Costa considera que o seu Governo derrotou o modelo "da direita"
"Aquilo que a história desta legislatura mostrou é que, no confronto dos modelos, a direita foi derrotada. Venceu uma ideia muito clara", disse o primeiro-ministro.
O primeiro-ministro, António Costa, assumiu que a primeira metade da presente legislatura foi caracterizada por um confronto entre dois modelos de desenvolvimento social e em que, face aos resultados verificados, o da direita política acabou derrotado.
Este quadro de bipolarização ideológica foi apresentado por António Costa no debate quinzenal na Assembleia da República, após a deputada do PS Wanda Guimarães ter feito uma curta intervenção em que se insurgiu contra a ideia de que os resultados do actual Governo se devem às políticas do anterior executivo PSD/CDS-PP.
António Costa respondeu logo a seguir para manifestar total concordância com a dirigente do seu partido. "A história desta legislatura é seguramente a história do confronto entre o modelo de desenvolvimento que a direita quis impor a este país, assente nos baixos salários e na precarização de direitos, e o modelo alternativo deste Governo. A história desta legislatura é a história da vitória de um modelo de desenvolvimento alternativo que demonstrou que era possível aumentar o salário mínimo, repor os vencimentos da função pública, reduzir a carga fiscal ao mesmo tempo que se verificou crescimento económico, aumento do investimento e aumento do emprego", sustentou.
Na sua intervenção, António Costa recorreu também a uma pergunta que lhe foi feita em 2016, pela bancada do PSD, sobre quantos milhares de postos de trabalho iria custar a decisão de aumentar o salário mínimo. "Ora, sabemos que o salário mínimo subiu em 2016, em 2017, em 2018, vai continuar a subir em 2019 - e temos já mais 288 mil postos de trabalho. Aquilo que a história desta legislatura mostrou é que, no confronto dos modelos, a direita foi derrotada. Venceu uma ideia muito clara: Que o nosso modelo de desenvolvimento tem de assentar na inovação", advogou.
Nesta parte do debate quinzenal, porém, registou-se um momento algo insólito. O discurso social de António Costa, num dos períodos, foi acompanhado por ruído proveniente da bancada do Bloco de Esquerda.
O primeiro-ministro deixou então o seguinte comentário: "Precisamos de ter empresas onde haja trabalho mais digno, uma actividade mais produtiva e uma economia mais competitiva. É este o modelo social que nós queremos e é por isso, presumo, que o Bloco de Esquerda apoia esta solução e esta maioria governativa", observou.
Na mesma lógica de António Costa, o coordenador do PS para as questões do trabalho, Tiago Barbosa Ribeiro, defendeu a ideia de que a actual "alternativa política vingou porque não só fez diferente da direita quando governou mas também porque resistiu a todas as adversidades, a todas as profecias da desgraça".
"Fizemos exactamente o contrário do que o PSD e o CDS defenderam neste parlamento. A escala do nosso sucesso é a medida do falhanço social, laboral e económico da direita", acusou o deputado socialista eleito pelo círculo do Porto.
Tiago Barbosa Ribeiro fez ainda questão de referir que PSD e CDS-PP "foram contra o aumento histórico do salário mínimo, contra a reposição dos feriados, contra o programa de regularização dos precários, contra a responsabilização das empresas de trabalho temporário, contra o fim dos cortes no subsídio de desemprego e contra o fim das reduções remuneratórias". "Os senhores estiveram sempre do contra e, por isso, não podem hoje reclamar méritos", acrescentou.
Aumento da carga fiscal: sim ou não?
Do outro lado da bancada, a presidente do CDS-PP, Assunção Cristas, defendeu que os dados do INE mostram o "falhanço rotundo" dos objectivos do Governo, com o aumento da carga fiscal para o "valor mais elevado dos últimos 23 anos".
"Afinal, a carga fiscal aumentou e fixou-se no valor mais elevado dos últimos 23 anos", afirmou Assunção Cristas, argumentando que os dados do Instituto Nacional de Estatística mostram um "falhanço rotundo" dos objectivos do Governo, que "não virou a página da austeridade", mas pratica uma "austeridade encapotada".
No debate quinzenal, no parlamento, o primeiro-ministro, António Costa, respondeu que "o aumento da carga fiscal explica-se com o crescimento e aumento do emprego", que estimularam as receitas.
Na réplica, a líder do CDS acusou o primeiro-ministro de "desonestidade intelectual" e de mentir aos portugueses "em matéria de neutralidade fiscal" do imposto sobre produtos petrolíferos. "A receita de IVA aumentou, aumentou o imposto sobre os combustíveis. O senhor primeiro-ministro mentiu aos portugueses em matéria de neutralidade fiscal. Se olhar para carga fiscal, ela sobe em valores absolutos, em percentagem do PIB e nos impostos indirectos", argumentou Assunção Cristas.
