Termina segunda sessão de julgamento
A juíza Susana Seca deu por encerrada a sessão desta terça-feira pelas 17h30.
O julgamento retoma amanhã pelas 9h30.
Depois de uma primeira sessão atribulada, José Sócrates vai prestar declarações no segundo dia do julgamento da Operação Marquês.
O ex-primeiro-ministro José Sócrates vai começar a prestar declarações no âmbito do julgamento da Operação Marquês esta terça-feira, depois de uma primeira sessão atribulada que incluiu vários incidentes com a juíza.
O coletivo de juízes presidido por Susana Seca vai julgar o ex-primeiro-ministro José Sócrates e mais 20 arguidos, entre pessoas singulares e empresas, por 117 crimes.
A juíza Susana Seca deu por encerrada a sessão desta terça-feira pelas 17h30.
O julgamento retoma amanhã pelas 9h30.
Sócrates continua a defender que não teve qualquer intervenção na forma como a PT separou as redes de cobre e de cabo, contrariando a tese do MP.
"Ou se vendia a PT Multimédia ou se fazia um spin-off – criando uma empresa autónoma da PT", afirmou Sócrates, garantindo que para o Governo era indiferente qualquer das soluções.
Depois passou para "o último ponto da PT, sobre o período entre 2007 e 2010". "A acusação é abundante nesse capítulo, lançando-me as seguintes imputações: que eu influencei a fusão entre o grupo Telemar e o grupo Brasil Telecom", assegura Sócrates, dizendo que não conhecia ninguém destas empresas nem na ANATEL (equivalente à ANACOM no Brasil). "Não conheci na altura e não conheço agora. Ninguém."
Recusa ainda a acusação de que influenciou o ministro Hélio Costa.
José Sócrates rebate a acusação do MP de que o seu Governo terá protegido os interesses do Grupo Espírito Santo na decisão de cobre ou cabo. "Nunca foi um tema político", assegurou o antigo primeiro-ministro.
Após a explicação, dirigindo-se à juíza que levantou uma dúvida, Sócrates afirmou: "Achei que a senhora juíza já tinha percebido". A juíza, tomando bruscamente a palavra, advertiu José Sócrates pedindo que evitasse tons irónicos para se dirigir ao MP e ao tribunal. "O tribunal respeita o senhor arguido e o senhor arguido respeita o tribunal", admoestou Susana Seca.
"Não sei se alguma vez fez um curso de gestão comportamental, mas deve evitar-se dizer que o interlocutor não percebeu e é preferível dizer 'Não me devo ter expressado bem', porque deve-se partir da ideia de que a outra pessoa tem o mesmo nível de inteligência. Se eu estou a fazer a pergunta é porque tenho uma razão e muito menos vai fazer crer que tenho défice cognitivo", continuou Susana Seca.
Sócrates garantiu ao tribunal que não quer "diminuir intelectualmente a juíza" e mostrou perplexidade com a "hostilidade" demonstrada pela presidente do coletivo de juízes.
Depois de ouvidas as cinco escutas, Sócrates recorda que uma das chamadas foi feita em novembro de 2013. "Liguei ao doutor Ricardo Salgado para lhe dar uma palavra de incentivo", esclarece o arguido.
Em abril de 2014 é Salgado que liga a Sócrates. "A juíza percebe que foi uma chamada por engano e eu nem tinha o número dele guardado", continua Sócrates.
"Fica patente que não tinha o número de Ricardo Salgado nem nunca tive. Em segundo, eu não sabia onde morava o doutor Ricardo Salgado, tive de pedir à minha secretária que combinasse com a secretária dele e ele convidou-me para jantar, mas o jantar nunca aconteceu, fui apenas lá entregar um livro. Desde que saí do Governo, nunca mais falei com o doutor Ricardo Salgado sem ser pela vez em que liguei para lhe dar uma palavra de incentivo."
"Estas conversas mostram que nunca tive uma relação de proximidade com o doutor Ricardo Salgado. Ficou absolutamente evidente que até tivemos uma divergência em relação à questão da Vivo que foi evidente e que foi acompanhada por toda a sociedade portuguesa, como reconhecida numa chamada telefónica uns anos depois."
Quando a juíza questiona se não há uma incongruência entre o tom amigável das chamadas e as divergências referidas, Sócrates responde: "Não há incongruência, chama-se ter grandeza".
"Recebo com estranheza o comentário da senhora juíza sobre a alegada proximidade com o doutor Ricardo Salgado por mandar cumprimentos à sua esposa. Eu vi a esposa de Ricardo Salgado duas vezes na minha vida, mas faz parte das regras de cordialidade as pessoas mandarem cumprimentos à esposa", diz José Sócrates.
