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Casa Branca passa a controlar jornalistas que cobrem presidente Trump

Gabriela Ângelo 27 de fevereiro de 2025 às 21:45

Decisão cabia a uma associação de jornalistas que o fazia há mais de 100 anos. Trump coloca em risco a liberdade de imprensa, denuncia correspondente do NYTimes na Casa Branca.

A Casa Branca anunciou que seria a presidência a decidir quais são os meios de comunicação que podem participar no grupo que cobre o presidente dos EUA, retirando essa tarefa à associação de jornalistas que o faz há décadas. 

Karoline Leavitt AP Photo/Alex Brandon

Numa conferência de imprensa terça-feira, dia 25, a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, anunciou que haverá mudanças nos jornalistas e nos meios noticiosos que podem acompanhar regularmente o presidente norte-americano. O novo grupo irá incluir serviços de streaming, apresentando a mudança como uma modernização do grupo de imprensa. 

Leavitt disse que era um privilégio, não um direito, ter esse acesso ao presidente, e que queria abrir espaço para os "novos media" e meios de comunicação independentes, incluindo aqueles que apoiam Trump. "A equipa de imprensa da Casa Branca, nesta administração, determinará quem pode usufruir do acesso privilegiado e limitado a espaços como o Air Force One e à Sala Oval", disse Leavitt, acrescentando que "um grupo seletivo de jornalistas baseados em Washington D.C não deve continuar a ter o monopólio do acesso à Casa Branca". 

Esta medida foi o mais recente esforço da administração Trump para limitar o acesso e a influência das principais agências noticiosas que cobrem as notícias da Casa Branca. É uma ruptura em relação à escolha das gerações de presidentes republicanos e democratas passados, que respeitavam o facto da Associação de Correspondentes da Casa Branca (WHCA, a sigla em inglês) decidir que jornalistas faziam parte do grupo de imprensa.

Vem também na sequência da decisão da administração Trump de impedir a Associated Press (AP) de fazer parte do grupo de imprensa por se ter recusado a referir ao Golfo do México como Golfo da América, o novo nome atribuido por Trump. No início do mês de fevereiro, o Pentágono também anunciou que certos órgãos de comunicação como a NBC News, a NPR, o Politico e o The New York Times deveriam desocupar os escritórios e espaços de trabalho que mantém dentro do edifício. 

"Numa democracia, é essencial que o público tenha acesso às notícias sobre o seu governo através de uma imprensa livre e independente", afirmaram os editores da AP, Bloomberg News e Reuters num comunicado. "Acreditamos que qualquer medida do governo para limitar o número de agências noticiosas com acesso ao presidente ameaça esse princípio". 

A WHCA, que tem 111 anos, é a organização que tipicamente escolhe os jornalistas e os meios de comunicação que podem estar presentes no grupo de imprensa e anunciou que a Casa Branca iria agora ter esse poder. Segundo a Reuters, disse tê-lo feito para garantir normas profissionais coerentes e a equidade do acesso em nome do público.

Na maior parte das vezes, este grupo é constituído por jornalistas de agências noticiosas como a Reuters, a AP, a CNN, a ABC News, a Fox News e o The New York Times.

"Esta medida vai contra a independência da imprensa livre nos Estados Unidos. Sugere que o governo escolherá os jornalistas que cobrirão o presidente. Num país livre, os líderes não devem poder escolher o seu próprio grupo de imprensa", afirmou o presidente da WHCA, Eugene Daniels, num comunicado.

Tudo ocorre na mesma semana em que Jeff Bezos, dono do Washington Postanunciou esta semana que a secção de opinião teria de escrever artigos a apoiar "as liberdades pessoas e o mercado livre", aproximando-se de uma ideologia mais à direita defendida pelo presidente norte-americano. Bezos tem-se aproximado de Trump nos últimos tempos, tendo estado presente na sua tomada de posse a 20 de janeiro.

Recordações da Rússia

Peter Barker, o correspondente do The New York Times na Casa Branca, escreveu na rede social X que encontra semelhanças entre a medida anunciada pela administração Trump e o regime de Vladimir Putin. "Tendo trabalhado como correspondente em Moscovo no início do regime de Putin, isto faz-me lembrar de como o Kremlin se apoderou do seu próprio grupo de imprensa e se certificou de que apenas os jornalistas obedientes tinham acesso", explica o jornalista. 

No início do regime do presidente russo, Yelena Tregubova, uma jornalista crítica da sua administração, foi afastada do grupo de imprensa do Kremlin. O The New York Times lembra que foi um momento praticamente esquecido que ocorreu há 25 anos, mas foi um momento revelador e um presságio do que Putin poderia vir a fazer no futuro. "O resto da imprensa percebeu a mensagem e acabou por se tornar naquilo que o Kremlin queria: uma coleção de repórteres obedientes que sabiam que tinham de seguir a linha ou então pagariam um preço", escreve Peter Barker. 

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