"Pode dizer o que quiser mas os dados são objectivos e incontestados, falhou o seu objectivo, e fê-lo pelos impostos indirectos", acrescentou.
O primeiro-ministro reiterou a sua argumentação e vincou: "Nós sabemos que nestes debates, quando a razão lhe vai faltando, o vocabulário vai resvalando para o insulto". "A senhora deputada confunde as coisas. Há um aumento da receita fiscal, porquê? Aumentamos os impostos sobre os portugueses, sobre as empresas portugueses, aumentámos o IVA sobre os portugueses? Não, não fizemos nada disso. Cada vez que se tiver em conta o aumento da receita sem as contribuições para a Segurança Social, a carga fiscal diminuiu continuadamente de 2015 até agora", declarou. O primeiro-ministro sublinhou que "a diferença explica-se essencialmente por algo positivo chamado emprego".
Assunção Cristas atribuiu à reforma laboral do anterior Governo o crescimento do emprego e confrontou António Costa com um documento da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP), de dezembro de 2017, que apresenta Portugal como um país em que é "contratar e despedir é mais fácil e menos dispendioso". O chefe do Governo respondeu: "É talvez altura de a direita deixar de ter ilusões acerca do poder mágico da lei. Essa legislação criou tantos postos de trabalho como a sua lei de arrendamento criou arrendamento acessível".
Governo "tem um ministro da Cultura, mas tem política para a Cultura"
A questão do modelo de financiamento às artes, que tem sido alvo de duras críticas do sector, foi um dos temas centrais do debate. O primeiro-ministro admitiu que podem ter existido falhas de comunicação na explicação do modelo de financiamento às artes, com o líder parlamentar do PSD a acusá-lo de não honrar a palavra que tinha dado aos agentes culturais.
No debate quinzenal na Assembleia da República, Fernando Negrão confrontou António Costa com o que disse ser "a maior contestação no sector da Cultura desde o 25 de Abril" e acusou-o de falhar o compromisso que tinha estabelecido com os agentes culturais na campanha eleitoral em 2015.
"Queria felicitar todos os agentes culturais em Portugal porque bateram o pé e o Governo assustou-se e aumentou a dotação inicial que tinha. Parabéns aos agentes culturais", saudou Negrão.
Na resposta, o primeiro-ministro frisou que este Governo tem reposto "os cortes brutais" feitos na Cultura pelo anterior executivo PSD/CDS-PP, e atribuiu a contestação a falhas na forma como o modelo foi apresentado.
"Muito provavelmente porque nós nos explicámos mal, provavelmente porque as pessoas compreenderam mal. Há uma coisa que é certa em matéria de austeridade: o apoio às artes era em 2015 de 11,4 milhões de euros e este ano vai ser de 19,2 milhões", salientou.
Fernando Negrão recuperou no debate quinzenal o estilo dos seus antecessores no cargo com intervenções mais curtas e um maior número de perguntas e apontou que, neste processo, se verificou que "o ministro da Cultura está politicamente desaparecido", referindo-se ao maior protagonismo quer do primeiro-ministro quer do secretário de Estado.
"Não acha que já era tempo de termos um ministro da Cultura a sério?", inquiriu Negrão. O primeiro-ministro contrapôs que não só o Governo "tem um ministro da Cultura, mas tem política para a Cultura".
"Centremo-nos no essencial: estão a favor ou contra o atual modelo de financiamento às artes?", questionou Costa, sublinhando que o PSD não se manifestou quando o diploma esteve em discussão pública nem pediu a sua apreciação parlamentar.
"O PSD acordou para cultura no dia em que a cultura protestou com o resultado do concurso", criticou, recebendo um forte aplauso da bancada do PS.
António Costa lembrou algumas decisões do seu Governo na área da Cultura - como a decisão de manter no Estado a colecção Miró - e deixou um conselho a Fernando Negrão.
"Estude bem a doutrina no seu partido sobre a subsidiodependência no apoio à cultura, porventura encontrará as verdadeiras razões porque é que em algumas regiões há mais companhias excluídas do que noutras", disse, numa aparente referência aos conflitos que o actual presidente do PSD, Rui Rio, teve com os sectores culturais quando presidiu à Câmara Municipal do Porto.
Negrão, que, ao contrário do CDS-PP, não pediu a palavra quando foi introduzido pelo presidente da Assembleia da República o tema da despedida de Luís Montenegro do Parlamento, aproveitou o início da sua intervenção para lhe endereçar "um grande abraço de amizade" e desejar-lhe "as maiores felicidades pessoais e profissionais".
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