Depois de declarar que nunca manteve uma relação de amizade com Ricardo Salgado, Sócrates começou a descrever as conversas telefónicas que manteve com o antigo presidente do BES.
O procurador Rui Real interrompeu o arguido para aludir à possibilidade de uma eventual audição da escuta, causando a ira de Sócrates. "Não me interrompa. Eu estou no uso da palavra! O senhor procurador se quer falar, pede autorização à senhora juíza. Quando eu quero falar, peço ao tribunal", insurgiu-se. "Há duas partes e a senhora juíza tem a obrigação de tratar as duas partes com equidade", reforçou.
A juíza autorizou então a audição das conversas intercetadas entre Ricardo Salgado e José Sócrates.
O antigo primeiro-ministro José Sócrates, depois da pausa para almoço, falou sobre a relação que mantinha com Ricardo Salgado, à data líder do BES.
"Nunca fui amigo de Ricardo Salgado", assegurou, dizendo que não tinha nem o número de telefone do banqueiro, nem sabia a sua morada. Sócrates diz mesmo que a "aliança" entre eles era uma invenção dos procuradores.
Até se tornar primeiro ministro, garantiu, só esteve com o banqueiro uma vez enquanto ministro do Ambiente e mesmo depois disso só o recebeu no seu gabinete enquanto primeiro-ministro e nunca na sua esfera privada.
Ouve-se então uma escuta de uma chamada entre Sócrates e Ricardo Salgado.
A juíza decretou um intervalo para almoço. Trabalhos recomeçam às 14h.
A procuradora do MP Nadine Xarope pede que Sócrates seja advertido pelo tribunal coletivo porque, com o seu depoimento, "pode condicionar" o futuro depoimento da testemunha Fernando Teixeira dos Santos.
O advogado Pedro Delille pediu para tomar a palavra e considerou que o pedido da procuradora deve ser "indeferido" e que José Sócrates deve "fazer a sua defesa" como entender.
José António Barreiros, advogado de Zeinal Bava, questiona se o depoimento lido por Sócrates é foi feito em fase de instrução. O arguido confirma que as declarações foram feitas nessa fase do processo e que estava a "sintetizar" o que Teixeira dos Santos disse a Ivo Rosa.
Já Peedro Delille, interrompeu a juíza, para declarar: "Eu não quero arrastar mais este julgamento. Eu quero resolver este processo".
Delille pediu que fossem reproduzidas em audiência as declarações prestadas por Teixeira do Santos na fase de instrução. "Estou a pedir a vossa excelência para saber se consentem nessa leitura", acrescentou. O Ministério Público opôs-se a esta leitura requerida.
Sobre a Vivo, Sócrates começa por lembrar que é "a segunda vez que fala sobre este tema" e que "há uma tentação por parte de quem acusa" que é "usar uma falsidade quando outra é desmascarada".
"O MP diz que eu agi para que o Estado, o Governo, pudesse fazer aquilo que o doutor Ricardo Salgado não queria que se fizesse. Eu fui pago para fazer aquilo que o corruptor não queria que se fizesse", afirma Sócrates.
O antigo primeiro-ministro acusa mesmo a acusação do MP de ser "amalucada" e que "eles, o Ministério Público, não precisam de provar nada, basta insultar".
Sócrates afirmou mesmo que no dia da Assembleia-Geral da PT em que se ia decidir a venda da participação da empresa portuguesa na Vivo, Ricardo Salgado foi ter consigo e pediu-lhe para não usar a golden share do Estado para impedir o negócio.
O ex-primeiro-ministro diz que o encontro "durou uns minutos" e Ricardo Salgado pediu que não usasse a golden share, algo a que se opôs, regressando à reunião para transmitir o que se tinha passado. "Isto foi o que aconteceu e eu sou acusado de estar em conluio com Ricardo Salgado. O Ministério Público acusa-me de estar com reserva mental", sublinhou. "Não passa pela cabeça de ninguém."
A juíza Susana Seca voltou a pedir ao arguido José Sócrates que seja mais sintético na sua declaração. "Já é a segunda vez que juíza me interrompe", reclama o antigo primeiro-ministro, afirmando estar a ser "o mais sintético possível", mas sublinhando que tem, "naturalmente", de "invocar o que disseram as pessoas ao longo destes dez anos".
Os dois entraram depois numa discussão:
José Sócrates: Não queira limitar-me a palavra.
Juíza: O senhor devia estar mais preocupado...
José Sócrates: ... quanto à minha preocupação deixe isso comigo...
Juíza: O senhor devia estar mais preocupado...
