Sábado – Pense por si

Francisco Paupério
Francisco Paupério Investigador
09 de abril de 2025 às 07:33

Debater para entreter

Dois minutos por intervenção, trinta segundos de introdução, quinze para as últimas palavras. É a política em formato TikTok, rápido, por modas e facilmente esquecível.

Qual o objectivo de criar debates rápidos em que precisamos sempre de avançar de tópico para tocar em tudo, mas no final ninguém fica esclarecido? Cada vez mais se tornou um instrumento de protagonismo e propaganda, onde a forma é bem mais importante do que o conteúdo. Exemplo disto são a estrutura adotada pelos nossos media para fazer o "escrutínio" aos nossos partidos. 30 minutos de debate, 5 minutos para cada tópico. Não é um verdadeiro escrutínio aos partidos, não é uma clarificação das suas intenções. Cumpre apenas o propósito de entreter.

Na verdade, os media adoram um bom debate político. Fazem o pré-jogo com comentário a prever o que vai ser dito, durando horas nesta antevisão. Lançam as entrevistas rápidas para criar um efeito de magnitude, e após o debate volta-se para dar notas, e comentar sobre as intenções e o que ficou por dizer de cada candidato/a. Gasta-se dinheiro nas produções e vinte vezes mais tempo do que no espaço para os verdadeiros intervenientes das eleições exporem as suas intenções para o pós 18 de Maio. Claro que neste tipo de debates não é permitido tempo para desenvolver uma ideia. Seria um risco.

Podia revelar incoerências, ou pior, podia mesmo revelar que não se tem pensamento político e visão para mudar o país. Dois minutos por intervenção, trinta segundos de introdução, quinze para as últimas palavras. É a política em formato TikTok, rápido, por modas e facilmente esquecível. A democracia segue o rumo dos seus protagonistas. A diferença para outros séculos é que esta revolução está a ser televisionada. Estamos no pico tecnológico, mas no vale de qualidade dos actores políticos. Mas verdade seja dita, o problema não está apenas nos políticos.

O que se passa neste formato não são verdadeiros debates. Falta confronto real, de ideias. Faltam perguntas difíceis. Falta honestidade política para esclarecer os cidadãos. Os políticos devem-se comprometer com as suas ideias, e estes debates idealmente seriam esse espaço de clareza. Estas estruturas parecem ser feitas com o cuidado de evitar que alguém diga algo relevante sobre como quer mudar o país. Quem apresenta a mudança estrutural em 2 minutos só pode estar a faltar à verdade e à responsabilidade do seu cargo público.

O mais triste de tudo isto é que já ninguém espera outra coisa da democracia portuguesa, dos partidos políticos e dos próprios media. Já conhecemos os protagonistas, já sabemos o que vão dizer e como vão dizer. Já sabemos um pouco do desfecho. E no meio de tudo isto, onde fica o Portugal presente e futuro? É mais um espectador que fica à espera que se cumpram as promessas de campanha, mas que sabe no fundo que não se pode contar com isso. Não se procuram soluções, não se procura apresentar o projecto para o nosso país, procura-se estar na crista do imediatismo político, e de subir nas próximas sondagens, que se querem diárias!

E ainda perguntam porque a abstenção cresce? Se a política é feita para o digital, o voto também será apenas digital. Mas que este desgaste seja o princípio de algo melhor. Que tudo isto sirva como empurrão para exigir debates a sério: com confronto de ideias, confronto de visões, com a lealdade e a responsabilidade que o cargo exige. Há toda uma nova geração atenta e inquieta, pronta para construir um país. Transformando a indiferença em ação, o populismo em pontes e o desencanto em escrutínio. A ideia de que Portugal pode ser muito mais do que é, podia começar por aqui.

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