Adaptado às “rotinas associadas à vida familiar”, Miguel, porém, mantinha um perigo alter-ego na rede social “Discord”: dinamizador do grupo “The Kiss”, o jovem, de acordo com a acusação do Ministério Público,incitou massacres em escolas no Brasil, incentivou jovens à automutilação e à violência contra animais (em direto), assim como difundiu discursos racistas e de ódio contra mulheres e homossexuais e partilhou centenas de ficheiros com pornografia de menores.
Este é, em resumo, o resultado da acusação do Ministério Público contra Miguel P., detido pela Polícia Judiciária em maio de 2024, que no grupo “The Kiss” se identificava como “Mikazz” ou “verdadeiromikazz”. Ao todo, o suspeito, que se encontra em prisão preventiva e o Ministério Público pediu que assim continuasse, foi acusado por 240 crimes, sete dos quais de instigação a homicídio.
“O grupo foi criado pelo arguido com o propósito de recrutar como membros pessoas/jovens com gostos semelhantes pelo culto da violência e neles criar a vontade de praticarem e de os levar, efetivamente, à prática de: atos de automatização, mutilação e morte de animais, difusão de propaganda nazi, instigação e prática da ‘missão’ de cometer massacres em escolas”, refere a procuradora Felismina Carvalho Franco, no despacho de acusação a que o NOW teve acesso.
E, no dia 23 de outubro de 2023, foi o que aconteceu numa escola, em Sapopemba, São Paulo, no Brasil. Naquele dia, Lucas T., um jovem brasileiro que tinha aderido ao grupo “The Kiss”, entrou na escola, munido de um revólver, calibre 38, e efetuou quatro disparos contra os colegas, matando Giovanna Silva, 17 anos.
À distância, Miguel P., ou “Gotter” (Deus), como se identificava, enviava uma mensagem para “todos” (“@everyone vai ter massacre agora”). Quando foi detido pela brasileira, Lucas confessou. “Eles pediram para fazer o massacre e eu fiz”.
Nas semanas que antecederam o caso da escola, Lucas entrou para o grupo “The Kiss”. Aí, de acordo com a prova recolhida no processo, partilhou o sofrimento que sentia por ser vítima de bulying” na escola. Na sequência das conversas com Lucas, “Gotter”, na qualidade de líder, “passou a ser o seu mentor, apoiou, incentivou e reforçou em Lucas a vontade de praticar atos violentos” contra as pessoas que, supostamente, lhe causavam sofrimento, descrevea procuradora do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa.
Outra das práticas incentivadas pelo grupo passava pela mutilação de animais e a sua transmissão em direto, como “decapitação de ratos, gatos, galinhas”. E foi o que sucedeu, em janeiro de 2024, quando um membro do grupo, “Namiki”, “afogou o gato, que anteriormente exibiu, dentro de um recipiente com água”. Por sua vez, noutra ocasião, outro utilizador enforcou um felino.
A apologia do nazismo era outra das características do grupo. Miguel chegou a partilhar uma fotografia sua, envergando uma farda nazi. E foi neste contexto que “conheceu” um jovem brasileiro, Weder, 13 anos - que tinha começado “a sentir curiosidade por partilha de conteúdos violentos e apologia do nazismo”.
Depois de convencer o jovem a ingressar no grupo “The Kiss”, Miguel convenceu-o a executar atos violentos, como um massacre na escola que frequentava, em Carlos Chagas, no estado de Minas Gerais. No Brasil, Weder disse às autoridades que Miguel P. “entrou na sua mente”, tendo até incentivado a cometer suicídio.A 13 de novembro de 2023, Weder dirigiu-se à escola com uma faca. O crime só não se concretizou porque foi detido.
A acusação do Ministério Público revela ainda que Miguel P.exercia muita pressão psicológica sobre os elementos femininos do grupo. Quando estas eram recrutadas, “os elementos encetavam conversas como se de amigos ou namorados se tratassem, conseguindo que as mesmas enviassem fotografias ou videos” íntimos.
Só que, na posse de tais conteúdos, “os membros do grupo, nomeadamente o seu líder, Miguel, exigiam e ordenavam-lhes que se despisse/automutilassem “em direto”. Caso contrário, “divulgariam as fotos e os vídeos”.
Na abertura da acusação, a procuradora do Ministério Público fez questão de salientar que “Portugal não é alheio ao crescimento do fenómeno de incitamento à violência online, em que uma variedade de redes criminosas e extremistas tiram partido das plataformas digitais (Discord, Telegram, Instagram, Facebook, entre outras) que utilizam para praticar e instigar à prática de atos de violência contra pessoas e animais, extorquir pessoas e radicalizar indivíduos para o extremismo violento”.
Estes grupos, continuou a magistrada, “competem entre si pela partilha dos conteúdos mais violentos e funcionam de forma semelhante aos cultos, em que os líderes carismáticos utilizam o engano e a manipulação para tornar os discípulos obedientes e dependentes”.
Ora, os traços de personalidade de Miguel P., expostos no seu perfil psicológico, evidenciaram várias características que o levaram a procurar um rumo com o “uso excessivo da Internet”. Apesar de não apresentar “nenhuma doença psiquiátrica”, os peritos consideraram que o jovem tem “traços disfuncionais de personalidade e uma atitude de banalização das suas acções”
“Apresenta um notório distanciamento afetivo dos factos que lhe são imputados, e um funcionamento do tipo dissocial (antissocial). Tais características configuram um ‘modo de ser’ e não uma anomalia psíquica”, refere a acusação do MP.
Os peritos detetaram ainda “ausência de remorso ou culpa: mostra uma falta de preocupação com as consequências negativas que os comportamentos de que está acusado tiveram nas vítimas, estando mais preocupado com as consequências que tiveram para si; ainda que verbalize algum remorso, há uma falta de compreensão da gravidade das suas ações, sente que as acusações são infundadas e a prisão preventiva é injusta, tende a justificar os seus comportamentos culpando os outros ou as circunstâncias”
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