José Sócrates: Posso pedir para me deixar concluir?
Juíza: Não. O senhor José Sócrates está a extremar a forma como os trabalhos estão a decorrer. O código prevê que as declarações sejam diretamente relacionadas com o objeto do processo. Recordo que lhe posso tirar a palavra se continuar a ler extensivamente dados que não são relevantes.
José Sócrates: "Importa-se de me deixar falar? Este clima de hostilidade que cria comigo é inacreditável".
José Sócrates apresenta a "smoking gun" [arma fumegante] que "prova a inocência": um despacho que comprova a vontade de abstenção do Governo assinado pelo secretário de Estado das Finanças de então três dias antes da Assembleia-geral, confirmando a abstenção. "
O despacho é feito em cima de uma declaração do diretor-geral do Tesouro "que, por sua vez, confirma a proposta do subdiretor, que recomenda a abstenção", refere.
A juíza questionou o arguido sobre quem tinha assinado o documento e o ex-primeiro-ministro respondeu que estava assinado por Carlos Costa Pina, antigo secretário de Estado das Finanças. "Este papel foi escondido pelo Ministério Público", acusou ainda.
A presidente do coletivo de juízes Susana Seca a interrompeu o ex-primeiro-ministro para pedir que Sócrates fizesse menos citações para acelerar o processo. Em resposta, o antigo líder socialista indignou-se e afirmou que se vai defender da forma que entender ser melhor, mesmo que essa estratégia "não seja do apreço da juíza".
"Vai interromper-me, senhora juíza? Se não se importa, deixe-me acabar. Se a senhora juíza me permite, quero dirigir-me ao tribunal da forma que entendo. Vou utilizar aquela que acho mais conveniente para os meus propósitos", declarou.
Sobre a PT, Sócrates diz que a acusação que lhe é dirigida sobre a Oferta Pública de Aquisição (OPA) da Sonae sobre a Portugal Telecom é "uma dupla acusação". "Uma acusação de manipulação direta do voto da CGD contra os interesses da Sonae e outra manipulação eventual dos representantes do Estado na Assembleia-Geral da PT para caso a Sonae viesse a ter êxito, eles invocariam os interesses do Estado e chumbariam a proposta da Sonae", afirmou Sócrates.
"A primeira pergunta que eu faço é: onde é que estão as provas disso? Onde estão os dados, os indícios, que permitam a uma autoridade fazer esta imputação?", questionou, retoricamente, Sócrates. Vejo-me na condição referida pelo PGR: vou defender a minha inocência. Vou apresentar provas de que esta acusação é falsa", assegura.
Sócrates mostra ata de reunião de conselho de administração da CGD que aponta que este conselho rejeitou a operação. "Fica visível que CGD mandou fazer avaliações e que a CGD fez a sua própria avaliação", explica Sócrates, citando partes da ata.
"Será que todos os membros do conselho de administração da CGD foram manipulados por mim", questiona Sócrates, lembrando que muitos dos membros daquela administração estavam nas antípodas do PS na altura e mesmo assim votaram contra a OPA.
"Gostaria de fazer uma nota prévia: eu vou falar de Ricardo Salgado. Eu quero associar-me às palavras do advogado de Ricardo Salgado e gostaria de dizer que já não me espanta a insensibilidade dos tribunais e do MP relativamente à condição que ele eexpôs. Nem me espanta a cobardia de um Estado que quer julgar alguém que não está em condições de se defender". "Eu não quero fazer parte da coligação de silêncio" de quem não defende o antigo dono forte do Banco Espírito Santo, afirmou Sócrates.
Sócrates já começou a prestar declarações. "Se a senhora juíza me permite, há talvez uma questão de método, porque tal como imagina, nos próximos tempos, eu irei abordar todas as questões que dizem respeito ao processo marques porque as acusações contra mim são extensas e ocupam quase todas as áreas do processo", começou por afirmar José Sócrates, informando que durante as suas declarações internacionais irá "dividr o processo por temas".
"Pretendo omeçar a minha defesa por um tema que é talvez o mais extenso da acusação e que atira em várias direções. Se a senhora juíza estiver de acordo, começamos pela PT", anunciou.
Quando chegou ao Juízo Central Criminal de Lisboa, pelas 9h, o antigo primeiro-ministro entrou nas instalações do tribunal sem prestar declarações. Momentos depois voltou atrás para falar com os jornalistas. Começou por perorar sobre a alteração do crime de corrupção na acusação: "O lapso de escrita foi um estratagema".
Deixou ainda críticas ao Procurador-Geral da República, afirmando já ter sido julgado e "ilibado de todas as acusações".